Mais de nove em cada 10 crianças e adolescentes refugiadas e migrantes chegaram este ano à Europa, através de Itália, sozinhas, indicou esta terça-feira a UNICEF, alertando para os perigos de abuso, exploração e morte que enfrentam.

No relatório “Perigo a cada passo do caminho”, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) refere que cerca de sete mil crianças e adolescentes não acompanhadas fizeram a travessia do Norte de África para Itália entre janeiro e maio deste ano, o dobro do ano passado.

De acordo com a UNICEF, mais de 92% das cerca de 7.000 crianças refugiadas e migrantes chegaram desacompanhadas à Itália nos primeiros cinco meses do ano.

A UNICEF chama a atenção para os “riscos tremendos”, como detenções, violações, trabalho forçado, espancamentos ou morte, que estes jovens correm para escaparem a conflitos, ao desespero e à pobreza de países da África, Ásia e Médio Oriente.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Segundo o documento, entre 01 de janeiro e 05 de junho deste ano registaram-se 2.809 mortos no Mediterrâneo, enquanto, ao longo de 2015, ocorreram 3.770, tendo a maioria acontecido na rota do Mediterrâneo Central e muitas delas eram crianças.

A UNICEF adianta que as crianças refugiadas ou migrantes não acompanhadas geralmente dependem dos traficantes de seres humanos e, muitas vezes, entram no sistema “pagamento adiantado por etapas”, tornando-as muito vulneráveis à exploração.

O relatório mostra depoimentos de crianças e adolescentes que tentaram chegar à Europa não acompanhadas: “Se tentas fugir, eles atiram sobre ti e morres. Se paras de trabalhar, batem-te. Era como no tempo do comércio dos escravos”, diz Aimamo, 16 anos, sobre a quinta na Líbia, onde trabalhou com o irmão gémeo durante dois meses para pagar aos traficantes.

“Uma vez parei cinco minutos para descansar e um homem bateu-me com um pau. Depois do trabalho, fecham-nos entre portas e não nos deixam sair”, disse ainda.

A UNICEF salienta também que alguns destes adolescentes são abusados e explorados sexualmente.

Assistentes sociais italianos disseram à UNICEF que raparigas e rapazes foram vítimas de abusos sexuais e obrigados a prostituir-se enquanto estavam na Líbia e algumas das raparigas chegaram a Itália grávidas porque tinham sido violadas.

No entanto, realça o documento, “devido à natureza ilícita do tráfico de seres humanos, não há dados fiáveis sobre o número de refugiados e migrantes que morrem ou desaparecem porque são levados para trabalhos forçados, prostituição ou ficam detidos”.

“É uma situação desesperada mas silenciosa. Dezenas de milhares de crianças enfrentam diariamente esses perigos e outras centenas de milhares estão preparadas para arriscar tudo,” afirmou Marie Pierre Poirier, coordenadora especial da UNICEF para a crise de refugiados e migrantes na Europa.

A mesma responsável adianta que “estas crianças precisam urgentemente de proteção contra todo o tipo de abusos às mãos daqueles que se aproveitam da situação para explorar os seus sonhos”.

A UNICEF alerta para o aumento do número de crianças refugiadas e migrantes sozinhas na rota do Mediterrâneo Central com a chegada do verão.

Nesse sentido, refere que cerca de 235.000 migrantes estão atualmente na Líbia e dezenas de milhares são crianças não acompanhadas com a esperança de fazerem o caminho para a Europa.

“Todos os países – países de onde as crianças partem, os que atravessam e aqueles em que procuram asilo – têm a obrigação de criar sistemas de proteção centrados nos riscos que as crianças não acompanhadas enfrentam. Na União Europeia e noutros países de destino, esta é uma oportunidade para introduzir reformas políticas e legislativas que se traduzam por mais oportunidades para a criação de canais seguros, legais e regulares para estas crianças”, referiu ainda a coordenadora especial da UNICEF para a crise de refugiados e migrantes na Europa.