Comecemos por identificar os protagonistas. Poucos serão os que têm alguma afinidade com o mundo automóvel que não tenham já ouvido falar do Euro NCAP, o consórcio que há anos vem testando a segurança de boa parte dos modelos à venda no mercado europeu. Menos conhecido (pelo menos dos europeus) será o Global NCAP, organismo sediado em Londres e, também ele, tutelado pela Federação Internacional do Automóvel (FIA), criado com o objectivo de “apoiar o desenvolvimento de novos programas de crash tests para os consumidores nos mercados emergentes”.

Índia. Segundo o FMI, este país integra a lista das nações emergentes ou com economias em desenvolvimento. Com base nos indicadores económicos, até pode ser que assim seja. Mas, no que toca à segurança automóvel, ainda há por aquelas paragens um longo caminho a percorrer, e isso mesmo provou uma ronda de testes a automóveis vendidos naquele mercado, levados a cabo pelo Global NCAP. E em que foram vários os modelos criados especificamente para este país que mereceram a classificação zero na protecção dos ocupantes.

E se dúvidas houver quanto à bondade desta avaliação, nada como ver atentamente os vídeos dos testes de embate a 64 km/h realizados a cinco destes modelos: Hyundai Eon, Mahindra Sorpio, Renault Kwid, Suzuki Maruti Celerio e Suzuki Maruti Eeco. O Renault Kwid, que não é comercializado na Europa, mas que em menos de um ano vendeu mais de 40 mil unidades na Índia, tem este desempenho:

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O Hyundai Eon revela um comportamento ainda pior, pelo menos no que respeita à protecção dos mais novos. Ora veja:

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Todos eles merecedores da classificação mínima na protecção dos ocupantes, também não alcançaram muito melhor na protecção das crianças: duas estrelas para o Hyundai Eon, Mahindra Scorpio, Renault Kwid e Suzuki Maruti Eeco; uma estrela para o Suzuki Maruti Celerio, que se revelou o pior dos cinco modelos ensaiados e cujo vídeo pode ver abaixo.

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Claro que há razões para que tal tenha acontecido. Acima de qualquer outra, o facto de nenhum destes modelos contar com qualquer airbag. Tudo porque a legislação em vigor naquele mercado o permite.

Aliás, este é um ponto bastamente comentado quer pelas marcas visadas, quer pelo Global NCAP. As primeiras sublinham que os modelos em questão cumprem, ou até ultrapassam, as exigências em vigor nesta matéria na Índia. E que pouco sentido fará sujeitar modelos como estes a testes de embate que visam satisfazer padrões de segurança vigentes noutras partes do globo, como a Europa ou os EUA, bastante mais elevados do que os que vigoram na Índia. País onde é perfeitamente aceitável que um automóvel não ofereça aos seus ocupantes qualquer protecção, em caso de colisão, tal como acontece com o Mahindra Scorpio, por exemplo, que foi o segundo pior entre os veículos avaliados.

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Já o consórcio defende que nenhum construtor, em qualquer parte do mundo, deveria desenvolver novos modelos que estão tão claramente abaixo dos mínimos em termos de segurança. Afirma, ainda, que os fabricantes de automóveis deveriam não só assegurar que os seus novos modelos cumprem as normas mínimas de crash test das Nações Unidas, como apoiar o uso de airbags, independentemente de serem obrigatórios por lei, ou não.

O que estes testes, e respectivos resultados, parecem demonstrar sem margem para grandes dúvidas é que, na Índia, como em vários outros países do mundo, falta não só regulamentação nesta área, como uma maior percepção dos consumidores para a pouca segurança oferecida por determinados modelos.

Ao que parece, o Governo indiano até se prepara para obrigar os automóveis novos vendidos naquele país a possuírem, pelo menos, airbags frontais, e a serem sujeitos a testes de embate laterais. Mas só a partir do final de 2017. Até lá, o mais provável é que, independentemente das consequências, a generalidade dos fabricantes continue a desenvolver e a vender automóveis que pouco mais fazem do que seguir praticamente à risca as risíveis exigências em matéria de segurança que por lá vigoram. E que permitem isto:

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E se acha que estes resultados são maus, então saiba que o Tata Nano, anunciado desde 2009 como o veículo mais barato do mundo, sendo proposto no mercado indiano a partir de 200 mil rupias (2.600€), conseguiu a difícil proeza de receber zero pontos em todos os capítulos, tanto na protecção do condutor, como das crianças que vão correctamente sentadas no banco traseiro. A mesma Tata que é a proprietária da Jaguar e da Land Rover desde 2008.