Desde o início do ano, regista-se já uma mão-cheia de desentendimentos entre os partidos de esquerda no Parlamento: TSU, Carris, Uber, lei sindical da PSP e, agora, na gestão das áreas protegidas. O PEV marcou um debate de urgência e — tal como PCP e Bloco de Esquerda — acusa o Governo de estar a fazer uma “municipalização das áreas protegidas“. Em ano de autárquicas, os dois partidos da CDU destacam o respeito pelos autarcas, mas o Bloco de Esquerda (partido com menos representação no poder local) vai mais longe e adverte para o perigo do “aumento poder arbitrário das autarquias”.

O Governo pretende passar parte da gestão das áreas protegidas para as mãos das autarquias, o que comentadores e especialistas têm criticado por considerarem que potencia a corrupção em áreas como o licenciamento. Ainda assim, o ministério do Ambiente vai avançar já até ao final de março com um projeto-piloto para um novo modelo de gestão das áreas protegidas no Parque Natural do Tejo Internacional e tem por objetivo alargá-lo a outras zonas do país.

Heloísa Apolónia, deputada do PEV, concorda que atualmente as “coisas não funcionam bem” ao nível da gestão das áreas protegidas, criticando o modelo “imposto por José Sócrates em 2008”, que “não foi positivo”. A líder do Partido Ecologista “Os Verdes” destaca que “tem um profundo respeito pelos autarcas”, mas acrescenta que “há níveis de responsabilidades diferentes que cabem a agentes diferentes”. Ou seja: “Não são os autarcas que devem gerir os parques naturais ou reservas naturais, porque esta rede de áreas protegidas tem uma dimensão que não pode deixar de ser vista como de âmbito nacional.”

Heloísa Apolónia afirma que “o Governo bem pode não gostar que lhe chamem municipalização, mas a verdade é que quer pôr os presidentes de câmara a liderar a direção das áreas protegidas“. Isto, acredita o PEV, só irá “cavar mais o fosse entre as tensões que resultam de interesses económicos e interesses ambientais.”

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Também o PCP, através da deputada Ana Virgínia Pereira, disse ter “sérias preocupações” relativamente ao plano do Governo, já que a discussão deve ser precedida de “maior reflexão.”

O deputado do Bloco de Esquerda, Jorge Costa, também assume preocupação com o modelo de gestão proposto pelo Governo, já que são precisamente as “concessões de licenciamento” a nível local que “vêm sendo uma ameaça para as áreas protegidas” nos últimos anos. Jorge Costa teme que esta forma de gestão favoreça os “interesses industriais” e os “interesses empresariais” e denuncia que potencia um “aumento do poder arbitrário das autarquias”.

O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, explica que o próprio Governo tem “dúvidas” sobre o modelo que propõe, daí que tenha decidido avançar primeiro com um projeto-piloto. O governante afirma que classificar o projeto como “municipalização das áreas protegidas é errado” e só existe para dar um “grande título de jornal”.

João Matos Fernandes admite que o projeto não pode ser “universal”, tendo em conta as diferentes características de cada parque natural. Ainda assim, admite que pretende alargar o modelo que agora será testado no Parque Natural do Tejo a outras zonas do país.

O PSD, através do deputado Jorge Paulo Oliveira, diz que o assunto prova que “os partidos de esquerda estão uns contra os outros e contra o Governo” e que viu isso “acontecer na TSU, na Carris” e antecipa que “é o que vai acontecer aqui com este decreto-lei.” E atira, dirigindo-se ao ministro: “Está na hora de meter ordem nessa casa“. Também o deputado social-democrata Bruno Coimbra acusou os partidos à esquerda do PS de estarem a gerar “desconfiança” nos autarcas e no poder local ao considerarem que não são capazes de assegurar a gestão das zonas protegidas.