Inventou o jogo de pés no boxe antes de Muhammad Ali e desafiou o III Reich antes de Jesse Owens, o negro que competiu pelos Estados Unidos e enfureceu Hitler ao ganhar quatro medalhas nos Jogos Olímpicos que se realizaram em Berlim, em 1936. Mas, ao contrário destes, o nome de Johann Trollmann não consta nos compêndios do desporto. E isso deve-se ao nazismo na Alemanha, que retirou-lhe uma vitória no campeonato nacional. Antes disso, já tinha sido afastado dos Jogos Olímpicos de 1928, conta o ABC.

Johann Trollmann nasceu em 1907 na região de Hannover. Era cigano. O boxe acompanhou-o desde cedo. Antes dos 20 anos já tinha ganhado vários títulos em competições regionais. E fê-lo cunhando uma tática que não era comum na época. O seu ponto forte não era tanto a força, mas a habilidade do seu jogo de pernas. Mas o estilo que podia ter levado “Rukeli” ao sucesso, foi também o que o condenou.

Ainda antes da ascensão de Hitler ao poder, o pugilista foi impedido de representar a Alemanha nos Jogos Olímpicos de 1928, porque o seu estilo era “pouco alemão”. Quando o Führer chegou à liderança da Alemanha e instaurou o III Reich, a situação, já difícil, piorou para Trollmann.

A 9 de junho de 1933, “Rukeli” disputava o título contra Adolf Witt e o combate indicava que seria mesmo o atleta cigano a vencer a disputa. Mas o combate foi suspenso sem razão aparente e os juízes recusaram-se a atribuir a Trollmann a vitória. Só mesmo os clamores do público é que fizeram com que lhe fosse concedido o título, que acabou por lhe ser retirado uma semana depois. Ficou estabelecido que seria disputado um novo combate para decidir o campeão. A decisão, segundo os responsáveis, deveu-se à tática adotada por Trollmann, que era inaceitável. Na verdade, só não queriam ter um campeão cigano.

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O combate da desforra foi marcado para dia 21 de julho. Johann Trollmann tinha recebido instruções de que devia “lutar como um verdadeiro alemão” e estava proibido de “bailar como um cigano”. Quando pisou o ringue, fê-lo em protesto. Tinha coberto o seu corpo de farinha e tinha pintado o cabelo de loiro. Não se mexeu durante todo o combate e limitou-se a receber impávido as investidas do adversário. Sangrou até cair. Foram precisos cinco assaltos até que isso acontecesse.

A sua carreira terminou por ali. Como tantos outros ciganos na Alemanha Nazi, foi esterilizado e teve que se divorciar para proteger a sua família. Juntou-se à Wermacht, forças armadas alemãs do III Reich, em 1939 e foi preso pela Gestapo, torturado e enviado para um campo de concentração em 1942. Lá, frequentemente combatia para entreter as tropas. Um dia combateu Emil Cornelius, um “kapo” do campo, e ganhou-lhe. O derrotado atacou-o com um pau e assassinou-o brutalmente.

A memória do pugilista é preservada pelo blog Holocaust Memorial Day Trust. Em 2003 foi entregue à sua família o cinturão de campeão nacional que lhe foi retirado e foram erguidos monumentos em sua memória em Hamburgo e Berlim.