Os partidos da esquerda parlamentar pediram esta terça-feira a apreciação parlamentar do decreto-lei promulgado de urgência pelo Presidente da República, que reduz a Taxa Social Única (TSU) paga pelos patrões que contratarem trabalhadores a ganhar o salário mínimo — como moeda de troca para haver acordo de concertação social. O objetivo final dos comunistas e bloquistas é o aumento do salário mínimo para os 600 euros “sem contrapartidas de prejuízo para a Segurança Social ou o Orçamento do Estado”, mas resta saber como vai ser a votação da norma no Parlamento. O PSD é a peça-chave.

Os comunistas foram os primeiros a chamar esta norma ao Parlamento, através do pedido de apreciação parlamentar, mas o Bloco de Esquerda apareceu logo de seguida a pedir o mesmo: a cessação de vigência da norma que dá uma “benesse” aos patrões em troca do aumento do salário mínimo. A conferência de líderes, que decide os agendamentos no plenário, vai reunir-se esta quarta-feira, devendo decidir nessa altura em que dia vai a norma ser chamada ao Parlamento — e votada.

O PSD já anunciou que irá votar ao lado do BE e do PCP para revogar a medida, concordando nos argumentos da esquerda sobre o perigo de “descapitalização da Segurança Social”, bem como sobre o facto de a redução da TSU ser usada, de forma “perversa”, como contrapartida para o aumento do salário mínimo. Mas acontece que, enquanto o texto do PCP que pede a apreciação parlamentar daquele decreto é branco o suficiente para o PSD votar a favor, o texto do BE, entregue também esta terça-feira à tarde, é muito crítico das reformas laborais levadas pelo anterior Governo do PSD/CDS a partir de 2012.

BE pressiona PSD ao criticar reformas laborais do anterior governo

No preâmbulo do pedido de apreciação parlamentar do decreto de lei em questão, o Bloco de Esquerda deixa duras críticas ao anterior Governo do PSD/CDS, pondo nas reformas laborais levadas acabo desde 2012 uma parte das culpas da desvalorização que tem sido feita dos rendimentos do trabalho. Tal formulação pode dificultar a aprovação do texto por parte do PSD. O CDS, por sua vez, já anunciou que vai apresentar propostas de alteração pontuais àquele decreto, devendo por isso votar contra a cessação de vigência da norma sobre a TSU.

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“Ao longo dos últimos anos, os salários de quem vive do seu trabalho têm sido desvalorizados por múltiplas vias. Se o salário mínimo tivesse sido sempre atualizado considerando o valor da inflação e o aumento da produtividade desde que foi instituído, o seu valor seria hoje de cerca de 900 euros”, começa a ler-se no texto dos bloquistas, invocando aqui um argumento que tem sido usado pelo PSD para justificar o porquê de ser contra a norma.

Mas o BE continua as críticas ao partido da direita. “Por outro lado, as alterações à legislação laboral levadas a cabo em 2012 pelo anterior Governo, do PSD/CDS, traduziram-se numa inédita transferência de rendimento dos trabalhadores para as entidades empregadoras, no valor de 2,3 mil milhões de euros. Ou seja, há uma compensação a fazer aos trabalhadores no sentido da devolução do poder de compra que lhes foi subtraído nas últimas décadas e, em particular, nos anos da troika. O aumento do salário mínimo é um elemento, ainda incompleto, dessa compensação devida a quem trabalha”, continua a ler-se.

O resto de preâmbulo dedica-se a apontar os problemas associados à redução de 1,25 pontos percentuais da TSU que o Governo pretende implementar. Ora por se tratar de “um benefício às empresas que pagam os salários mais baixos”, ora por ser “uma medida que desresponsabiliza as entidades empregadoras” do dever de remunerar dignamente os seus trabalahdores, ora ainda por ser “uma medida que promove a descapitalização da Segurança Social, dado que o desconto feito às entidades patronais será financiado não apenas pelo Orçamento de Estado, mas também pela Segurança Social”. Tudo argumentos com os quais o PSD, e o CDS, concorda.

PCP centra culpas no atual Governo

O PCP, contudo, opta por centrar a sua justificação nos problemas associados à redução da TSU e não faz qualquer referência à atuação do Governo anterior. Para os comunistas, o diploma que o Governo aprovou ontem através de um chamado Conselho de Ministros eletrónico para ser rapidamente promulgado em Belém expressa “um reiterado e flagrante exemplo de incentivo à política de baixos salários, oferecendo uma redução da TSU como moeda de troca do aumento do Salário Mínimo Nacional”.

Os comunistas não concordam com aquilo que classificam como uma forma “assegurar uma benesse aos grupos económicos através da redução em 1,25 pontos percentuais da TSU”, como moeda de troca para o aumento do salário mínimo para 557 euros, “repartindo o impacto entre o Orçamento do Estado e o orçamento da Segurança Social”.

Reduzindo as contribuições das empresas para a Segurança Social nos casos em que contratam trabalhadores a quem pagam o salário mínimo, esta medida representa um incentivo declarado à prática de baixos salários.”

O PCP não só acusa o PS de seguir “o caminho iniciado pelo Governo PSD/CDS” em 2014, como diz que o Governo cedeu “à chantagem do patronato que exige contrapartidas para o aumento do salário mínimo”, o que para os comunistas é “inaceitável”. Já antes, no debate, Jerónimo de Sousa tinha dito que é ao Governo que cabe a responsabilização pelo acordo de concertação social alcançado.

A medida de compensação, de acordo com o texto do PCP que solicita a apreciação parlamentar, “nem sequer encontra qualquer justificação económica na medida em que as remunerações têm um peso de apenas 18% na estrutura de custos das empresas, muito inferior a outros custos com energia, combustíveis, telecomunicações, créditos ou seguros”.

O PCP considera que este é “um caminho que consubstancia um caminho de desvinculação das entidades patronais para com o financiamento da segurança social”, para rejeitar “em absoluto” este caminho. Defende, em alternativa, “a necessidade de diversificação das fontes de financiamento das segurança social, designadamente através do contributo das empresas como lucros significativos e um número reduzido de trabalhadores”. Esta diversificação das fontes de financiamento da segurança social será objeto de propostas legislativas autónomas do PCP.