A proposta do Orçamento do Estado para 2017 foi aprovada em Conselho de Ministros na quinta-feira e chega à Assembleia da República esta sexta-feira. O documento foi apresentado esta noite pelo ministro das Finanças e já se podem elencar as medidas mais emblemáticas que vão mexer com a vida dos portugueses no próximo ano.

O debate na generalidade, onde é discutida e votada a primeira versão do Orçamento, acontece no início de novembro, seguindo-se depois um debate minucioso na especialidade, onde ainda há espaço para o PCP e o BE afinarem agulhas com o Governo. O que já se sabe?

Sobretaxa de IRS afinal não vai acabar em janeiro

A sobretaxa de IRS, que foi implementada pelo Governo anterior e começou a ser reduzida de forma faseada em 2016, afinal vai continuar a ser reduzida de forma gradual e por escalões de rendimento durante o ano de 2017. Ou seja, não acaba para todos a 1 de janeiro de 2017 como o Governo tinha prometido e como estipulou numa lei aprovada pela Assembleia da República em dezembro.

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A ideia agora é pôr quem ganha mais a continuar a pagar durante quase todo o ano (só deixa de pagar em dezembro) e quem ganha menos deixa de pagar mais cedo. O valor diminui para todos. Assim: quem está no segundo escalão de rendimentos (entre 7091 e 20.261 euros de rendimento coletável por ano) ainda vai pagar sobretaxa no primeiro trimestre, embora passe del 1% para 0,25%, deixando de pagar em abril; quem está no terceiro escalão (entre 20.261 até 40.522 euros de rendimento por ano), vai continuar a pagar 0,88% de sobretaxa, deixando apenas de pagar em junho; quem está no quarto escalão (entre 40.522 e 80.640 euros por ano) só deixa de pagar em outubro, sendo que até lá o seu rendimento será taxado em 2,25%. No último escalão, isto é, quem ganha mais de 80 mil euros por ano, vai continuar a pagar 3,21% de sobretaxa (atualmente para 3,5%) até novembro de 2017, sendo que só em dezembro deixará de ser taxado.

Aumento até 10 euros nas pensões só a partir de agosto

As pensões até 840 euros vão subir 0,7% em janeiro, aplicando-se a fórmula já prevista na lei, e as pensões mais baixas, até 630 euros (equivalente a 1,5 o valor do Indexante dos Apoios Sociais), só vão ter uma atualização real de 10 euros em agosto. Isto está longe de ser o pretendido pelos parceiros da esquerda, na medida em que o PCP queria um aumento de 10 euros para todas as pensões, com exceção do último escalão e logo a partir de janeiro, algo que o Bloco veio também a reclamar.

Também o aumento das pensões será, por isso, faseado. Em janeiro aplica-se a fórmula prevista na lei, que tem em conta a inflação de novembro (sem habitação) e o crescimento da economia, abrangendo todos os pensionistas com reformas até aos dois IAS (isto é, até cerca de 800 euros, na medida em que indexante dos apoios sociais que também será atualizado no próximo ano).

Para as pensões mais baixas (até 1,5 IAS) é aplicado um aumento extraordinário, de 10 euros, a partir de agosto, mas a título excecional. Em 2018 e nos anos seguintes, as pensões serão atualizadas apenas nos termos da lei, isto é, em função do valor da inflação.

Novo imposto sobre o património começa nos 600 mil euros para todos

O novo imposto sobre o imobiliário vai incidir em património a partir de 600 mil euros para contribuintes particulares e empresas. A única exceção são os imóveis afetos à atividade industrial e ao turismo. Para perfazer os 600 mil euros contam todos os imóveis que estejam em nome do mesmo contribuinte (individual ou coletivo) e não cada imóvel em si mesmo. A taxa aplicada será de 0,3% e é aplicada sobre os valores que ultrapassem o patamar de 600 mil euros de valor patrimonial.

Será uma espécie de sobretaxa sobre o IMI e deve gerar uma receita de 170 milhões de euros, de acordo com o que foi possível apurar pelo Observador, mas ao contrário do IMI, que reverte a favor das autarquias, este será um proveito do Estado. António Costa anunciou esta manhã no Parlamento que a verba vai para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, um instrumento que tem como finalidade assegurar uma almofada financeira para o pagamento de pensões, como, aliás, está previsto na proposta de lei.

Apesar do limite a partir do qual se aplica a nova taxa ser igual para todos os contribuintes, a proposta prevê que no caso de casais que optem por declaração conjunta, o teto a partir do qual se aplica o imposto é multiplicado por dois, chegando aos 1,2 milhões de euros.

Metade do subsídio de Natal pago em duodécimos

O Governo queria acabar com o pagamento em duodécimos do subsídio de Natal a pensionistas e funcionários públicos, algo que faria mais sentido com o fim da sobretaxa de IRS (que não acaba ainda este ano), já que foi para minorar o seu impacto que os duodécimos foram criados.

