Foi recebido por uma multidão de apoiantes no aeroporto de Istambul, mas as quatro horas que antecederam o momento traduziram-se em 265 mortos: 104 rebeldes e os restantes eram civis e polícias. Tayyip Erdogan é o presidente que foi alvo de um golpe de Estado (falhado) na Turquia. Tinha prometido aos turcos “uma fusão esperançosa do Islão com a Modernidade”, mas o seu mandato como Presidente tem sido mais marcado pela divisão e o maior exemplo disso chegou na noite desta sexta-feira. Enquanto os militares rebeldes decretavam a Lei Marcial e exigiam o recolher obrigatório, o Governo convocava todos agentes da polícia nacional e pedia a sublevação do povo contra os rebeldes.

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Tayyip Erdogan está longe de ser um nome consensual entre os líderes ocidentais. No centro da divisão está a forma como tem tratado questões relacionadas com os Direitos Humanos. No discurso que fez depois da vitória sobre o golpe de Estado de que foi alvo, deixou a garantia de que os golpistas iam “pagar o preço mais elevado”. Este sábado, questionado pelos jornalistas, o primeiro-ministro Binali Yildirim — líder do partido fundado por Erdogan — avançou que não está afastada a hipótese de reintroduzir a pena de morte no país.

Erdogan emergiu na conferência de imprensa como herói nacional e a verdade é que o presidente turco nunca escondeu as ambições de reforçar legalmente os seus poderes. “Desde que ames as pessoas sincera e profundamente, as pessoas amar-te-ão”, disse numa entrevista à CNN, em março. Mas tem sido de amor e ódio que tem feito o seu percurso à frente da Turquia, alimentado sobretudo pelos conflitos fronteiriços com a vizinha Síria.

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Desde o início desta tensão, em 2012, que Erdogan a tem utilizado como uma oportunidade para derrubar o Partido dos Trabalhadores Curdos (PKK), que é também considerado uma organização terrorista pela NATO e pelos Estados Unidos. Por estar dedicado a combatê-la, Erdogan tem utilizado esta luta a seu favor, enquanto leva avante uma política rígida de censura à internet. Só a título de exemplo: o Twitter, o Facebook e o Youtube são frequentemente bloqueados na Turquia, explica a CNN. Todos aqueles que tentaram investigar o seu governo por corrupção também viram o seu caminho vedado.

A difícil relação com a imprensa

Em março, o presidente turco foi acusado de estar a lançar uma ofensiva nacional contra a dissidência nos media e contra a sociedade em geral. No início do ano, as autoridades turcas passaram a controlar o maior jornal do país e vários jornalistas foram acusados e julgados por espionagem, depois de publicarem um vídeo que mostrava agentes das forças de inteligência a canalizarem armas para a Síria. Nessa altura, Erdogan afirmou que “não estava em guerra com a imprensa”.

A CNN dá conta que que desde que Erdogan assumiu a presidência do país em 2014, houve mais de 1.800 casos judiciais que envolviam insultos ao presidente. Na Turquia, insultar o líder o país é crime. Toda esta relação conturbada com a comunicação social tem contribuído para a hesitação dos líderes europeus no processo que envolve a entrada da Turquia na União Europeia, para quem a liberdade de expressão e imprensa é um dos pilares fundamentais. Para Erdogan, essas questões são “obstáculos irrelevantes”.

Erdogan também é conhecido pelas suas fortes convicções religiosas e extremamente conservadoras. Desde que assumiu a presidência que a religião tem desempenhado um papel cada vez mais importante na Turquia. Entre os anos 1970 e 1980, Erdogan foi militante ativo dos círculos islâmicos. O líder dos turcos tem utilizado o seu poder no Médio Oriente para influenciar as negociações de paz entre os israelitas e palestinianos.

O presidente que podia ter jogado no Fenerbahce

Aos 62 anos, o presidente que dividiu a Turquia é casado com Emine Gülbaran desde os 35. É pai de quatro filhos: dois rapazes — Ahmet Burak e Necmettin Bilal — e duas raparigas — Esra e Sümeyye. Na adolescência, Erdogan vendia limonadas e sementes de sésamo para ajudar a família e entre 1969 e 1982 jogou futebol em clubes locais. Os órgãos de comunicação turcos chegaram a avançar que o Fenerbahce — um dos melhores clubes de futebol turcos — queria contratá-lo, mas que o seu pai não deixou, conta o The Telegraph.

Foi na Universidade que acabou por conhecer o ex-primeiro-ministro turco Necmettin Erbakan. Acabou por tornar-se seu mentor. Em 1994, foi eleito presidente da Câmara Municipal de Istambul, o primeiro islamita a desempenhar esse papel. Três anos depois, foi julgado e esteve preso durante 10 meses por incitamento ao ódio religioso, quando leu um poema na cidade de Siirt que dizia que “as mesquitas são as nossas casernas”.

Antes de ser presidente da Turquia — o primeiro eleito no país –, foi primeiro-ministro do país entre 2003 e 2014. Foi sob a sua liderança política que o país se tornou numa força de poder no Médio Oriente e levou a cabo um processo de expansão económica. Em 2015, concorreu à presidência e venceu, mas dividiu o Parlamento, provocando várias manifestações e atentados terroristas e, inevitavelmente, eleições antecipadas. Nestas eleições foi o seu partido islamita, o AK — que fundou em 2001 com Abdullah Gul –, que ganhou. Hoje, o primeiro-ministro é Binali Yildirim.