Um jornalista da BBC relatou os últimos resultados da Apple dizendo que o iPhone era o produto mais rentável de sempre. Mas será mesmo assim? A própria emissora britânica voltou atrás e tentou olhar para os números e, com ajuda dos ouvintes da BBC Radio 4, tentou perceber se o smartphone lançado pela empresa criada por Steve Jobs é, mesmo, o produto mais rentável da História — pelo menos da História recente.
A maior dificuldade em descobrir qual é o produto mais rentável está relacionada com a própria definição de “produto” e de “rentabilidade”. Será que um prato de sopa ou um café expresso, que pode dar aos cafés margens de quase 90%, conta como um produto? Mas o conceito não é a única dificuldade – muitas vezes, como no caso da Apple, não existe informação detalhada suficiente.
A BBC lembra que o popular medicamento para a impotência masculina Viagra deverá ter uma margem bruta bem superior a 85%, tal como acontece com vários outros medicamentos como o Prozac, para controlar sintomas depressivos. Mas essa é a margem bruta, porque quando se desconta o custo da investigação, marketing e infraestruturas, por exemplo, verifica-se que a rentabilidade destes produtos farmacêuticos é bem inferior.
Será, então, mesmo o iPhone o produto mais rentável da História? Certamente não o é, se olharmos para a rentabilidade adicional por cada unidade extra produzida. É certo que o iPhone é o produto que mais receitas dá à Apple, mas por cada novo iPhone produzido é preciso comprar materiais, assegurar a estrutura (global) de produção e fazer distribuição e marketing.
Por outras palavras, o custo inicial com investigação pode não subir muito se as vendas duplicarem de um dia para o outro (por hipótese), mas quase todos os outros custos sobem também.
Então será que, tendo em conta a importância dos custos de replicação, o produto mais rentável será, necessariamente, digital? Só porque o custo de mais um download é ínfimo e, portanto, a margem de lucro de cada download é maior?
A BBC embrulhou-se tanto na questão que decidiu optar por avaliar a rentabilidade total do produto ponderando o seu tempo de vida útil. E pediu aos ouvintes que dessem palpites sobre qual seria o produto mais rentável.
Em 2015 a Apple teve mais de 230 mil milhões de dólares em receitas, dois terços dos quais são obtidos com a venda do iPhone. Dessas receitas totais, é uma incógnita qual é o valor do lucro. E a Apple dificilmente irá divulgar esse valor, por questões de concorrência. Mas sabe-se que a Apple teve 53 mil milhões de dólares em lucros totais em 2015. Se assumirmos que o iPhone responde por dois terços do lucro da Apple (porque responde por dois terços da receita), falamos de um valor de 35 mil milhões.
Mas tendo em conta o sucesso do iPhone, pode presumir-se que a proporção do smartphone nos lucros da Apple será maior do que isso. É por isso que a BBC decidiu usar o ponto médio entre esses 35 e o lucro total — 44 mil milhões.
A Pfizer teve receitas de quase 49 mil milhões de dólares – 1,7 mil milhões graças ao Viagra. Mesmo que essas receitas correspondessem a lucros, a Apple consegue a mesma quantia em lucros em duas semanas, afirma a BBC.
Outra sugestão: os refrigerantes. A marca mais bem sucedida de refrigerantes, a Coca-Cola, diz que vende 1,9 mil milhões de doses por dia. Portanto, em apenas 10 horas a Coca-Cola vende mais unidades do que o iPhone vendeu em toda a sua História. Mas, claro, um iPhone é mais caro do que uma lata de Coca-Cola, por isso a BBC acha que apesar de a Coca-Cola existir desde 1886, é improvável que a bebida possa ter gerado 44 mil milhões de dólares em lucros.
E que tal a Microsoft? A rival da Apple tem obtido lucros na ordem dos 20 mil milhões de dólares em lucros nos últimos anos. A Microsoft tem tentado conquistar mercado à Sony nas consolas de videojogos e também tem uma divisão de produção de hardware (componentes e periféricos informáticos). Mas a principal fonte de negócio da Microsoft continua a ser as licenças do sistema operativo Windows e dos programas do Office (Word, Excel etc.).
Se olharmos para o lucro anual da Microsoft com estes programas digitais — com custos de replicação ínfimos — o montante fica bem longe do que a Apple consegue com o iPhone. Mas como o critério da BBC é o tempo de vida útil do produto, há que considerar que a Microsoft vende licenças para o Windows e o Office há décadas. Portanto, se se somar todos esses lucros, ao longo de todos esses anos, será que se chega aos calcanhares do iPhone?
“Talvez”, diz a BBC. “Sendo generoso, se juntarmos todas as vendas” do Office e do Windows, desde os anos 90, é possível que os programas da Microsoft sejam tão ou mais rentáveis do que o iPhone, que só chegou ao mercado em 2007.