Estava eu deitado numa marquesa, depois de uma operação ao menisco, a tentar ganhar o Nobel da Fisioterapia, quando recebo, por chamada e por mensagem, a notícia da entrega a Bob Dylan do Nobel da Literatura. Caiu-me no colo o Nobel do Aparvalhamento. Mas o Dylan? Já sabia que tem estado nas listas de convidados para a festa mas não pensei que lá chegasse. A seguir, como uma martelada na rótula, chegou o Nobel da Dúvida. Será que merece? Será que não merece? E como é que ficam o Roth, o Delillo, o Murakami, o Adonis? E o Lobo Antunes, que deve ter espreitado a notícia numa televisão do canto de um restaurante do Conde Redondo? Não mereciam receber assim o Nobel do Melão.

A própria fisioterapeuta, enquanto fazia movimentos com a minha perna direita, ficou espantada com a notícia e fez uma expressão de quem acha que o mundo merece o Nobel do Internamento. Fiquei calado e esforcei a perna, sem grande literatura. Guardei a crítica literária de marquesa para outro século, como dizia o outro — de quem, já agora, nunca ninguém se lembrou na Suécia. A verdade é que ligo pouco a este prémio. E aos Óscares. E, já agora, a história das apostas devia vencer o Nobel da Imbecilidade.

Mas, depois de sair da clínica, à procura de vencer o Nobel da Muleta, pensei que é pena o prémio não ter ido para um escritor de livros, numa altura em que as vendas andam como andam. Agora que estou em casa, diante do computador, com a perna meia dobrada, recordo que há uns anos – quando andava na casa dos 20 – defendi junto de amigos que Caetano Veloso e Chico Buarque são tão escritores como Milan Kundera. Porquê então este Nobel da Incerteza. É da idade? Do conservadorismo que chega com os anos? Deve ser.

Para além das dúvidas e do ambiente de intifada cultural das redes sociais, ouço agora Dylan no Youtube – e muito egoisticamente penso que foi boa a ideia, esta do prémio. Por causa das letras, das músicas, do percurso e da cara de sacana, Bob Dylan merece abrir os telejornais antes de morrer.

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