Legado do político republicano José Relvas, a Casa dos Patudos, em Alpiarça, foi resgatada, graças aos fundos comunitários, do declínio em que havia entrado na década de 1990, sendo hoje referência do património nacional.

Com o primeiro projeto de reabilitação apresentado em 1998, no mandato do socialista Joaquim Rosa do Céu, a casa que José Relvas (o homem que proclamou a República da varanda da Câmara Municipal de Lisboa em 5 de outubro de 1910) mandou construir no início do século XX, com desenho do arquiteto Raúl Lino, viu travada a degradação que estava a ser provocada pelas infiltrações de água a partir da cobertura.

Começou aí um lento processo de reabilitação concluído em 2013 e que deu à Casa dos Patudos não só a reabilitação do edifício, mas, também, um novo percurso expositivo com a abertura de espaços até aí fechados ao público e o restauro de muitas obras, mostrando a coleção de arte reunida por José Relvas ao longo da sua vida.

“Abriram-se novos circuitos museológicos, proporcionando uma nova visão pelo espaço privado da casa e valorizando a coleção de arte com mais de 8.000 peças”, diz à Lusa o conservador do museu, Nuno Prates, que realça as distinções que têm sido atribuídas a um património que se tornou ‘ex-libris’ do concelho. Referindo o “aumento significativo” do número de visitas desde 2012, Nuno Prates frisa a “importância enorme para o concelho” de um espaço que se tornou “uma referência na museologia nacional e internacional”.

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Mário Pereira, presidente da Câmara Municipal de Alpiarça em cujos mandatos (iniciados em 2009) se concretizou o projeto começado pelos seus antecessores, só lamenta que o município (entidade que recebeu o legado de José Relvas) não tenha os meios para a promoção e divulgação que o património que herdou merece.

Para o autarca, a divulgação nacional e internacional da Casa dos Patudos tem de ser articulada com outras ofertas da região e do próprio concelho, como a Reserva Natural do Cavalo do Sorraia, a barragem artificial criada na década de 1980, as estações arqueológicas, a aldeia avieira do Patacão e a praia fluvial (projetos antigos por concretizar por falta de meios), aliados ao vinho e à gastronomia, fazendo com que os visitantes “fiquem mais tempo em Alpiarça”.

O historiador João Bonifácio Serra, coordenador científico e cultural do projeto da Casa dos Patudos durante a fase de reabilitação, alerta para a necessidade de o Ministério da Cultura olhar para a dimensão nacional do património deixado por José Relvas e envolver-se na sua defesa e preservação.

“A defesa de uma coleção com a qualidade e importância desta implica um grande esforço de produção de conteúdos e de restauro do património móvel — que inclui inúmeros exemplares da arte europeia dos séculos XVII, XVIII e XIX” — e que uma Câmara sozinha, mesmo que fosse de dimensão média, o que não é o caso de Alpiarça, não consegue suportar, diz à Lusa.

“É preciso perceber que a qualidade da coleção e a personalidade que lhe dá nome têm uma dimensão nacional que é preciso fazer refletir na orgânica da própria casa”, acrescenta, defendendo a criação de uma estrutura — “talvez um conselho curatorial” — “onde um conjunto de personalidades da sociedade civil e o Estado acompanhassem o trabalho de investimento e recuperação do património móvel”.

Bonifácio Serra iniciou com o município o estudo de um modelo de gestão para a Casa dos Patudos que Mário Pereira diz à Lusa ter “abrandado”, devido à existência de “outras preocupações” que deixaram esta questão para “segundo plano”. “Sentimos essa necessidade de procurar uma fórmula em que não seja exclusivamente o município a gerir e a definir as linhas de desenvolvimento. Nos próximos anos temos de a trabalhar. Não temos ainda ideias muito claras” sobre a estrutura a criar, na qual, por imposição estatutária, o município terá de ter sempre posição dominante, declara.