A, B, C, D, E, F, Z, H, I, K, L, M, N, O, P, Q, R, S, T, V e X. Acaba em xis? E o zê entre o éfe e o agá? No século VII a.C., os romanos instituem o alfabeto latino. Daí para cá, só um senhor chamado Cláudio (com Imperador a servir de prefixo) inclui mais três letras. Uma cai em desuso, outra só nos serve (a nós, portugueses) para o WC e sobra o inútil y (se assim não fosse, seria inútyl). Pelo meio, acrescenta-se o J.

Seja como for, o alfabeto começa sempre por abc. É um clássico, o abc. Serve para um monte de lugares comuns. O abc do amor, o abc da bimby, o abc da cataquese. Sem querer, lá está: amor, bimby e cataquese. Voilà, outro abc. Isto é assim mesmo, está tão enraizado que não nos sai da abceça. Desculpem, cabeça. Bom, e o abc do futebol? O Porto explica-o tintim por tintim em apenas 45 minutos, com golos de André Silva, Brahimi e Corona na primeira parte ao então invencível Leicester (13 pontos em cinco jogos na Liga dos Campeões, tantos como em 14 jogos na Premier League).

Sem dez titulares em relação ao último jogo do campeonato inglês (Wes Morgan é o único sobrevivente), o italiano Ranieri monta uma equipa sem pés nem cabeça. O Leicester é tão mau, tão mau, tão mau que nem sequer chega aos calcanhares da expressão pobreza franciscana. É pior ainda. Muito pior. Um remate à baliza (Ulloa acerta na barra aos 88′) e o escasso 34% posse de bola é um cartão de visita sem ponta por onde se pegue.

O Porto aproveita a apatia apática do Leicester para assinar uma exibição cinco estrelas, cinco golos, cinco tudo. Uma maravilha do princípio ao fim, com momentos divinais. Como o 2-0 de Corona ou o 3-0 de Brahimi. Antes, o 1-0 de André Silva. Isto é só a primeira parte. Do Leicester, nem uma palavra ou um statment. Zero em tudo. A equipa de Nuno desbrava caminho como nunca. Aos 6 minutos, Brahimi ganha o canto, marcado por Corona para a cabeça de André Silva. O abc começa aí.

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Aos 26′, um lançamento lateral vira golo num abrir e fechar de olhos. Do cruzamento de Alex Telles nasce o pontapé de primeira de Corona, com o pé esquerdo. Pobre Hamer, o suplente de Schmeichel, lesionado. A um minuto do intervalo, Corona (sempre ele) desmarca Maxi e o calcanhar de Brahimi faz o resto, com categoria. Sim senhor, um argelino de azul e branco marca de calcanhar a uma equipa de vermelho na Liga dos Campeões com um centro da direita. Três-ó ao intervalo é coisa nunca mais vista no Dragão desde Setembro 2014, com o BATE Borisov. Nessa noite, o jogo acaba 6-0.

E este? O Leicester entra igualmente descomprometido para a segunda parte e volta a ser fortemente subjugado pelo adversário. Daí que a bola teime em circular pelos pés dos portistas, com elegância e velocidade do meio-campo para a frente. Aos 64′, penálti indiscutível sobre André Silva. Chamado a bater o castigo máximo, o número 10 engana Hamer e redime-se do erro de sábado, com o Braga, quando Marafona adivinha-lhe o intento. O cinco-zero está aí à porta, sem a mínima dúvida, e chega naturalmente por Diogo Jota, numa jogada simples e exemplar. Na história da UEFA, é o terceiro 5-0 de portugueses a ingleses, na sequência do Sporting-United 1964 e Benfica-Everton 2009. O Leicester nem se mexe, ‘tadito. A equipa, então invencível na Europa e com apenas um golo sofrido, apanha uma tareia memorável, jamais vista no seu currículo (a mais pesada havia sido um 2-0 do Atlético, em Madrid). O abc do fcp junta-se ao Benfica como digno representante de Portugal no sorteio dos oitavos-de-final da Liga dos Campeões, marcado para a próxima terça-feira, e arrisca-se a apanhar Arsenal, Nápoles, Barcelona, Atlético Madrid, Monaco, Dortmund mais Juventus.

Estádio do Dragão, no Porto
Árbitro: Felix Zwayer (Alemanha)
PORTO: Casillas; Maxi, Felipe, Marcano, Alex Telles; Danilo (Herrera, 76′), Corona (Rúben Neves, 76′), Oliver, Brahimi; André Silva (Rui Pedro, 78′) e Diogo Jota
Treinador: Nuno Espírito Santo (português)
LEICESTER: Hamer; Hernandez, Wasilewski, Morgan, Chilwell; Gray, Mendy, Drinkwater (Barnes, 77′), Schlupp (Albrighton, 46′); Musa (Ulloa, 46′), Okazaki
Treinador: Claudio Ranieri (italiano)
Marcadores: 1-0, André Silva (6′); 2-0, Corona (26′); 3-0, Brahimi (44′); 4-0, André Silva (64′, gp); 5-0, Diogo Jota (77’)