“Um Dia Perfeito”

O elenco é internacional (Tim Robbins, Benicio Del Toro, Olga Kurylenko, Mélanie Thierry), a acção passa-se “algures nos Balcãs”, na ressaca dos cruéis conflitos étnico-religiosos da década de 90, mas o realizador é espanhol (Fernando León de Aranoa, autor de “Às Segundas ao Sol”), o argumento baseia-se num livro de uma autora espanhola e as filmagens decorreram em Espanha. O título de”Um Dia Perfeito” dá o tom ao filme: cínico de uma ponta à outra. Robbins e Del Toro interpretam voluntários humanitários na ex-Jugoslávia devastada pela guerra, ambos sem quaisquer ilusões piedosas ou idealistas e conscientes da sua impotência no terreno. O filme segue-os ao longo de um dia, enquanto tentam tirar um cadáver de um poço, arranjar corda para o efeito, evitar ser mortos por vacas armadilhadas, dialogar com milícias locais que ou não ouviram falar no cessar-fogo, ou não querem saber dele, chamar à razão militares da ONU com espírito de burocratas empedernidos, proteger um miúdo abandonado pela família e manter-se calmos ante os absurdos e as atrocidades em que vão tropeçando. O pé de Aranoa escorrega por vezes no seu difícil número de equilíbrio entre comédia negra e tragédia (a banda sonora rock podia também ter sido atenuada), mas “Um Dia Perfeito” nunca se estatela ao comprido, também graças às interpretações certeiras de Robbins e Del Toro, cujas personagens escondem quão os afeta e revolta aquilo que veem sob uma máscara de cinismo “blasé” e uma barragem de piadas ácidas.

“Ele + Ela”

Claude Lelouch está quase a fazer 80 anos e continua a filmar como se não fosse nada com ele. Às vezes, acerta, outras vezes, falha estrondosamente. Entre os seus últimos filmes, “Roman de Gare” (2007) via-se muito bem, enquanto que “Ces Amours-là” (2010) não se tragava nem com um litro de Água das Pedras. “Ele + Ela”, a sua nova realização, é estritamente aconselhável aos indefetíveis mais radicais do autor de “Um Homem e uma Mulher” e “Uns e os Outros”. Filmado em grande parte na Índia, a fita é uma poderosa pieguice enfeitada com “espiritualidade” oriental, onde Jean Dujardin no papel de um famoso compositor de música de filmes que pode morrer a qualquer momento devido a um coágulo cerebral, e Elsa Zylberstein na mulher de um embaixador frustrada por não ser mãe, têm um “coup de foudre” místico-amoroso. Deixando namorada e marido à nora, vão visitar uma veneradíssima “santa” indiana que alegadamente tudo cura com um abraço (papel interpretado pela própria, e de quem Lelouch diz ter sido mais importante conhecê-la do que ter ganho o Festival de Cannes e o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro – a idade dá para coisas destas). Christopher Lambert interpreta o marido diplomata empalitado, Alice Pol a namorada sofredora, e a Índia segundo a câmara do realizador é um enorme lugar-comum turístico-miserabilista com tempero “new age” pronto-a-reconfortar.

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“Rainha do Deserto”

Este filme assinala o encontro muito improvável entre o cineasta alemão Werner Herzog e Nicole Kidman, pertencentes a mundos cinematográficos muito diferentes, e deve-se a Gertrude Bell, uma aristocrata e aventureira inglesa a quem chamaram “a versão feminina de Lawrence da Arábia”. Exploradora, viajante, escritora, fotógrafa, arqueóloga e espia, Bell conhecia o Médio Oriente como poucos ocidentais, em especial as tribos beduínas, e era altamente estimada e respeitada por estas, tendo ocupado altos cargos oficiais e contribuído para a definição da política imperial inglesa na região antes, durante e depois da I Guerra Mundial. É a primeira vez que um filme do realizador de “Aguirre, a Cólera de Deus” e “Fizcarraldo”, seja ficção, seja documentário, tem uma mulher como protagonista. Kidman interpreta Bell, rodeada por James Franco, Robert Pattinson e Damien Lewis. “Rainha do Deserto” foi escolhido pelo Observador como filme da semana, e pode ler a crítica aqui.