É quase impossível encontrar alguém que não tenha preenchido as horas mortas a jogar “Snake” num ecrã a preto e branco (que era mais verde que preto). Recordamos esses tempos com nostalgia. Antigamente é que era: os jogos eram divertidos, as baterias duravam vários dias, o telemóvel caía de um terceiro andar e mesmo assim não se partia. Bom filho à casa torna, diz a sabedoria popular, e talvez seja por isso que a última tendência entre famosos é usar telemóveis antigos.
Danny Groner é uma dessas pessoas que resistiu à sensualidade tecnológica dos telemóveis inteligentes. E não, não é um velho do Restelo que vive com saudades do futuro: é um jovem de 32 anos, gestor da agência de fotografias Shutterstock, avaliada em 1.200 milhões de dólares. E é um dos menos de um terço da população norte-americana que não tem um smartphone. “Passo treze ou catorze horas à frente de um ecrã. Não têm de ser dezassete”, justifica ele à BBC. Mas admite que o progresso tecnológico nos telemóveis a que ainda não aderiu só vieram facilitar a vida dos trabalhadores: “Se toda a gente fosse como eu nenhum trabalho acabaria”, não porque esses telemóveis são realmente mais capacitados, mas simplesmente porque são mais rápidos.
Que a moda das coisas antigas anda a pairar há algum tempo por aí, já todos nos tínhamos apercebido: são os móveis antigos pintados de novo, os vestidos às bolinhas até aos joelhos. E agora os telemóveis “de abrir e fechar”, que ao ritmo a que são desenvolvidos os novos smartphones podem muito bem corresponder aos anos 20 da tecnologia. Para a psicóloga Holly Parker, docente da Universidade de Harvard, a utilização de telemóveis antigos é como um grito do Ipiranga na atualidade: “A utilização de um telemóvel com flip é um declaração audaz e luxuosa para proclamar que temos controlo”, que não nos deixámos vender pelos telemóveis que exigem atenção, como os smartphones.
Na verdade não são os telemóveis que exigem atenção: são as pessoas do outro lado da linha, que podem não conceber que uma pessoa queira e possa estar desconectada. Foi sobre isto que Bruno Mettling, subdiretor da empresa de telecomunicações francesa Orange, escrever num relatório entregue ao Ministério do Trabalho em França. Segundo ele, existe uma generalização de um ideal que obriga funcionários e superiores a estarem constantemente disponíveis uns para os outros. E não há nenhuma parte na lei que consiga restringir esse ideal. Ou não havia: precisamente em França foi aprovada uma lei que garante o “direito a desconectar-se”.