Autarcas e ambientalistas de Arouca exigiram nesta terça-feira do Governo a imposição de limites à plantação de eucalipto nos 170 quilómetros quadrados de área ardida no concelho, por essa espécie “arder como pólvora” quando outras resistem melhor ao fogo. Em declarações à Lusa, o presidente da Câmara defende que essa medida é essencial para evitar “erros do passado” ao nível da gestão florestal.

“Já em 2005 perdemos 90 quilómetros quadrados e não se aprendeu nada. Cada proprietário fez como lhe apeteceu, só se plantou eucalipto e ele agora ardeu todo como pólvora, enquanto as zonas que tinham árvores autóctones funcionaram muito melhor como barreira ao incêndio, por essas espécies demonstrarem maior resistência ao fogo”, diz José Artur Neves.

Margarida Belém, vereadora do Turismo na autarquia, realça, aliás, que o elevado potencial de combustão dos eucaliptais foi determinante “na desgraça que se abateu sobre o património local da Rede Natura 2000”, cujos habitats de fauna e flora selvagens estavam protegidos por diretivas europeias.

“Perdemos 47% do nosso espaço Natura e, dos três biótopos identificados em Arouca, só não desapareceu o da serra do Montemuro. O da Serra da Freita e o do Vale do Paiva arderam totalmente”, realça a autarca.

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É assim por razões ambientais e económicas que José Artur Neves reclama do Governo “a definição de um plano de reflorestação à escala de cada município”.

O autarca admite que a recuperação das áreas ardidas tenha que obedecer a uma orientação nacional, mas propõe abertura legal para que cada concelho “adote um plano de ordenamento e gestão florestal próprio, a implementar de forma integrada com os territórios vizinhos”. “De outra maneira, o Estado não tem forma de controlar os riscos e nunca mais põe fim a este ciclo de horror que desestabiliza a vida de toda a gente”, observa.

Sérgio Caetano, presidente da associação ambientalista SOS Rio Paiva, também exige uma “reflorestação inteligente” para Arouca, não apenas porque “a maior parte da mancha florestal portuguesa já está coberta de eucalipto e é preciso inverter esse cenário”, mas também porque os proprietários agrícolas enfrentam “um problema social crescente, que é a dependência económica da monocultura – sobretudo desse mesmo eucalipto”.

O ambientalista reivindica, por isso, “legislação que obrigue a reflorestar a área ardida com plantas autóctones como carvalhos, freixos, amieiros, sobreiros e teixos”, cuja distribuição geográfica deverá respeitar as características específicas de cada espécie, já que “umas são mais adequadas às margens de rio e outras mais ajustadas à montanha”.

Essas árvores obrigam, contudo, a sementeira ou enxerto, ao contrário do eucalipto, que regenera por si mesmo depois de queimado, inclusive “com vigor reforçado”.

Por esse motivo, as espécies autóctones nem sempre estarão disponíveis com abundância em idade própria para transplantação, pelo que Sérgio Caetano também gostaria que “os viveiros do Instituto da Conservação da Natureza e da Floresta pudessem dar melhor resposta” à procura verificado no período pós-incêndio.

“Nos últimos anos tem-se assistido a um desinvestimento muito grande na floresta e nos guardas florestais, que se encarregavam de cultivar essas espécies quando era preciso”, recorda o ambientalista. “O Governo tem que perceber de uma vez que é mais importante apostar-se na prevenção do que no combate a incêndios, porque o problema não está na falta de meios – está é nesta confusão como o território está ordenado”, argumenta.

O incêndio de 2016 com maiores proporções em Arouca deflagrou a 8 de agosto em Janarde e às 14:00 de hoje ainda estava em fase de rescaldo, depois de ter chegado a ser combatido por mais de 900 bombeiros, com o apoio de nove meios aéreos.

Dos 328 quilómetros quadrados que constituem o concelho, 80% representava área florestal. De todo esse território, arderam 170 quilómetros quadrados, o que arruinou 58% da floresta do município. Essa destruição abrangeu 12.000 hectares de eucaliptal, do que resultam perdas avaliadas em 35 milhões de euros, e 5.000 hectares de pinheiro, que teriam rendido 60 milhões.

Apiários, veículos e edifícios agrícolas como palheiros e currais contam-se também entre os bens destruídos em Arouca, embora de valor ainda por apurar. Considerando as perdas esperadas na economia local ao nível da afluência turística, a autarquia estima assim em 120 milhões de euros os prejuízos totais resultantes do incêndio – que alastrou também a S. Pedro do Sul, no distrito de Viseu, onde arderam mais 120 quilómetros quadrados.