A Organização das Nações Unidas (ONU) celebrou inúmeros contratos com empresas, organizações sociais e departamentos governamentais ligados direta ou indiretamente ao presidente sírio, Bashar al-Assad. Uma investigação do jornal britânico The Guardian revelou esta segunda-feira que, através de contratos que valem dezenas de milhões de dólares, o regime tem conseguido controlar de que forma e a quem é distribuída a ajuda humanitária no país, que está em guerra civil há já seis anos.

Segundo o jornal, os contratos abrangem diversas áreas e várias entidades. Por exemplo, a ONU pagou 13 milhões de dólares ao governo de Assad para melhorar as condições agrícolas da Síria e quatro milhões à empresa estatal de petróleo. Por outro lado, a Organização Mundial de Saúde (OMS) — dependente da ONU — apoiou o banco de sangue sírio com mais de cinco milhões de dólares. Este banco é controlado pelo Ministério da Defesa do regime e, de acordo com documentos citados pelo The Guardian, a própria OMS teme que o sangue seja dado prioritariamente aos soldados de Assad e não às populações.

Outros contratos foram feitos com organizações de caridade controladas por pessoas próximas de Assad. É o caso da Syria Trust, liderada pela mulher do presidente sírio, que recebeu 8,5 milhões de dólares. Outro exemplo é a Associação Al-Boustan, de Rami Makhlouf, milionário e primo de Bashar al-Assad. Neste caso foi a Unicef que celebrou um contrato, gastando quase 300 mil dólares.

Para um porta-voz da ONU, a opção por estas empresas e organizações é a única que garante que a ajuda humanitária chega ao país. “Quando confrontados com a decisão de escolher entre ter bens e serviços de empresas que podem estar associadas ao governo ou deixar os civis sem qualquer assistência, a escolha é clara: o nosso dever é para com os civis necessitados”, disse. Outra fonte das Nações Unidas disse ao jornal que a organização soube sempre com o que contava. “A equipa soube desde os primeiros dias do conflito que nem o Governo nem a sua lista de associações locais autorizada a fazer parcerias com a ONU poderia ser considerada como um exemplo dos princípios humanitários da independência, neutralidade e imparcialidade.”

Em junho, um relatório da Syrian Campaign — um grupo focado em chamar a atenção do mundo para o conflito na Síria — acusou a ONU de ter perdido a imparcialidade, a independência e a neutralidade na missão humanitária. “Ao priorizar a cooperação com o governo sírio a todo o custo, a ONU permitiu que a distribuição de milhares de milhões de dólares de ajuda internacional fosse controlada por um lado do conflito. Isto contribuiu para a morte de milhares de civis, quer através da fome, problemas decorrentes da má nutrição ou falta de acesso a ajuda médica”, lê-se no documento.

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