Donald Trump — no que chama de “old-fashion type” (à moda antiga) — gosta de ser ele próprio a assinar os cheques nas suas empresas. A partir de 20 de janeiro, não há nada que o impeça de continuar a fazê-lo como Presidente dos Estados Unidos, como destaca em entrevista concedida esta terça-feira ao New York Times. O Presidente-eleito nega conflito de interesses, escudando-se na lei. Têm, no entanto, sido levantadas várias questões éticas sobre várias situações onde Trump Presidente pode entrar em conflito de interesses com Trump empresário. Para já, o Presidente eleito desvaloriza o assunto e até admite que a marca Trump “é certamente mais hotter hoje do que era antes“.

O conflito espreita a cada esquina, uma vez que o Presidente eleito tem interesses em mais de 500 empresas, espalhadas por 18 países. De acordo com a revista Forbes, Trump tem um património avaliado em 3,7 mil milhões de dólares, que inclui unidades hoteleiras, várias empresas imobiliárias e participações em sociedades tão distintas que vão desde o Facebook a um oleoduto.

Trump possui campos de Golfe na Flórida e hotéis em Nova Iorque, Las Vegas, Chicago, Waikiki e ainda o Trump International Hotel, em Washington. Neste último caso, o conflito de interesses parece evidente já que o empresário chegou a acordo com o Governo dos Estados Unidos, o proprietário do edifício, para abrir o seu hotel. Quando for presidente vai supervisionar os termos do contrato que o Governo que tutela tem… consigo próprio.

Na entrevista ao New York Times, Trump falou precisamente no hotel que fica próximo da Casa Branca, mas ignorou a questão principal, que é ser contratado e contratante:

Vão dizer que há um conflito [de interesses] porque acabámos de abrir um belo hotel na Pennsylvania Avenue. Se cada vez que alguém fica nesse hotel, fica porque eu sou presidente, então podem dizer que há conflito de interesses”, disse Trump ao New York Times.

No entanto, Trump diz que este conflito não tem relevância, uma vez que não vai “ter nada a ver com o hotel”. Admite ainda que “a ocupação do hotel” será agora maior do que antes, porque é Presidente e a marca Trump tornou-se “mais valiosa do que antes”.

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Ainda a nível de potenciais conflitos de interesses, o Deutsche Bank é o principal credor das empresas de Donald Trump e, desde 1998, já recebeu — de acordo com o Wall Street Journal — cerca de 2,3 mil milhões em empréstimos do banco alemão. O problema aqui é que o Deustsche Bank está neste momento a negociar o valor da multa que lhe será aplicada pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos pela responsabilidade que teve na crise imobiliária.

Outro dos credores internacionais de Trump é o Banco da China. Esta instituição tem a particularidade de ter recebido 900 milhões de euros do governo chinês para emprestar a um consórcio que incluía uma empresa de Trump. Na verdade, foi uma sociedade de Trump que absorveu 30% do valor emprestado pelo governo chinês. O mesmo acontece em geografias menos conhecidas dos americanos como Azerbeijão, onde Trump é sócio de Anar Mammadov, filho do ministro dos Transportes, num projeto imobiliário.

Donald Trump tem ainda participações na sociedade detentora de um projeto para a construção de um oleoduto no Dakota do Norte, que prometeu desbloquear como Presidente. O magnata é ainda detentor de participações no Facebook e no Bank of America, instituição que poderia beneficiar de um novo regime de regulação bancária proposto por Trump. A lista das empresas de Trump é extensa, como demonstra um documento divulgado pelo El Mundo.

De acordo com o Ethics in Government Act, de 1978 — lei que estabelece a conduta ética do Governo e foi aprovada após o caso do Watergate — os membros do Congresso não podem legislar sobre temas que entrem em conflito de interesse com os seus negócios. No entanto, o Presidente não está sujeito a esta lei, sob o pretexto que o timoneiro do país não pode ser condicionado quando quiser impor ação executiva.

Trump sempre gostou que a última palavra nas suas empresas fosse sua. Mas agora garante que, progressivamente, irá entregar essas competências a “Eric Trump, Don Trump e Ivanka Trump”, os seus filhos, e a alguns dos seus administradores. Destaca, no entanto, que está a fazê-lo porque quer: “Na teoria, podia continuar a gerir o meu negócio e o país”. Lembra ainda, na mesma entrevista ao New York Times, que esta é uma situação nova: “Se olhar para os outros presidentes eles não tinham este tipo de ativos, este nível de riqueza”. Trump disse ainda que, inicialmente, pensava que ia ter de passar as suas empresas a outra pessoa, mas depois apercebeu-se de que a lei não o impunha.