A receita do adicional sobre o Imposto Municipal de Imóveis (IMI) vai ser transferida para o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social (FEFSS). Serão mais 160 milhões de euros por ano, se as previsões do Governo baterem certo, o que representa um reforço substancial do financiamento a este fundo, em relação aos últimos anos.

O Executivo assume que esta transferência “corresponde ao objetivo do programa do governo de alargar a base de
financiamento da Segurança Social, ao mesmo tempo que se introduz um imposto que recai sobre os detentores de maiores patrimónios imobiliários, reforçando a progressividade global do sistema.”

Mas para que serve o FEFSS e onde está aplicado o dinheiro que se encontra à sua guarda?

As últimas contas do Fundo de Estabilização da Segurança Social — de 2015 –, revelam que a carteira de ativos do fundo estava valorizada em 14.100 milhões de euros, dos quais 66,9% — o equivalente 9.437 milhões de euros — estava aplicado em Obrigações do Tesouro. Considerando a dívida emitida pelo Estado português (incluindo de curto prazo e as garantias), a exposição total a títulos públicos chegava aos 78,1%. Os números são do Tribunal de Contas.

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fundo das SS

O resto estava distribuído por dívida soberana estrangeira, ações e dívida estrangeiras, imobiliário, liquidez (depósitos) e uma reserva estratégica que quase desapareceu com a insolvência da Finpro, uma sociedade de investimento em infraestruturas, e o colapso das ações da antiga PT (atual Pharol).

O Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social foi criado em 1989 com a finalidade de contribuir para a estabilização financeira do sistema, através de uma almofada de segurança que estivesse em condições de ser ativada para pagar pensões, em caso de rutura dos recursos correntes na Segurança Social. O que nunca aconteceu, até agora. O valor registado no final de 2015 dava para pagar mais de um ano de pensões do regime geral da Segurança Social, na medida em que representou 123,3% dos gastos.

Mas só em 1997, é que este instrumento começou a receber dotações significativas que tiveram origem sobretudo em duas fontes: os saldos positivos anuais da execução da Segurança Social e o produto da venda de património imobiliário. A partir de 1999, foi criada uma sociedade para gerir a capitalização dos recursos financeiros do fundo que passaram a ser aplicados em ativos financeiros, dentro de limites por tipo de ativo definidos por lei.

Desde essa altura, que o investimento prioritário do FEFSS é a dívida pública portuguesa já que a lei previa que pelo menos 50% dos recursos financeiros do fundo fossem utilizados para comprar títulos do tesouro. Esse limite transformou o FEFSS no principal investidor em divida pública, um papel que se acentuou com a crise do euro e as dificuldades de financiamento do Estado português sentidas a partir de 2010.

Vítor Gaspar deu ordem para acelerar compra de dívida

O fundo terá sido usado para assegurar o sucesso de algumas emissões de dívida ainda durante os governos de Sócrates e antes do resgate a Portugal, mas foi já em 2013 com a coligação PSD/CDS que foi tomada a decisão de aumentar a exposição do fundo à dívida portuguesa. Foi aliás a última decisão tomada pelo ministro Vítor Gaspar antes de se demitir a 1 de julho. A portaria que define um limite máximo de 90% para a concentração de recursos na dívida pública foi assinada no mesmo dia.

Apesar de se comportar como um investidor e financiar as necessidades de capital do Estado, a dívida detida pelo Fundo acaba por ser abatida à dívida pública que conta para os rácios de Bruxelas, o que é uma vantagem para quem procura reduzir o endividamento público. Mas a concentração em dívida pública “afeta substancialmente a sua comparabilidade, não apenas porque configura a sujeição das regras de gestão a opções de natureza política, mas porque altera substancialmente as proporções das tipologias de ativos na carteira, afetando o binómio rendibilidade risco”.

Uma tradução possível para esta conclusão do Tribunal de Contas é que uma tão elevada exposição a um só emitente vai contra as regras de gestão de risco usadas nos fundos de pensões que aconselham a diversificar os investimentos, além de que deixa e rendibilidade do fundo refém das oscilações de mercado desse título. No ano passado, a taxa de rendibilidade foi de 3,56%.

Com uma exposição tão elevada à dívida portuguesa, a margem de manobra para os gestores do fundo é muito reduzida. Nos últimos anos, a carteira tem registado menos-valias e mais-valias potenciais significativas em função da instabilidade das cotações da dívida portuguesa.

Estes movimentos e o seu efeito “não resulta necessariamente de um papel determinante da entidade gestora, mas porque em determinadas circunstâncias e ativos não se traduzirão em valias efetivas, contribuindo apenas para alimentar uma apreciação de ganhos e perdas de valor que não tem sustentação na realidade”, avisa o Tribunal de Contas.

Já este ano, o Governo socialista manifestou a intenção de usar os recursos financeiros do FEFSS para financiar o Fundo Nacional de Reabilitação do Edificado, estando previsto na proposta de Orçamento do Estado um investimento de 50 milhões de euros neste novo instrumento promovido pelo Estado.

A outra alteração de fundo que o atual Executivo vai introduzir tem como finalidade reforçar as dotações do fundo que caíram de forma substancial com a crise financeira e orçamental, sobretudo por causa de saldos negativos nas contas da Segurança Social. Desde 2009 que os montantes transferidos passaram a ser quase “irrelevantes”, nas palavras do Tribunal de Contas.

“Este período (…) coincide com a fase de maior deterioração do equilíbrio financeiro do sistema previdencial, pressionado pelos efeitos da crise crise económica e social, que, por um lado, condicionaram a receita de contribuições e, por outro, aumentaram a despesa com prestações sociais.”

Os valores recuperaram em 2014 e em 2015, ano em que foram transferidas cerca de 100 milhões de euros do saldo do sistema previsional. No entanto, podem voltar a cair. Daí que o ministro do Trabalho e Segurança Social, José António Vieira da Silva, tenha defendido que a transferência da receita do novo imposto sobre imóveis permite assegurar a sustentabilidade da Segurança Social.