Maradona. Diego Armando Maradona.

É preciso dizer mais alguma coisa? Quer dizer, é O Maradona. Chega e sobra, certo? Ao que parece, não é bem assim e temos de contar a história blá blá blá yada yada yada. Pois bem, aqui vai: há 40 anos, a 6 de setembro de 1976, é o dia em que é suposto o número 10 dos juvenis do Argentinos Juniors estrear-se no futebol profissional. Tal não sucede por manifesta má vontade. Do árbitro. E, vá, de Maradona.

Sim, O homem debita palavrões a torto e a direito a propósito de uma falta de somenos importância e é suspenso por cinco jornadas. Uauuuu, afinal o debitar é mais prò torto que a direito. Cinco jogos para um miúdo de 16 anos é muuuuuito. Entre alguns *$# e outros &%\@, ao estilo do bom do Capitão Haddock, o pibe ainda atira isto ao árbitro: “Usted es un fenómeno—. Raro que no dirija partidos internacionales”. Bom, o comité de árbitros da federação argentina recebe o relatório e aplica uma suspensão longa. Que obriga a uma paragem de mais de um mês. Assim mesmo, em jeito de lição para o futuro.

Maradona não contesta a pena nem o Argentinos. Cinco jogos são cinco jogos, ponto. Nada de recursos e afins. A lei, acima de tudo. Tino Rey está desconsolado. “Tenho pena, porque ele tem mais que maturidade para jogar com os ‘mayores’.” Tino é o treinador de Maradona nos juvenis e já havia dado o toque ao seu congénere da equipa sénior, um tal Juan Carlos Montes. “É um fenómeno, merece já já uma oportunidade.” Nesse período dos cinco jogos de suspensão, Maradona aproveita para ganhar rodagem ao serviço da selecção sub-17 e é aí que dá este pedaço maravilhoso de entrevista a um jornalista argentino, à saída de um treino, que transcrevemos:

Como tudo começou?
Desde que me lembro, tive sempre uma bola nos pés. Comecei a jogar aos seis anos no Fiorito [vila nas imediações de Buenos Aires). O meu pai nasceu em Corrientes [bairro em Buenos Aires] e jogou futebol. Muito bem, dizem-me. Eu acredito. Já o vi a dar toques. É bom, sim senhor. E, claro, puxou-me para o mundo da bola. Sempre me incentivou. Um dia, o meu amigo Gregorio Carrizo foi fazer testes ao Argentinos Juniors. Na semana seguinte, levou-me. Tínhamos dez anos de idade e começámos no baby [infantis]. No ano seguinte, formou-se a grande equipa do Cebollitas. Todos juntos, passámos à Novena [escalão seguinte] e ganhámos o campeonato de 1973. Em 1974 e 1975, joguei na Octava do Argentinos. Sempre como número dez. E sempre a fazer o mesmo que fazia no Fiorito. Acho que tenho habilidade. Francisco Cornejo era o nosso treinador. Disse-me uma frase marcante: ‘O futebol não se pode ensinar. Só posso dar conselhos e ajudar-vos a jogar em equipa.” Isso ajudou-me, e de que maneira.

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Mas começaste a dar espetáculo já há algum tempo…
Terá sido em 1972 ou 1973, não? Nos intervalos dos jogos em casa do Argentinos Juniors, entrava em campo e dava toques sem parar. Era mais um exercício de lazer, nada mais. Não estava ali a autopromover-me nem nada disso. Só faço aquilo de que gosto muito. Nem gosto de publicidade.

Este ano tem sido de loucos. Queimaste muitas etapas de uma só vez.
Siiiiiim, bem bom, no? Tenho idade de Séptima e comecei o ano na Quinta. De repente, Tino Rey viu-me em ação e leva-me para a Tercera. Fiz alguns particulares e as coisas correram-me bem. Juan Carlos Montes diz-me então que vou ficar no plantel da Tercera. Tudo bem. Um dia, vamos jogar com os Estudiantes a La Plata e, quando vou a sair do autocarro, Montes diz-me que vou para o banco num particular da Primera [os seniores]. Jogo cinco minutos. Depois, meia-hora com o Atlanta. Voltei à Séptima, para um jogo decisivo com o Vélez. Como tenho o defeito de falar demasiado, o árbitro expulsou-se depois do final do jogo. E deram-me cinco jogos de suspensão.

E agora, pensas em quê?
Que chegue o dia da estreia o mais rápido possível. Estou preparado.

Saltaste da Séptima para a Primera, queres mais rápido ainda?
Se me meto a pensar nisso, ainda enlouqueço. Por isso, faço por relaxar sempre. Bebo muitos sumos para acalmar.

É perigoso chegar tão depressa à equipa principal?
Sim, é. Mas não vou dececionar ninguém. Nem a mim mesmo. Digo-o muito a sério. À minha volta, tenho muita gente crescida, que me quer bem.

E os estudos?
Estou a tirar o terceiro ano de comercial [agora, marketing] mas parece-me que vou ter de os abandonar para não faltar aos treinos. Eu só quero jogar à bola. Tenho esta coisa aqui dentro de mim.

E não tens medo de apanhar pancada nos jogos? Os mais habilidosos têm sempre essa sina.
Nunca tive medo. Nunca. E não me deixo ficar. Não quer isso dizer que vá reagir na mesma moeda, mas também sei dar sem ninguém ver. Vai ser um jogo interessante.

E as tuas fintas, não ficas enjoado? És egoísta?
Adoro fintar e driblar, uma e outra vez, mas não sou egoísta. Se vir um companheiro bem colocado, dou-lhe a bola.

Tens algum ídolo?
Claro, Bochini. O Bocha é um jogador fora de série [Ricardo Enrique Bochini, número 10 do Estudiantes, pentacampeão da Libertadores e bicampeão da Intercontinental]

Qual foi o teu melhor jogo?
Um na Octava, vs Estudiantes, em 1974. Saiu-me tudo bem, ninguém me podia parar. Ganhámos 5-1.