Cecilia Wikström chegou ao lugar de coordenadora do Comité de Comissões do Parlamento Europeu como “moeda de troca” entre os Liberais e os Populares Europeus. A sueca ficava com o lugar que, até esta quarta-feira, pertencia a Jerzy Buzek, antigo presidente do Parlamento, e os Liberais (ALDE) apoiavam a eleição do italiano Antonio Tajani para o lugar de Martin Schulz. O nome de Wikström foi aprovado esta quarta-feira e, em declarações ao Observador, a eurodeputada faz uma antevisão do próximo ano de Bruxelas, com o Brexit, a crise dos refugiados e Donald Trump na agenda. “O diálogo entre os Estados Unidos e a União Europeia está enfraquecido” e isso é consequência de uma posição “unilateral” da nova Administração na Casa Branca, defende.

8th parliamentary term [13553];BUZEK, Jerzy (EPP, PL) [1609];WIKSTRÖM, Cecilia (ALDE, SE) [8578],

Buzek passa a pasta da presidência do Comité de Comissões parlamentares a Wikström

A eurodeputada, membro dos Liberais e Democratas pela Europa (ALDE), grupo liderado pelo belga Guy Verhofstadt, tem esperança de que, na nova configuração política mundial — com Trump em Washington e os populismos que tentam despontar na Europa — o “bom senso vai prevalecer na União Europeia”. Mas nos contactos que tem mantido em Bruxelas e no seu país de origem, a sueca assume que as pessoas “estão preocupadas” com os sinais que chegam dos Estados Unidos, por exemplo em matéria de trocas comerciais. E a verdade é que já ninguém esconde que a “forte relação transatlântica” que existia até 20 de janeiro pode ter os dias contados. “A realidade que vimos nascer com o fim da II Guerra Mundial, com a implementação das democracias liberais, está a desfazer-se”, analisa Cecilia Wikström.

A resposta ao isolacionismo e protecionismo defendidos por Trump deve ser feita, na opinião da eurodeputada, com um regresso do projeto europeu às suas raízes. “Esta União Europeia foi fundada nas ruínas da II Guerra Mundial, assente da defesa e promoção dos direitos fundamentais e da democracia”. O mercado interno, só chegou “muito mais tarde”.

Cumpre-se o formalismos. Sai a placa com o nome de Buzek para ser colocada a de Wikström

Cumpre-se o formalismo. Sai a placa com o nome de Buzek para ser colocada a de Wikström

O problema é que o próprio projeto europeu revela ligeiras indicações de estar a esboroar-se. O referendo no Reino Unido que ditou o sim ao Brexit foi um sinal de que há vontade de romper com a União. Para já, foram os britânicos. Mas poderá essa rutura (e o recuo para uma União a 27) espalhar-se a outras geografias e ditar a sentença da comunidade europeia da livre-circulação de pessoas, de bens, serviços e capitais?

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Tudo pode acontecer, já vimos o Brexit e já vimos Trump”, assume a nova presidente do Comité de Comissões (CCC, na sigla inglesa).

O tom pessimista dura uma fração de segundo. Logo a seguir, Cecilia Wikström chama a atenção para os “bons sinais” que fazem o contrapeso ao “annus horribilis” de 2016. Na Áustria, o independente Alexander Van der Bellen bateu Norbert Hofer por sete pontos nas eleições presidenciais e conseguiu aplacar a onda populista que cavalgava a espuma da candidatura da direita. “É um bom sinal daquilo que espero que venha a acontecer noutros países em que os cidadãos assistem à destruição de instituições”, antevê a sueca. “Talvez nesse momento pensem duas vezes naquilo que os populistas estão a fazer no outro lado do Atlântico”.

Até esta quarta-feira, Cecilia Wikström presidia ao comité das Petições. Agora, graças ao acordo entre ALDE e o PPE (os Populares Europeus, de que fazem parte o PSD e o CDS), salta para um lugar com um cargo com um simbólico peso político — de resto, é por ali que passa a gestão das muitas comissões do Parlamento Europeu e, não por acaso, a coexistência de Schulz na presidência e de Buzek no CCC levou a algumas disputas silenciosas sobre qual dos dois tinha de facto na mão a gestão do Parlamento.

Apesar do salto inesperado até há duas semanas, Wikström recusa a ideia de que a sua escolha nasça de um mero acordo de lugares entre ALDE e PPE. Na semana anterior ao acordo de última hora, o ALDE tinha recusado uma proposta do seu líder para agregar os deputados italianos eleitos pelo Movimento 5 Estrelas. Indefinição de identidade? “O ALDE tem uma identidade muito forte, é um movimento liberal da Europa e quando podemos ter uma aliança com maior grupo pro-europeu isso é bom para os cidadãos europeus”, defende-se a eurodeputada. A resposta abarca a aproximação ao PPE, mas deixa de fora as razões que pudessem explicar o diálogo com os correligionários de Beppe Grillo.

Trump, Brexit… e refugiados. No diálogo que foi mantendo com a presidência maltesa do Conselho detetou vontade para desenhar uma solução europeia tão consensual quanto possível para o problema dos migrantes que chegam à Europa para escapar à morte em África e no Médio Oriente. “Não é curioso que tenhamos feito uma união política, uma união económica, convergimos em segurança mas não somos capazes de dar corpo a uma União Europeia humanitária, onde partilhamos a responsabilidade por estas pessoas?”. “Aquilo que os cidadãos esperam do Parlamento Europeu é que apresentemos resultados“, diz Wikström.