No primeiro discurso que fez na Assembleia-Geral da ONU enquanto chefe de Estado português, Marcelo Rebelo de Sousa deixou uma mensagem implícita de apelo ao voto na corrida a secretário-geral das Nações Unidas. Marcelo citou Vergílio Ferreira para elogiar a língua portuguesa e lembrou Mahatma Gandhi e Nelson Mandela como exemplos a seguir pelo futuro líder da ONU. Não disse o nome do compatriota António Guterres, mas lembrou que estava em curso o processo de eleição do sucessor de Ban Ki-moon e enumerou as características que quer ver reconhecidas naquele que vier a ser eleito.
Estando em curso o processo de seleção do próximo secretário-geral das Nações Unidas queria exprimir os meus votos mais sinceros para que a pessoa que venha a ocupar este cargo tenha as qualidades humanas à altura”, começou por dizer o Presidente português.
Marcelo Rebelo de Sousa enumerou, depois, quais devem ser essas qualidades. Deve ser alguém que seja “congregador de espíritos e vontades”, alguém que faça “pontes”, e alguém que se “guie pelos exemplos e valores que Mahatma Gandhi e Nelson Mandela sempre aplicaram na vida”. “Indo para além do seu grupo ou círculo e assim unindo e representando todos e não uma parte; construindo pontes; sabendo ouvir; tendo a capacidade de liderança inatas que lhe permitam tomar decisões em que todos se revejam e sintam incluídos”, afirmou traçando o perfil da pessoa ideal para o cargo.
Com o candidato sentado na Assembleia a assistir, perto da delegação portuguesa, estava traçado o perfil de Guterres segundo Marcelo. Guterres chegou mesmo a ser um dos melhores amigos de Marcelo numa fase da sua vida. A encerrar o discurso, e imediatamente a seguir a ter apelado ao voto naquele perfil de candidato, o Presidente da República fez um elogio à língua portuguesa, “partilhada por 260 milhões de falantes para além dos seus descendentes e por nove Estados-membros da CPLP”, uma língua que, como diz Vergílio Ferreira, permite ver o mar. “Da minha língua vê-se o mar”, citou o chefe de Estado na 71ª Assembleia-Geral da ONU.
Marcelo em defesa de um Estado soberano da Palestina
No mesmo discurso, Marcelo defendeu uma solução para o conflito israelo-palestiniano que consagre um Estado da Palestina soberano e defendeu que a comunidade internacional tem o dever de eliminar o Daesh, sob mandato das Nações Unidas. Na sua intervenção na 71.ª sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, em Nova Iorque, Marcelo Rebelo de Sousa apelou ao diálogo entre Timor-Leste e Austrália sobre a definição da sua fronteira marítima e condenou as ameaças à segurança na Península Coreana.
Sobre o conflito israelo-palestiniano, o chefe de Estado português lamentou que a paz continue adiada. “Por isso mesmo, quero aqui reafirmar o pleno apoio de Portugal aos esforços internacionais para a retoma do processo negocial“, disse. “Esperamos uma solução sustentável para o conflito, com base nas resoluções das Nações Unidas, que consagre um Estado palestiniano soberano, independente e viável, vivendo lado a lado com o Estado de Israel, cujas legítimas aspirações de segurança têm de ser garantidas”, acrescentou.
A 12 de maio, durante uma audiência no Palácio de Belém, o grupo de embaixadores dos países árabes em Lisboa manifestou ao Presidente da República a esperança de que durante o seu mandato Portugal reconheça o Estado da Palestina como independente e soberano. No final de 2014, o Parlamento português aprovou uma recomendação ao Governo nesse sentido, que prevê que esse reconhecimento seja feito em articulação com a União Europeia.
No seu discurso desta noite nas Nações Unidas, Marcelo Rebelo de Sousa referiu-se em particular ao grupo extremista Estado Islâmico, também conhecido pelo acrónimo árabe Daesh, e ao terrorismo em geral, afirmando que “não pode ser tolerado”.
“A comunidade internacional, sob mandato das Nações Unidas, tem o direito legal e o dever moral de pôr fim a este hediondo flagelo, designadamente ao Daesh”, defendeu.
O Presidente da República recordou atentados ocorridos na Bélgica, na Somália ou no Paquistão e disse que o terrorismo “é contra todos os que subscrevem os princípios e os valores da Carta das Nações Unidas” e “contra a humanidade inteira”.
E numa volta ao mundo em quinze minutos de intervenção, o chefe de Estado garantiu o “compromisso entusiástico” que Portugal mantém com as Nações Unidas, defendendo um reforço da capacidade preventiva daquele organismo. “Adotemos, pois, uma cultura de prevenção também na manutenção da paz e segurança, promovendo o desenvolvimento sustentável, o respeito pelos direitos humanos, salvaguardando a dignidade humana, aliviando o sofrimento e combatendo a pobreza”, apelou.
O Presidente da República afirmou logo no início do seu discurso que a ONU “é cada vez mais insubstituível para todos os Estados-membros” e reiterou “o compromisso firme e permanente de Portugal para com as Nações Unidas, a Carta, os seus princípios e valores, bem como com o mais estrito respeito pelo direito internacional”.