Daniel Solomons é um dos responsáveis da Google Digital Academy, a área de negócio da Google que ajuda agências, parceiros e clientes da multinacional a adquirir competências necessárias para liderarem no mundo digital. Ao Observador, por email, explicou como devem as empresas aproveitar a revolução digital para inovar, que desafios enfrentam os departamentos de marketing das empresas e o que devem fazer para ultrapassá-los. No final, tudo se resume ao talento – é ele quem “vai guiar a vantagem competitiva” das organizações.

Daniel Solomons

Na área da inovação digital, quais são os maiores desafios que as empresas enfrentam?

No mundo digital que vivemos hoje, os desafios são muitos. Alguns podem ser específicos a determinada empresa, mas outros são transversais a várias empresas e áreas de atividade. Por norma, recaem sobre três categorias: a estrutural, comportamental e a cultural. A nível estrutural, as questões que se colocam são as seguintes: a empresa está construída de uma forma que permita a partilha e a colaboração entre colaboradores? Tem os dados e os sistemas certos, que permitam à empresa inovar? Trabalha com os parceiros e com as agências certas naquele que é o caminho correto?

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Já a nível comportamental, a empresa é capaz de planear, agir e medir as melhores estratégias? Os colaboradores e os parceiros têm capacidade para fazer isso? A nível cultural, a cultura da empresa permite aos colaboradores desenvolverem e aprenderem [competências]? Há uma cultura de inovação (como por exemplo, a de falhar rápido)? A liderança da empresa vive e respira esta cultura e disponibiliza aos colaboradores as plataformas certas para abraçá-la?

O único fator chave que vemos em comum nas empresas que estão a crescer na era digital é a “adaptabilidade”. A tecnologia vai trazer-nos sempre novos desafios e novos focos às empresas. As que forem mais capazes de se adaptarem à mudança serão aquelas que vão evoluir. Uma grande parte da adaptação à mudança faz-se promovendo uma cultura de inovação. E isto não é algo que um conselho de administração possa pura e simplesmente decidir e implementar rapidamente: tem de estar incutido no ADN e na missão da empresa. Tem de ser entendido e absorvido por toda a gente na empresa, no comportamento dos colaboradores e dos líderes.

Como podem ultrapassar estes desafios?

O primeiro passo é ter vontade de abraçar os desafios e conduzir as mudanças necessárias para ultrapassá-los, especialmente ao nível da liderança. Para que isso aconteça, é importante compreendê-los e conhecer as áreas conde é preciso desenvolver competências. Um dos obstáculos que mais identificamos tem a ver com o facto de as empresas “ainda não saberem o que não sabem”.

Para vencer este desafio, a Google Digital Academy e o Boston Consulting Group juntaram-se ao The Knowledge Engineers, ao IAB, ao IPA, ao Marketing Academy, ao ISBA, à Marketing Society, ao BVDW e ao OWM e criaram a The Talent Revolution. Esta iniciativa da indústria serve para ajudar a desenvolver competências digitais numa sociedade e economia que é movida pela tecnologia. Foi lançada pela primeira vez em 2015 no Reino Unido e na Alemanha, mas em 2016 queremos chegar a mais países e disponibilizá-la em nove línguas.

Que conselhos dá às empresas que querem ser as primeiras a chegar ao mercado com um produto novo?

O nosso objetivo é a apoiar a revolução que se está a viver no talento digital, que permite aos marketeers tornarem-se na força motriz que sustenta o sucesso futuro dos negócios. O primeiro levantamento que fizemos no Talent Revolution disse-nos que existem três áreas chave nas quais as empresas se devem focar (mas com muito mais do que três coisas, em cada uma delas, a que devem prestar atenção).

