A ideia teve vida curta, ainda que o Bloco de Esquerda mantenha tudo o que disse no domingo na Convenção do partido. A líder bloquista, Catarina Martins, pôs na agenda a hipótese de Portugal fazer um referendo sobre a União Europeia (não foi clara sobre a matéria específica), se Bruxelas aplicar sanções a Portugal (a decisão já em julho). Mas ainda no pavilhão do Casal Vistoso, onde se reuniu o BE este fim-de-semana, o Governo arrumou o assunto e, de forma ainda mais taxativa, o Presidente da República fez o mesmo poucas horas depois. O aviso ficou: quem marca os referendos é ele.
“O centrão sempre impediu quaisquer consultas, mesmo quando as tinha prometido”, escreveu Jorge Costa na sua página pública do facebook, no domingo ao fim da noite, recuperando um cartaz antigo do Bloco de Esquerda, que quis referendar o Tratado Orçamental Europeu.
Uma resposta às declarações que foram aparecendo, tanto logo no espaço onde decorreu a Convenção, como mais tarde, quando o primeiro-ministro se reuniu com os partidos e ainda em Torres Vedras, onde esteve o Presidente da República. E tudo começou nesta declaração de Catarina Martins:
Se tomar uma iniciativa gravíssima de provocar Portugal, a Comissão [Europeia] declara guerra a Portugal. Pior ainda: se aplicar sanções e as usar para pressionar o Orçamento [do Estado] para 2017 com mais impostos, declara guerra a Portugal. E Portugal só pode responder recusando as sanções e anunciando que haverá um referendo nacional”
No Governo, a rejeição imediata coube a Pedro Nuno Santos, ele que, em 2012, rompeu com a direção socialista de António José Seguro, por esta viabilizar o Tratado Orçamental Europeu. Mas os tempos são agora outros, no PS e no Governo: “Não nos parece que seja tempo para referendos, é tempo para defendermos uma Europa capaz de responder aos problemas sentidos pelos povos europeus e esse é um objetivo também nosso”.
No outro parceiro na maioria de esquerda, o PCP, Jerónimo de Sousa lembra que “as decisões a adotar pelo povo português em relação à defesa da soberania e independência nacionais não obrigam necessariamente à realização de um referendo“. Os comunistas são, tal como o Bloco, críticos da política europeia, defendendo também que se rompa com os tratados e até com o euro, mas a posição oficial do partido não vai além da “urgência e a necessidade de Portugal se preparar e estar preparado para se libertar da submissão ao euro”. Mas isto é um “processo”, frisa Jerónimo”, e não “um ato súbito”. Em 2014, o mesmo líder comunista defendeu a consulta popular, numa entrevista à Antena 1, mas sobre a saída do euro: “O povo português nunca foi chamado para se pronunciar sobre instrumentos fundamentais que hoje condicionam a nossa soberania”.
Mesmo que a esquerda estivesse interessada em agir como um bloco nesta matéria, ela não teria pernas para andar, com Marcelo Rebelo de Sousa a dizer pouco, mas tudo: “Portugal está na União Europeia, sente-se bem na União Europeia e quer continuar na União Europeia. Quanto ao resto, a Constituição diz que a decisão sobre o referendo é do Presidente da República e, portanto, é uma questão que não se põe neste momento”.
À direita, sem surpresa, Passos Coelho considera que “não é correto instrumentalizar os portugueses num quadro de guerrilha política entre Portugal e a Comissão Europeia por causa de sanções”. Já no CDS, Assunção Cristas aproximou-se da posição do Governo: “Não é tempo de referendar nada”.