O Ministério Público (MP) está a investigar a existência de um eventual crime no processo de reabilitação do Mercado do Bolhão, no Porto, disse à Lusa fonte da Procuradoria-Geral da República.

A abertura deste inquérito surge na sequência da queixa que o arquiteto Joaquim Massena apresentou na semana passada no Departamento de Investigação e Ação Penal (DIAP) do Porto sobre o processo de reabilitação daquele mercado centenário do Porto.

“A participação apresentada pelo arquiteto Joaquim Massena originou a abertura de inquérito no DIAP do Porto com vista a aferir da existência de ilícito criminal”, afirma fonte da Procuradoria-Geral da República (PGR) numa resposta enviada à Lusa.

Na quinta-feira, o jornal Público noticiou que Joaquim Massena, autor de um projeto de 1998 para o Bolhão, apresentou uma participação ao MP, considerando que “há, pelo menos, duas questões relacionadas com o projeto e o processo do mercado que violam a Lei de Bases do Património Cultural”.

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Contactado hoje pela Lusa, Nuno Santos, adjunto do presidente da Câmara do Porto, afirmou que a autarquia “está tranquila” em relação à participação do arquiteto.

“A Câmara está consciente de ter cumprido todos os procedimentos legais e administrativos, nomeadamente com entidades que supervisionam as áreas do ambiente e do património”, disse, recordando que esta é a segunda participação de Massena ao MP e que a primeira, apresentada em 2015, foi arquivada.

De acordo com o diário, a anunciada demolição das barracas do terrado do mercado, que recebeu parecer favorável da Direção Regional de Cultura do Norte, bem como da Direção Geral do Património Cultural, é uma das questões levantadas pelo arquiteto, que considera estarem “impecáveis” e serem “um modelo de construção notável”.

O arquiteto defende também que a intervenção no subsolo de desvio de uma linha de água que atravessa todo o imóvel para as ruas Sá da Bandeira e Fernandes Tomás pode ser “perigosa” e “criar problemas até às construções envolventes”, acrescenta o Público.

Contactado pelo Observador, Joaquim Massena diz que o começo da investigação pelo Ministério Público não o deixa “feliz”. “Preferia que a queixa apresentada ao DIAP significasse que os comerciantes não vão mesmo sair do Bolhão”. A mudança temporária para o centro comercial La Vie está prevista para o início de 2017.

“Quando os comerciantes saírem do mercado, nunca mais vão voltar. A tradição vai-se embora com eles”, afirma o arquiteto ao Observador.

Joaquim Massena lembra o projeto de reabilitação do Mercado do Bolhão, apresentado em 1998 durante o mandato de Fernando Gomes, na altura presidente da Câmara Municipal do Porto, e que acabou por ser descartado sem que tenham sido apresentadas quaisquer razões — o ex-autarca em 2008 criticava Rui Rio, então presidente da câmara, por pretender “transformar o Bolhão num shopping”.

Embora a autarquia se defenda com pareceres favoráveis das autoridades públicas responsáveis, Joaquim Massena contrapõe com a ausência de um estudo de impacto ambiental, “que caso exista, ainda não foi apresentado publicamente”. O Observador contactou a Agência Portuguesa do Ambiente para confirmar que tinha sido dado parecer positivo às obras que, desde o início do mês, se destinam a desviar uma linha de água que passa sob a construção, e também para saber se tinha sido feito algum estudo de impacto ambiental, mas sem resposta.

Relativamente à queixa que viu arquivada em 2015 pelo Ministério Público, Massena afirma que “não tem nada a perder e não tem receio de levantar as questões necessárias”.

O Observador contactou o arquiteto Nuno Valentim, um dos responsáveis pelo novo projeto de reabilitação do Mercado do Bolhão, que afirmou não ser o momento indicado para entrar em mais detalhes sobre o processo.

As obras relacionadas com a recuperação do mercado centenário do centro do Porto começaram no dia 1 de agosto, mas decorrem no exterior do espaço. O início da reabilitação do edifício está agendado para o primeiro trimestre de 2017, tal como a transferência dos lojistas para o centro comercial La Vie Porto, situado nas imediações.

O custo total da operação de restauro e modernização do Bolhão, incluindo a “adaptação do espaço do mercado temporário”, as “empreitadas de desvio de águas e construção do túnel” e “todo o processo de criação de imagem e promoção do mercado” é de cerca de 27 milhões de euros.