O problema dos fluxos migratórios “está a arrastar-se” e a aumentar a “tensão Norte-Sul”, reconheceu um responsável do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (ACNUR), falando em “falta de liderança”.

À margem do Fórum Lisboa do Centro Norte-Sul, sobre o tema “Migração e Direitos Humanos”, Amin Awad, um dos oradores e diretor do Gabinete para o Médio Oriente e Norte de África do ACNUR, considera que o problema “está a arrastar-se” e que as recomendações que saem dos muitos encontros e conferências sobre o assunto têm de ser “concretizadas”.

A situação exige liderança nacional e internacional, daí que a expetativa em relação ao próximo secretário-geral das Nações Unidas, o português António Guterres, seja “muito alta”, admite. “Terá pano para mangas, desejo-lhe sorte”, comentou o ex-colega de trabalho de Guterres no ACNUR.

A “tensão Norte-Sul” tem, “para benefício de todos”, de se transformar num “entendimento Norte-Sul”, sublinha Amin Awad. Num mundo interdependente, “o Norte precisa do Sul e o Sul precisa do Norte”, observa.

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“O mundo, gostemos ou não, está a ficar cada vez mais misturado. (…) Não há volta a dar. Não vale a pena construir barreiras, muros e vedações, é preciso adotar políticas”, apela.

Também presente na 22.ª edição do Fórum Lisboa do Centro Norte-Sul, que decorreu quinta-feira e esta sexta-feira, no Centro Ismaili de Lisboa, a eurodeputada portuguesa Ana Gomes concordou que falta vontade política para resolver o problema dos fluxos migratórios.

“Estamos numa situação muito complicada, que ainda se vai agravar nos próximos tempos”, antecipa, referindo o crescimento das “retóricas xenófobas dos movimentos de extrema-direita e populistas”.

A movimentação de pessoas não vai parar, dada a situação nos seus países de origem, em parte resultado da “ineficácia da política externa europeia”, por “ação e omissão”, reconhece.

E, se países como Turquia, Líbano e Jordânia, que lideram a tabela do acolhimento de refugiados, estão a ser apoiados financeiramente pela União Europeia, “isso não chega, porque obviamente a questão é resolver o problema de fundo”, frisa.

“Não se trata apenas só de pagar para os ter longe, fora de portas, como, no fundo, tem sido, de alguma maneira, a política da União Europeia, trata-se de ir às causas” que levam as pessoas a deixarem os seus países”, contrapõe a eurodeputada.

Muito crítica da situação na Turquia, Ana Gomes acusa o Presidente Recep Tayyip Erdogan de exercer “chantagem” sobre a Europa e lamenta que esta “se deixe chantagear”.

Sobre o “acordo” entre a União Europeia e a Turquia, que, desde março, recambia para este país todos os migrantes que entram ilegalmente na Grécia, Ana Gomes é perentória: “Não há acordo nenhum. Há um ‘deal’, um negócio. Não está escrito, é um ‘statement’ apenas, que foi feito pela senhora Merkel [chanceler alemã] com o presidente Erdogan.”

Esse “acordo”, insiste, “é ilegal, à luz da Convenção das Nações Unidas para os Refugiados”.