O escândalo

Foi de certeza o final mais caótico e ridículo visto numa cerimónia dos Óscares. Faye Dunaway e Warren Beatty estavam em palco para anunciar o vencedor de Melhor Filme, e Beatty disse ter sido “La La Land”, que assim recebia o seu sétimo Óscar, metade daqueles para que estava nomeado. Com os produtores do filme já em palco e a fazerem os agradecimentos da praxe, um destes grita de súbito que tinha havido um erro e que o vencedor afinal era “Moonlight”, de Barry Jenkins. Confusão geral, Warren Beatty queixa-se que lhe tinham passado o envelope errado — o que revelava Emma Stone como Melhor Actriz, Óscar que havia sido dado imediatamente antes –, o apresentador Jimmy Kimmel tenta aligeirar a coisa com duas ou três piadas, mas o mal já estava feito, e até o Twitter oficial da Academia tinha anunciado “La La Land” como melhor filme. Uma confusão embaraçosa e uma situação impensável nos Óscares. “Vão rolar cabeças”, escrevia no Twitter um conhecido produtor. E assim uma cerimónia muito inchada de política acabou com um estoiro de farsa. M. Night Shyamalan não resistiu e tweetou que tinha sido ele a escrever este final.

A reviravolta

“Gaffe” monumental à parte, repetiu-se o sucedido no ano passado, quando ‘O Caso Spotlight’ tirou o Óscar de Melhor Filme a “O Regresso”, de Alejandro González Iñárritu, que já tinha ganho o de Realizador, e houve assim mais uma decisão salomónica da Academia. O musical de Damien Chazelle acabou com seis Óscares, e “Moonlight” com três, numa noite que também ficará para a história pelo volume de Óscares dados a intérpretes negros e filmes de realizadores negros — reflectindo o grande número de nomeados — , como se a Academia estivesse a fazer um acto de contrição por causa da campanha #OscarsSoWhite do ano passado. O que resultou nalguns prémios mais orientados pelo politicamente correcto e pelo desejo de agradar a grupos específicos, do que pelo desejo de recompensar os melhores.

O quase-derrotado

Seja como for, houve uma resistência a cobrir de Óscares o filme “corporativo”, “La La Land”, que se passa em Hollywood, homenageia e cita o musical, celebra o cinema e fala das suas ilusões, crueldades e alegrias. O Óscar de Melhor Filme a “Moonlight”, uma produção independente honesta, visualmente sedutora e que não quer ficar num nicho étnico e de “causa”, mas com limitações, que também ganhou Melhor Actor Secundário e Argumento Adaptado, não distingue de forma alguma a melhor fita em liça pela estatueta. Que também não ficaria bem a “La La Land”, à qual não chega a intensidade e a sinceridade do amor do realizador Damien Chazelle pelo formato, nem a sua capacidade de integrar no filme toda uma variedade de referências ao género. Entre os poucos Óscares certeiros da noite contam-se os dois dados a ‘Manchester by the Sea’, de Argumento Original a Kenneth Lonergan, também realizador, e de Melhor Actor a Casey Affleck. A este, sim, o de Melhor Filme teria assentado como uma luva.

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