No entanto, depois do volte-face na sobretaxa de IRS e das preocupações de alguns partidos e sindicatos, o Governo foi a meio caminho. Assim, os funcionários públicos e os pensionistas vão receber o subsídio de férias na íntegra (como já recebiam). Mas em vez de receberem o subsídio de Natal todo em duodécimos vão passar a receber metade do valor em novembro e a outra metade espalhada pelos salários do ano inteiro.

Bebidas com açúcar vão ser taxadas. Imposto chega aos 16 cêntimos por litro

A “fat tax” vai mesmo avançar, mas só para os refrigerantes e não para todos os alimentos nocivos para a saúde. A partir do próximo ano, os refrigerantes e as bebidas com uma taxa de álcool entre 0,5% e 1,2% vol. (conhecidas como bebidas sem álcool) com açúcar adicionado vão ficar mais caros. O aumento máximo não deverá ultrapassar os 16 cêntimos por litro e o mínimo rondará os oito cêntimos por litro, consoante a quantidade de açúcar presente na bebida.

O que significa que, por exemplo, uma lata de Coca-Cola (de 33 cl) — que tem 106 gramas de açúcar por litro — terá um acréscimo de cinco cêntimos por via deste novo imposto. Cinco cêntimos esses que vão acrescer ao preço da bebida antes do IVA, ou seja, na prática, a subida do preço final de venda ao público desta bebida será superior a cinco cêntimos.

Bebidas alcoólicas mais taxadas

Não são só as bebidas não alcoólicas que vão ser taxadas. Também as sidras e o hidromel (alcoólicas) vão passar a ser tributados em sede de Imposto sobre o Álcool e Bebidas Alcoólicas (IABA), sendo que o imposto varia entre 8,22 euros e os 16,46 euros, consoante o teor de açúcar. Isto quer dizer que ficam sujeitos a imposto as bebidas não alcoólicas destinadas ao consumo adicionadas de açúcar ou de outros edulcorantes.

A cerveja, gin ou vodka também vão ficar mais caras, num agravamento do imposto em linha com o que aconteceu em 2016. Agora o agravamento do imposto sobre o álcool é de 3%. O vinho fica de fora, à semelhança do que aconteceu este ano.

Subsídio de refeição para a função pública sobe 25 cêntimos por dia

A partir de janeiro, os funcionários públicos vão ter um aumento de 25 cêntimos por dia no subsídio de refeição, o que significa que ao fim do mês ganham mais 5 euros (contabilizando 20 dias úteis por mês).

Será a primeira atualização do valor em sete anos, já que o subsídio de refeição se mantinha nos 4,27 euros por dia desde 2009. A CGTP e a UGT há muito que queriam uma atualização, apontando sempre para valores acima dos seis euros.

Apoio extraordinário a desempregados de longa duração continuará em 2017

O Governo decidiu prolongar por mais um ano o apoio extraordinário aos desempregados de longa duração, uma prestação da qual podem beneficiar os trabalhadores que já esgotaram o subsídio de desemprego e o subsídio social desemprego. Esta prestação pode atingir um máximo de 335 euros.

A medida foi negociada no Orçamento do Estado para 2016 a pedido do PCP, acabando mesmo por ser aprovada, entrando em vigor a 30 de março, e voltará a integrar o Orçamento, sendo assim estendida por mais um ano.

Manuais escolares gratuitos para todos os alunos do 1.º ciclo

No próximo ano letivo, todos os alunos do 1.º ciclo deverão ter acesso a manuais escolares gratuitos. O artigo do Orçamento relativo a este tema diz que caberá ao responsável governamental pela área da Educação a definição das condições em que serão disponibilizados os livros, assim como as regras para o seu uso e reutilização, “podendo os mesmos ser reutilizados na mesma escola ou em qualquer outra escola ou agrupamento que os tenha adotado”.

Era um dos cavalos de batalha do PCP, mas que o próprio Governo também sempre assumiu como sendo uma prioridade, e vai mesmo avançar.

Tarifa social da água com atribuição automática para chegar a mais pessoas, mas não avança já

A proposta para alargar o número de beneficiários da tarifa social da água, através da atribuição automática, está a ser discutida no quadro do Orçamento. Assim, depois da luz e do gás, chega a vez de alargar significativamente os beneficiários de tarifas sociais nas faturas da água, uma medida muito defendida pelo BE, que já tinha conseguido o alargamento das tarifas sociais na eletricidade.

O novo Orçamento vai agora definir a constituição de um regime para as tarifas sociais da água, de forma a harmonizar aquilo que até agora é tratado individualmente, e de forma diferenciada, pelas autarquias. Ou seja, o Governo pede uma autorização que lhe permite legislar a matéria sem ter de passar pela Assembleia da República, mas não é obrigado a fazê-lo. Para já, manifesta a intenção.