O vice-almirante Rocha Carrilho interpôs quarta-feira uma providência cautelar contra o Chefe do Estado-Maior da Armada, Macieira Fragoso, requerendo a suspensão imediata da sua exoneração como superintendente do Pessoal da Marinha Portuguesa.

De acordo com o documento entregue quarta-feira no Tribunal Administrativo de Círculo de Lisboa, a que a agência Lusa teve acesso, o vice-almirante Rocha Carrilho instaurou, em seguida à providência cautelar, um processo de impugnação que pretende a nulidade e anulação da exoneração, que foi decidida em despacho do CEMA de 27 de junho.

Rocha Carrilho, um dos quatro vice-almirantes (generais de 3 estrelas), tinha sido nomeado Superintendente dos Serviços de Pessoal em 2014 e transitará para a situação de reserva em abril de 2018, ao completar nessa data 10 anos em oficial general.

A defesa de Rocha Carrilho requer a suspensão da eficácia da exoneração até que seja decidida a ação principal de impugnação. O vice-almirante alega que o ato de exoneração violou a lei, carece de fundamentação e foi decidido “com base em factos falsos ou inexistentes”. Para além disso, argumenta, não cumpriu os requisitos formais de audiência prévia.

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Não é a primeira vez que uma decisão de um chefe militar é alvo de um processo de impugnação judicial mas é inédito o facto de ter partido de um vice-almirante, ao nível do topo da hierarquia da Marinha (há apenas 4 vice-almirantes).

Segundo o processo, a defesa do general Rocha Carrilho alega que a “intenção real” do CEMA foi a de o afastar do serviço e dos cargos de comando, direção e chefia, sem a necessidade de promoção de qualquer procedimento prévio de natureza disciplinar ou outro, forçando-o a requerer a passagem à reserva antes da data prevista, uma vez que já o podia fazer.

Segundo se pode ler nos documentos que deram entrada no Tribunal, Rocha Carrilho foi exonerado pelo CEMA em despacho de 27 de junho “por perda de confiança”, mas o vice-almirante alega que nada no despacho fundamenta a decisão, os motivos ou os critérios, afirmando-se ofendido nos seus direitos militares e profissionais.

Mais à frente, num despacho de 15 de julho parcialmente reproduzido no processo, pode ler-se que o CEMA considerou que “por diversas ocasiões os atos praticados” pelo vice-almirante na qualidade de Superintendente do Pessoal “revelaram-se desajustados e desalinhados com a política previamente definida, dificultando o respetivo processo de apoio (p.ex. reforço de pessoal nas estações salva-vidas, apoio à Escola da Autoridade Marítima) num contexto em que o próprio modelo estava a ser externamente atacado”.

O CEMA invocou ainda que constatou “estas e outras dificuldades que foram criadas ao longo do tempo no relacionamento Marinha/Autoridade Marítima Nacional na área do pessoal”.

“Não pode o CEMA como responsável por ambas as estruturas, permitir a continuação do presente cenário, com os inegáveis prejuízos para a missão de ambas as estruturas e com os danos provocados junto dos órgãos de soberania e da tutela política na avaliação do desempenho que fazem das mesmas estruturas”, refere o CEMA, no despacho citado no processo.

Por seu lado, o vice-almirante responde na providência cautelar a estas alegações afirmando que “é inteiramente falso que o requerente alguma vez tenha dificultado, entorpecido ou prejudicado a missão e funcionamento” da Autoridade Marítima Nacional, estrutura civil, cujos cargos de direção são ocupados por militares.

Em sua defesa, o vice-almirante sublinhou que os “diplomas legais sucessivamente vigentes traduziram-se numa redução muito significativa na fixação dos efetivos militares da Marinha”.

Atendendo a isso, o vice-almirante descreve em seguida os passos que deu na gestão do pessoal disponível para as duas estruturas e frisou que a sua atuação “sempre colheu a aprovação” do CEMA.

Rocha Carrilho não deixou de notar que o trabalho que realizou, com “aprovação” do CEMA, “foi sempre objeto de alguma resistência no âmbito da Direção-Geral da Autoridade Marítima” e nota que “o esforço de ajustamento ocorrido no âmbito da AMN foi praticamente nulo, tendo ficado muito aquém do que foi imposto a outros setores da Marinha”.

Apesar disso, prossegue, “não pode deixar de ser interpretado como altamente cooperante o facto de, à data da sua exoneração, prestarem serviço na AMN um total de 322 militares”, número superior ao quantitativo fixado em despacho ministerial, que é de 280.

O vice-almirante afirmou que “não corresponde à verdade” que os atos praticados na qualidade de Superintendente do Pessoal se tivessem revelado “desajustados e desalinhados com a política previamente definida, dificultando o respetivo processo de apoio”.

Sobre a forma como decorreu o processo de exoneração, Rocha Carrilho descreve a sua “estupefação e incredulidade”, referindo mesmo que no dia 19 de maio passado, o CEMA terá comunicado, perante oficiais com assento no Conselho do Almirantado, que “ia propor” o então Superintendente de Pessoal para o cargo de Vice-Chefe do Estado-Maior da Armada, após a passagem à reserva do atual titular, em finais de agosto.

A ação de Rocha Carrilho, que indicou cinco testemunhas em sua defesa, entre os quais dois vice-almirantes, um no ativo e outro na reserva, e dois contra-almirantes, foi aceite pelo tribunal e a notificação ao CEMA seguirá na próxima semana, disse à Lusa fonte ligada ao processo.