A Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Parlamento Europeu aos Panama Papers vai pedir para ouvir os ex-ministros das Finanças Maria Luís Albuquerque e Vítor Gaspar, garante ao Observador Ana Gomes, vice-presidente da comissão. Mas a lista, ainda por aprovar, pode não ficar por aqui. Sem especificar nomes, a eurodeputada socialista, vice-presidente da comissão parlamentar, explica que — nas deslocações a outros países feitas pelos membros da CPI –, foram ouvidos ministros, denunciantes, juízes, reguladores, jornalistas, entre outras pessoas com informação privilegiada sobre o dossier. Portugal será um dos próximos países a receber um grupo de eurodeputados com a pasta do Panama Papers.

Com o enquadramento do tema da comissão parlamentar, os eurodeputados querem pedir esclarecimentos sobre a remessa de verbas para offshores a partir de Lisboa, sem que a Autoridade Tributária saiba de que dinheiro se trata, se foram cumpridas as obrigações fiscais ou quem está na origem e no destino dessas transferências.

Além das questões de “fiscalidade” associadas a estas transferências, pode haver matéria criminal nestes casos, relacionada com o “branqueamento de capitais”, que importa investigar, destaca Ana Gomes.

A proposta para que uma comitiva da comissão parlamentar venha a Portugal foi formalizada esta segunda-feira em reunião de coordenadores e, segundo Ana Gomes, já estão a ser preparados os contactos com as autoridades portuguesas para essa deslocação — à imagem do que tem acontecido com outros países — em que são recebidos “atuais e anteriores responsáveis” de várias áreas. As datas para a passagem por Portugal vão ser definidas nas próximas semanas mas a expetativa é a de que os encontros possam acontecer “ainda antes do verão”, admite Ana Gomes.

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Para Nuno Melo (CDS), a eurodeputada socialista está a dar passos maiores que a perna. Ao Observador, o eurodeputado centrista é membro da CPI – que já propôs a audição do secretário de Estado Rocha Andrade, entretanto aprovada – refere que “a única coisa que está decidida é que há uma proposta de missão”. Agora, ainda terá de ser discutido “onde” vai acontecer a missão – se a Lisboa se à Madeira – e se a audição tem uma “perspetiva pedagógica” (em que será mais plausível ouvir antigos governantes) ou uma “perspetiva” investigatória. Neste caso, as audições terão de ser e então tem de ser “avaliadas casuisticamente”.

Isso não significa, sublinha Nuno Melo, que o deputado tenha uma “objeção de princípio” quanto à audição de ex-responsáveis políticos. Mas também não aprova nomes sem discussão prévia.

Segundo fontes europeias, a deslocação carece ainda de aprovação final por parte da conferência de presidentes e, na reunião da última segunda-feira, não foram discutidos nomes concretos para as audições a realizar em Lisboa. No entanto, até ao momento, sublinha ao Observador fonte da delegação portuguesa do PS em Bruxelas, “é prática corrente que, sempre que um pedido de uma missão é aprovado em comissão de coordenadores por consenso” — como aconteceu em relação à visita a Lisboa — “a conferência de presidentes não se opõe”.

Carecendo de aprovação, a audição de ex-ministros, reguladores, magistrados e outros elementos ligados à investigação judicial em Lisboa será uma continuação daquilo que tem acontecido nas visitas a outros países, no âmbito da CPI aos Panama Papers.

Além de responsáveis políticos, admite-se em Bruxelas que os reguladores do setor financeiro possam também ser ouvidos. Em concreto, no caso português, pode também estar em causa uma audição ao governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, e a “responsáveis de empresas” que tenham relação com a remessa de verbas para paraísos fiscais.

Os responsáveis a quem a CPI faça chegar pedidos de audição não estão obrigados a prestar esclarecimentos aos eurodeputados. Mas “o Parlamento Europeu tem mecanismos para fazer pagar reputacionalmente as entidades que decidam não estar presentes”, sublinha Ana Gomes. E, “quando se trata de responsáveis políticos, isso também leva a que se faça uma leitura política”, destaca.

Nos últimos meses, os eurodeputados fizeram deslocações ao Reino Unido, Malta, Luxemburgo, EUA, estando ainda previstas viagens a Chipre e à Suíça. No Luxemburgo, por exemplo, foram ouvidos, entre outros, os ministros da Justiça e das Finanças.

No início do mês, a eurodeputada (eleita pelo PS) enviou uma carta ao presidente da CPI, o eurodeputado Werner Langen, pedindo-lhe que alargasse o âmbito da investigação ao “escândalo atual de transferências não escrutinadas para paraísos fiscais a partir de Portugal”. Na carta destacam-se as explicações que o ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais apresentou no Parlamento, sobretudo o facto de ser o “responsável político” pela não divulgação pública de estatísticas relacionadas com as remessas para offshores.

Mas a questão é mais lata. “Ela envolve responsabilidades portuguesas e europeias para que sejam implementadas diretivas de combate ao branqueamento de capitais, que também têm implicações no combate ao financiamento de terrorismo e da criminalidade associada”, refere Ana Gomes na mesma missiva.

Da CPI do Parlamento Europeu fazem ainda parte como membros efetivos, além da socialista, os eurodeputados José Manuel Fernandes (PSD) e Nuno Melo (CDS). Manuel dos Santos (PS) e Miguel Veigas (PCP) são membros substitutos.

[Foi acrescentada a informação de que a deslocação de elementos da CPI a Portugal carece de aprovação da conferência de presidentes, além das declarações do eurodeputado Nuno Melo.

Título foi alterado às 11h16 de 16 de março de 2017, de “Bruxelas quer ouvir ex-ministros” para “Ana Gomes quer ouvir ex-ministros”]