Cabelo loiro, risco certinho à esquerda, penteado bem colado ao crânio, fato escuro com riscas claras e gravata azul por baixo e uma postura desde o início combativa, na sua “conversa” com jornalistas, atrás do púlpito da sala de conferências de imprensa da Casa Branca. Podia bem ser Sean Spicer. A figura que vemos no ecrã, em tudo nos faz lembrar o porta-voz da Administração Trump. Mas é Melissa McCarthy, a atriz, humorista, que durante oito minutos gesticula, fala (grunhe?) e raciocina como Spicer, numa das rubricas do programa de humor Saturday Night Live.

McCarthy brilhou. Numa edição do SNL dedicada a Donald Trump, em que Alec Baldwin voltou aos estúdios de Nova Iorque para imitar o Presidente, e em que a atriz Kristen Stewart apareceu como apresentadora para ajustar contas com os tweets que lhe foram dedicados pelo agora Presidente norte-americano, foi a personagem de McCarthy quem mais pontos somou.

Eu sei que eu e a imprensa tivemos um começo duro [rocky, em inglês], mas quando digo começo duro é no sentido do filme [com o mesmo nome], porque eu vim aqui para esmurrar-vos na cara”, disse, para início das conversações, numa simulação das conferências de imprensa da Casa Branca na era-Trump.

Spicer/McCarthy também tinha as suas contas a acertar. “Quero pedir desculpa, em vosso nome [dos jornalistas que cobrem a Casa Branca], a mim pela forma como me trataram nas duas últimas semanas”. Machados de guerra enterrados? Nem por isso. “Esse pedido de desculpas não é aceite”, gritou McCarthy/Spicer aos repórteres.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Entre “factos alternativos” e uma leitura muito própria dos acontecimentos que envolvem o Presidente Trump (qualquer semelhança com a realidade pode ser mais do que mera coincidência), a personagem Sean Spicer partilhou a sua versão sobre um dos anúncios mais importantes feitos nas duas últimas semanas pelo Presidente norte-americano, o nome escolhido para o Supremo Tribunal.

Ora vejamos como tudo aconteceu: “O presidente anunciou a sua escolha na televisão nacional. Quando entrou na sala, a multidão saudou-o com uma ovação de pé que durou 15 minutos. Podem confirmá-lo nas gravações. Toda a gente sorria, toda a gente estava feliz, todos os homens tiveram ereções e cada uma mulheres ovulou à direita e à esquerda. E ninguém, ninguém estava triste. Estes são os factos eternos”.

Mais do que palavras, vale a pena ver o excerto da prestação de McCarthy.

OK, só mais uma peróla. Quem disse que Donald Trump tem alguma coisa contra muçulmanos? A ordem executiva contra a entrada de cidadãos de sete países de maioria muçulmana? Não, não. Sean Spicer explica o que está aqui em causa. Na verdade, o Presidente norte-americano está num “combate contra moose/lambs [renas/cordeiros]”. O som faz soar qualquer coisa diferente, percebe-se a confusão.

Bom, mas houve mais. Alec Baldwin também voltou ao programa — vai ser ele o apresentador da próxima edição, a 11 de fevereiro — para encarnar a personagem de Donald Trump. Baldwin/Trump ligou ao primeiro-ministro australiano, Malcolm Turnbull, e declarou guerra ao país. “Refugiados, não. A América primeiro, a Austrália não presta. O vosso recife está a falhar. Preparem-se para a guerra”. E desligou.

(Obama tinha-se comprometido a receber 1200 refugiados que estão no país).

Ao lado de Trump/Baldwin, o responsável pela Estratégia do Presidente, Steve Banon — na verdade, a imagem da morte aparece a fazer a sua vez o ecrã –, incentivava-o a continuar com as chamadas telefónicas para líderes mundiais. Peña Nieto recusa-se a pagar o muro e é-lhe declarada guerra.

Angela Merkel era a seguir na linha.

– Estou, é o meu querido Barack? Barack, tenho saudades tuas, diz uma desesperada chanceler alemã.

– Não, é o Donald Trump.

– Ah, que nojo.

Merkel tenta escapar-se à conversa, não desliga a tempo e ainda ouve o Presidente ignorar as mortes de judeus durante o Holocausto, anunciar que vai escrever um livro (vai chamar-se “A minha luta” e fala sobre a incapacidade dos media para reconhecer a multidão que esteve na sua tomada de posse) e… adivinhou: declara guerra à Alemanha.

O excerto de abertura do SNL tem seis minutos e meio. Cada um deles merece ser visto. Spoiler alert: afinal, não é Trump quem dá ordens na Casa Branca.

Houve ainda um monólogo da atriz Kristen Stewart, ela que foi a anfitriã convidada do último sábado e que aproveitou para recordar o momento em que o agora Presidente se referiu à sua relação com outro ator. “O Robert Pattinson não devia aceitar a Kristen Stewart de volta. Ela enganou-o como um cão e vai voltar a fazê-lo — esperem e vão ver. Ele consegue arranjar muito melhor!”.

Sim, o tweet existe: