Em 1976, uma família inglesa baptiza o seu filho com os nomes de todos os jogadores do Manchester United daquele ano. Graham Alex Jimmy Stewart Gerry Brian Martin Steve Sammy Stuart Lou Gordon David Tommy Matt Cross destaca-se nos juniores do Walsall, ao ponto de ter marcado todos os golos na vitória por 8-0 sobre o TP Rileys. Aos 15 anos, o jovem recusa assinar pelo Manchester United, já na era Alex Ferguson, e vai parar ao Leeds, onde não dá nas vistas. Perde-se um futebolista, ganha-se uma história.

Quarenta anos depois, em 2016, a ideia sui generis de um Patrício João Coates Rúben Marvin William Gelson Adrien Bryan Bruno Dost até nem é descabida por aí além. Si señor, o Sporting perde em casa pela segunda vez seguida (outro 2-1) e sai da Liga dos Campeões a uma jornada do fim. Inglório, claro. A culpa é do merengue. Doce para uns, amargos para outros. Mais uma vez. Se o Real consegue virar o jogo nos últimos três minutos em Madrid, com os golos de Ronaldo e Morata, em Alvalade é o suplente Benzema quem fixa o 2-1 quase ao cair do pano, aos 87 minutos. A teoria do quase é, aliás, a mais a usual no trajecto europeu do Sporting 2016-17: quase ganha em Madrid, quase empata com o Borussia em Alvalade, quase surpreende em Dortmund e quase empata o Real em Alvalade.

O Sporting entra com força e determinação, sem incomodar o guarda-redes Keylor Navas. O encosto demora tão-só dez minutos. Quando se endireita o invencível Real Madrid (zero derrotas em 2016-17, entre 13 vitórias e cinco empates), a bola passa a jogar-se no meio-campo contrário com movimentações peculiares entre Bale e Ronaldo. Em duas delas, Coates e Rúben afastam para canto. À terceira, Ronaldo foge pela direita, dança à frente de Rúben e sofre falta indiscutível. No diálogo com o fiscal-de-linha (sim, escrevo fiscal-de-linha em vez de assistente), o capitão da nossa selecção deixa escapar um “isto não é para cartão?” Modric marca o livre para o meio, Ronaldo dá-lhe mal na bola e Varane atira a contar, na cara de Patrício. Um francês, voilà. E o número 5, como Zidane o era nos tempos do Real Madrid.

A reacção sportinguista é imediata e Ramos trava um remate de Bruno César com a cabeça (33′). É ainda do brasileiro um remate ao lado, na marcação de um livre directo (40′), a castigar falta (e amarelo) de Marcelo sobre Gelson. Chega o intervalo e o Real em vantagem pela primeira vez nas cinco visitas a Lisboa (3-0 do Benfica em 1965 + 2-1 do Sporting em 1994 + 2-0 do Sporting em 2000 + 1-0 do Atlético Madrid em 2014).

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Na segunda parte, o campeão europeu raramente sai do seu meio-campo até ao vermelho directo de Joao Pereira, por agressão a Kovacic (64′). Só a partir daí é que o Real Madrid dá largas à sua imaginação no ataque e vê a baliza de Patrício uma ou outra vez. Isso também significa mais espaço e o Sporting aproveita-o sem olhar para trás. Adrien é sempre o maestro do passe longo perfeito para a corrida de Gelson. Os dois entendem-se às mil maravilhas e perturbam Marcelo. Que se lesiona e cede o lugar a Coentrão, o único português assobiado em Alvalade. É ele o homem da grande penalidade aos 80 minutos. O lateral levanta a mão em protesto por uma falta de Campbell e faz penálti indiscutível. Na marcação, Adrien engana Keylor. Um francês, mais um.

O empate não chega, ainda é insuficiente. O Sporting precisa de ganhar para evitar o adeus prematuro. Mesmo com dez jogadores em campo, há ali vontade e determinação. O Real defende-se com relativa tranquilidade, excepção feita a um cruzamento de Gelson para o cabeceamento torto de Campbell (85′). No quadradinho seguinte, um cruzamento de Ramos para a molhada é devidamente aproveitado por Benzema para entrar de rompante, à ponta-de-lança, e fixar o 2-1. Um francês, outro. É o terceiro da noite. É o golpe da misericórdia. A despedida da Liga dos Campeões é um facto e agora só resta empatar em Varsóvia daqui a 15 dias para continuar a jogar na Europa. Caso contrário, lá se vai o nome sui generis.

Estádio José Alvalade, em Lisboa
Árbitro: William Collum (Escócia)
SPORTING: Patrício; João Pereira, Coates, Rúben e Marvin; William; Gelson, Adrien e Bryan (Schelotto, 67′); Bruno César (Campbell, 62′) e Bas Dost (André, 77′)
Treinador: Jorge Jesus (português)
REAL MADRID: Keylor; Carvajal, Ramos, Varane e Marcelo (Coentrão, 71′); Kovacic, Modric e Isco (Benzema, 67′); Lucas, Ronaldo e Bale (Asensio, 59′)
Treinador: Zinedine Zidane (francês)
Marcadores: 0-1, Varane (29′); 1-1, Adrien (80′, gp); 2-1 Benzema (87′)
Indisciplina: expulsão do sportinguista João Pereira (64′, vermelho directo)