A grande lacuna que existe entre o desempenho atual e aquelas que são as melhores práticas digitais é uma delas. Uma década depois, ainda faltam competências digitais que são essenciais a muitos departamentos de marketing. Os planos ainda estão muito aquém daquele que é o comportamento do consumidor hoje, especialmente em mobile e vídeo. Apesar de a mudança massiva que se deu no consumo com a internet, por causa dos smartphones e da explosão do vídeo online, as empresas permanecem extraordinariamente lentas a adotar aquelas que são as melhores práticas em termos de marketing e de publicidade em vídeo. Lutam para abraçar as novas tecnologias, que estão a automatizar o processo todo de planeamento e de compra. E poucas empresas têm uma aproximação robusta ao modelo “teste & aprenda”, apesar de isto ser crítico para progredir num espaço que se quer mover depressa.

Depois, é preciso transformar a formação e a cultura. A investigação mostra que apesar de muitos líderes seniores parecerem estar comprometidos, ainda não estão a puxar todas as alavancas que existem para assegurar o desenvolvimento das capacidades digitais. Além disso, também existe falta de foco e investimento para desenvolver competências digitais e formar talento. Os atuais programas de desenvolvimento têm sido ineficazes ou insuficientes e as estruturas organizacionais também não os suportam. Em vez de apostarem em novas áreas de desenvolvimento, as empresas continuam focadas nos pontos históricos mais fortes. Paradoxalmente, não estão a priorizar as áreas de mobile e vídeo, onde a lacuna de competências é maior. A cultura para uma inovação e risco razoável ainda tem um longo caminho pela frente. Não existem recursos suficientes, nem investimento para inovação em marketing, combinado com aversão ao risco. Tudo isto inibe o desenvolvimento de organizações de marketing móveis e modernas.

Ainda existe muito “espaço livre” para as empresas melhorarem a forma como se ligam aos clientes. A investigação mostra que mesmo as empresas que estão no topo do seu setor de atividade ainda têm grandes lacunas naquelas que são as melhores práticas digitais. O talento é que vai guiar a vantagem competitiva das empresas. Aquelas que investirem no desenvolvimento das competências digitais das equipas de marketing é que vão ter oportunidade de avançar e de ficar à frente dos seus pares. Alguns rebentos vão mostrar o caminho a seguir. Existem algumas empresas que estão a fazer mudanças mais rápido do que o resto e é a estas que devemos prestar atenção e aprender.

Como é que os empregadores podem motivar os colaboradores num cenário em que tudo muda tão facilmente?

A cultura da empresa deve ser propensa a motivar os colaboradores desde o início. Aqueles que encaixam no perfil certo, que são tecnicamente inteligentes e experientes nos seus campos de ação, que têm criatividade e que conseguem fazer as coisas acontecerem, precisam de estar num ambiente onde possam prosperar em escala. Isso significa que devem prestar atenção à cultura, trabalhar em equipas pequenas e dar-lhes muita liberdade e uma comunicação clara. Uma pequena parte disto acontece aproveitando os recursos dos colaboradores talentosos que há nas empresas. É preciso criar contexto e oportunidades para que eles desenvolvam as suas competências e que percebam que a empresa está a investir na progressão das suas carreiras.

O que devem fazer para desenvolver uma cultura empreendedora entre colaboradores?

É preciso que isto faça parte da missão e do ADN da empresa. Não podes pura e simplesmente construir uma cultura empreendedora, a não ser que isso faça parte da forma como a empresa pensa e age, de forma genuína, dos cargos de topo aos mais baixos na hierarquia. Dito isto, existem alguns princípios para a inovação que sumarizam alguns dos valores principais da cultura da Google, e que contribuem para o nosso sucesso e crescimento: a inovação chega de todo o lado, o foco deve estar no utilizador (e tudo o resto seguirá), apostar nos insights técnicos, testar e repetir, falhar rapidamente e ter uma missão que realmente interesse, entre outros.

David Solomons esteve em Portugal a propósito do evento SpeedForward, que foi organizado pelo Havas Media Group em parceria com a Google.