Tem mais de cem anos, mas continua a ser uma importante rota para o comércio internacional. O canal do Panamá estava em obras de ampliação há quase nove anos, e este domingo foi finalmente inaugurado o terceiro troço de navegação. Numa obra tão grandiosa, os números são surpreendentes. As obras de expansão vão duplicar a capacidade de carga da via aquática do canal.

Agora que as obras estão terminadas, olhamos para o que já mudou com o canal do Panamá e analisamos os impressionantes números para ver o que vai mudar numa das mais impressionantes infraestruturas do mundo.

Os impactos de uma das maiores obras de engenharia de sempre vão muito além do desenvolvimento económico da região e dos Estados Unidos (país que administrou o canal até 1999). A BBC Mundo fez um levantamento do que mudou no mundo com a construção do canal do Panamá.

O nascimento do Panamá

A região que é atualmente o Panamá foi uma província da Colômbia e talvez continuasse a ser se não fosse o interesse dos Estados Unidos no canal. Os norte-americanos já tinham comprado os direitos de exploração aos franceses, que tinham o primeiro contrato de concessão, mas os colombianos não queriam chegar a acordo. Impaciente, o então presidente Roosevelt decidiu apoiar as forças independentistas panamianas, que em retorno garantiram um acordo generoso de exploração do canal aos Estados Unidos. E assim nasceu um país.

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O desenvolvimento de uma pequena ilha caribenha

A 2.300 quilómetros para este do Panamá fica a pequena ilha de Barbados. Hoje em dia é o 51.º país mais rico do mundo em termos de PIB per capita e é também um dos mais importantes centros financeiros das Caraíbas. Quando o canal foi construído, o país tinha pouco mais que 150.000 habitantes enviou 19.900 homens para trabalhar na construção e ainda mais 25.000 emigrantes por conta própria. Os barbadenses representavam 44% de todos os trabalhadores do canal.

As remessas enviadas para o país ajudaram, mas o que realmente contribuiu para o desenvolvimento do país foi o facto de grande parte da sua mão-de-obra ter abandonado o país, o que contribuiu para a melhoria das condições de trabalho para os que ficaram. Os salários aumentaram, as mulheres começaram a trabalhar e industrializaram o setor açucareiro, principal atividade económica da ilha.

O “dinheiro do Panamá” contribuiu para consolidar o sistema de segurança social e educar a população. Em 1921, 94% da população era abrangida pela segurança social.

Campanha exemplar de saúde pública

Durante a construção do canal, os Estados Unidos implementaram medidas de combate à malária e à febre-amarela que ainda hoje inspiram modelos de saúde pública em todo o mundo.

Quando os norte-americanos pegaram na concessão, que até então pertencia aos franceses, tiveram que resolver vários problemas no projeto inicial e adaptá-lo à difícil geografia do Panamá. Mas os problemas herdados dos franceses não ficaram por aí. Durante a construção morreram 25.609 trabalhadores, sendo que 22.819 dessas mortes aconteceram sob a alçada dos franceses.

Todas essas mortes deveram-se à malária ou à febre-amarela. Foi então que o epidemiologista William Gorgas implementou uma ambiciosa estratégia de saúde pública que salvou a vida a milhares de pessoas. Na altura já tinha sido provada a ligação entra as doenças e os mosquitos. O modelo foi inspirado no implementado durante a guerra hispano-americana, mas foi a sua aplicação no Panamá que lhe deu visibilidade mundial. Este foi provavelmente o maior contributo da construção do canal para a região.

Um império da aviação

Embora os Estados Unidos tenham previsto que o canal do Panamá tivesse um papel fundamental na expansão do país, o efeito real do canal para a afirmação da América do Norte como potência mundial não foi assim tão impressionante. No entanto, foi essencial para o desenvolvimento de algumas regiões no noroeste do país e algumas regiões do Canadá. Uma destas regiões foi o estado de Washington, que viu a procura interna pela madeira lá produzida a aumentar.

O sucesso da indústria da madeira permitiu a William Boeing criar uma empresa de aviação. A Boeing é, ainda hoje, um dos principais fabricantes de aviões.

Aproveitar o crescimento da China

O canal permitiu também o desenvolvimento de países como o Chile e o Japão que aproveitaram a redução dos custos para canalizar os seus produtos para a costa este dos Estados Unidos e para a Europa Atlântica. Foi também um potenciador do boom económico da China, já que facilitou o acesso a países como a Argentina e o Brasil e até mesmo algumas regiões dos Estados Unidos.

Nos Estados Unidos, a procura interna por carvão diminuiu, mas o canal do Panamá permite transportar a menores custos carvão recolhido na costa este para países asiáticos.

O que vai mudar?

As obras de extensão do canal do Panamá serviram para abrir uma terceira via onde possam circular navios de grandes dimensões. O novo canal vai aumentar a circulação de carga em mais do dobro, já que antes das obras, só passavam navios capazes de levar até 5.000 contentores e agora prevê-se que passem pelo canal navios com uma capacidade de carga até 14.000 contentores. O aumento da capacidade de carga deverá ter um impacto direto na economia e no comércio marítimo internacional.

As obras serviram para criar terceira via de circulação com 6,1 quilómetros de comprimento. Foram construídos dois sistemas de represas, um do lado do Pacífico (Água Clara), outro do lado do Atlântico (Cocolí). As represas têm três câmaras de água que permitem a sua reutilização. Este sistema permite uma poupança de 7% de água. As represas têm 427 metros de comprimento, 55 metros de largura e 18,3 metros de profundidade. Cada complexo de represas tem 16 comportas de rolamento. As comportas têm em média 30 metros de altura e pesam 3.200 toneladas.

O projeto custou mais de 4.720 milhões de euros e nele trabalharam 40.000 pessoas. Durou quase nove anos a estar finalizado.