Os deputados da pequena região francófona da Valónia, na Bélgica, recusaram um acordo comercial entre a União Europeia e o Canadá e estão a criar uma crise embaraçosa e, potencialmente, perigosa para a Europa. Além de colocar, também, um enorme ponto de interrogação sobre como irão decorrer as negociações entre o Reino Unido e a União Europeia, com vista à saída do país da UE.

Foi na sexta-feira, a poucos quilómetros de Bruxelas, o coração do poder na União Europeia, que o parlamento regional colocou em risco um acordo importante que há vários anos estava em preparação. O acordo chama-se Comprehensive Economic and Trade Agreement e é conhecido pela sigla CETA — o acordo tem de ser ratificado pela UE e pelo Canadá até ao final do mês, mas o veto no Parlamento regional belga ameaça deitar por terra um acordo de partilha de tarifas que demorou sete anos a ser escrito.

O acordo iria, basicamente, eliminar uma série de tarifas entre o Canadá a União Europeia. Mas os deputados do pequeno parlamento regional mostraram-se apreensivos em relação às consequências para a agricultura e para os serviços públicos. Para que o acordo possa avançar, tem de ser ratificado por todos os 28 estados-membros. Mas para que o governo federal belga possa passar o acordo, todos os seus cinco parlamentos regionais têm de dar luz verde. O parlamento da Valónia, liderado pelos socialistas, acredita que o CETA daria demasiado poder às empresas multinacionais.

O problema é que está mais em jogo do que apenas um acordo de comércio. “O CETA não é um mero acordo comercial com o Canadá. Tem um cariz de modelo para as relações comerciais da UE no futuro”, afirma Christoph Leitl, presidente da Global Chamber Platform, uma associação de câmaras comerciais a nível mundial, citado pelo jornal Politico. “Isto é uma loucura. Se admitirmos que um parlamento regional bloqueie um acordo comercial que beneficia toda a UE, onde é que vamos parar?”, acrescenta o responsável.

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O acordo deveria ter sido concluído e assinado até agosto de 2014, esse foi o primeiro prazo, razão por que o governo canadiano tem mostrado impaciência em relação a este processo. Na imprensa britânica, como o The Guardian, já se especula sobre a dificuldade que poderá existir quando for hora de negociar acordos comerciais entre o Reino Unido e a União Europeia, sobretudo no âmbito de um processo de rutura como será o Brexit.

“Se descobrirmos numa semana ou duas que a Europa não é capaz de assinar um acorde de comércio progressivo com um país como o Canadá, então como é que a Europa pensa que vai conseguir fazer negócios nos próximos anos?”, perguntou o primeiro-ministro, Justin Trudeau. “Nesta situação pós-referendo do Brexit, em que existem muitas questões em torno da utilidade da Europa, se a Europa não conseguir assinar este acordo, isso irá enviar uma mensagem muito clara: uma mensagem de que a Europa está a escolher um caminho que não é produtivo para ninguém, o que é uma pena.

Canadian Prime Minister Justin Trudeau looks on  during a session of the World Economic Forum (WEF) annual meeting in Davos, on January 20, 2016. A string of jihadist attacks and rising risks to the global economy overshadow the opening of the annual gathering of the world's rich and powerful in a snow-blanketed Swiss ski resort. Even as heads of state, billionaires and Hollywood megastar Leonardo DiCaprio were arriving, the International Monetary Fund (IMF) sounded the alarm on January 19, 2016 about perils in the major emerging market economies and lowered its outlook for global economic growth this year. / AFP / FABRICE COFFRINI        (Photo credit should read FABRICE COFFRINI/AFP/Getty Images)

“Se a Europa não conseguir assinar este acordo, isso irá enviar uma mensagem muito clara”, avisa Justin Trudeau. (Foto: FABRICE COFFRINI/AFP/Getty Images)

Quem também já reagiu ao impasse foi Donald Tusk, presidente do Conselho Europeu, que considerou que este debate está a ser prejudicado por muitas “emoções e confusão”. Tal como nas negociações em torno do acordo com os EUA (o TTIP), Tusk acredita que estas matérias estão a ser “combustível para eurocéticos e radicais”.