O escritório do representante das Nações Unidas em Timor-Leste apelou ao Governo timorense para que intervenha junto das autoridades judiciais no sentido de permitir que uma cidadã portuguesa acusada num processo possa sair do país por questões médicas.

A nota verbal endereçada ao Ministério dos Negócios Estrangeiros timorense e obtida pela Lusa refere-se à situação do casal Tiago e Fong Fong Guerra que estão há 26 meses impedidos de sair de Timor-Leste à espera de ser julgados por vários crimes de que são acusados.

O texto é datado de 15 de dezembro e abrange aspetos relacionados com “a prisão, detenção e medidas restritivas” impostas a Tiago Guerra e à sua mulher desde 18 de outubro de 2014.

“Este escritório foi informado de que a senhora Guerra necessita de atenção médica que não está disponível em Timor-Leste. Os arguidos já apresentaram ao Tribunal Distrital de Díli um pedido para viajar para tratamento, mas continuam sem saber da decisão sobre o seu pedido”, refere o texto.

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A petição das Nações Unidas é acompanhada de um relatório médico do Hospital Nacional Guido Valadares, em Díli, que confirma que Fong Fong Guerra sofre de problemas respiratórios graves que exigem diagnósticos e estudos “que não se podem de realizar nem no hospital nacional, nem em Timor-Leste”.

Como tal, diz a médica que assina o relatório, “é necessário realizar esses estudos fora do país” sendo que “são importantes para chegar a um diagnóstico definitivo da paciente”.

Além do pedido para a saída por questões médicas de Fong Fong Guerra, o texto pede apoio do MNE para obter “respostas urgentes” a vários pedidos judiciais do casal, incluindo uma alteração às “medidas restritivas” de coação.

Nota ainda a queixa formulada sobre “alegadas ilegalidades e irregularidades do Ministério Público” em abril e maio do ano passado.

“Este escritório solicita notificação de quaisquer audiências com pelo menos uma semana de antecipação para garantir que há analistas jurídicos qualificados disponíveis para as acompanhar”, refere o texto.

O pedido é feito pelas Nações Unidas porque Tiago Guerra ainda é funcionário da International Finance Corporation (IFC), uma das estruturas do Grupo Banco Mundial, instituição que é uma agência especializada do sistema das Nações Unidas.

Este é o terceiro pedido enviado pelas Nações Unidas em Timor-Leste depois de notas remetidas a 27 de outubro de 2014 e a 21 de abril de 2015, e destacado o facto de todos os prazos legais terem sido ultrapassados, incluindo o da imposição das medidas de coação que incluem proibição de sair do país.

“Já passaram mais de dois anos desde a detenção e prisão do senhor e senhora Guerra, o prazo máximo fixado pelo Código do Processo Penal para que se conclua a investigação”, refere o texto.

O casal, acrescenta, “está impedido de sair de Timor-Leste há 26 meses”, dos quais Tiago Guerra passou oito em prisão preventiva, pelo que as Nações Unidas consideram que “a proibição de viajar imposta” ao casal “já terá legalmente caducada”.

O escritório da ONU diz conhecer que já foi formalizada a acusação e sustenta que a Convenção de Privilégios e Imunidades das Agências Especializadas da ONU – que Timor-Leste já ratificou – prevê que as Nações Unidas sejam informadas da base de detenção de qualquer funcionário, “incluindo os principais factos e as acusações formais”.

Nesse sentido “o gabinete do coordenador residente gostaria de solicitar uma cópia das acusações detalhadas e uma explicação da base para essas acusações”, refere o documento, que nota ainda que o casal está há dois anos separado dos filhos.

Em novembro o Tribunal Distrital de Díli devolveu ao Ministério Público o processo de acusação contra o casal, por erros da procuradoria no que toca à notificação de um terceiro arguido.

Em causa está a acusação, pelos crimes de peculato, branqueamento de capitais e falsificação documental.

Coarguido no mesmo processo e acusado dos mesmos crimes está o cidadão norte-americano Bobby Boye, um ex-conselheiro do setor petrolífero que defraudou o Governo timorense e que, em outubro de 2015, foi condenado por um tribunal federal norte-americano a seis anos de prisão e a devolver mais de 3,51 milhões de dólares a Timor-Leste.