As semelhanças entre Barcelona e Desp. Chaves estiveram a 11 metros de não ficarem apenas pela cor da camisola (pelo menos a original, porque os catalães gostam de inovar na coisa). O que são 11 metros? A distância entre a marca de grande penalidade e o risco da baliza.

Aos 90 minutos, ou 90 mais uns pozinhos de descontos, Braga tinha nos pés a possibilidade de levar os flavienses ao Jamor, mas foi das mãos do guarda-redes Douglas que saiu a chave do primeiro finalista da Taça de Portugal, o V. Guimarães. Que perdeu, por 3-1, na segunda mão, depois de ter ganho no Minho há mais de um mês por 2-0. Um golo fora acabou por fazer a diferença e até esse foi conseguido de forma dramática, apenas dois minutos depois de, pela primeira vez, os transmontanos passarem para a frente. Grande jogo de futebol, grande entrega, grande emoção. Mas só um podia seguir em frente.

Ficha de jogo

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Desp. Chaves-V. Guimarães, 3-1

Segunda mão da meia-final da Taça de Portugal

Estádio Municipal Manuel Branco Teixeira, em Chaves

Árbitro: Fábio Veríssimo (Leiria)

Desp. Chaves: António Filipe; Rodrigo (Batatinha, 79’), Ponck, Nuno André Coelho, Nélson Lenho; Pedro Tiba, Bressan; Perdigão (Davidson, 74’), Braga, Fábio Martins e Rafael Lopes (William, 64’)

Treinador: Ricardo Soares

Suplentes não utilizados: Ricardo, Patrão, Pedro Queirós e Massaia

V. Guimarães: Douglas; Bruno Gaspar, Josué, Pedro Henrique, Konan; Celis (Zungu, 54’), Rafael Miranda; Marega, Hurtado (João Aurélio, 73’), Hernâni e Rafael Martins (Raphinha, 84’)

Treinador: Pedro Martins

Suplentes não utilizados: Georgemy, Prince, Tozé e Texeira

Golos: Perdigão (1’), Bressan (33’), Nuno André Coelho (63’) e Marega (65’)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Hernâni (62’), João Aurélio (83’), Bruno Gaspar (86’) e Rafael Miranda (90’); Ricardo Soares, treinador do Desp. Chaves, foi expulso do banco aos 38′

Jeferson Fernandes Macedo, quem é? Pelo nome que tem no passaporte não chega lá, mas se for por Perdigão deve estar a ter uma luzinha: o brasileiro deixou de ser conhecido apenas pelo cabelo excêntrico com a parte central amarela e foi-se destacando com várias exibições de grande nível na Primeira Liga. Depois de passar por Tourizense, Sp. Braga B, Famalicão e Desp. Aves, subiu com o Desp. Chaves no ano passado e está a ser uma das unidades de maior destaque da equipa. Que continua a ser: logo aos 45 segundos de jogo, ainda algumas pessoas procuravam lugar num Municipal de Chaves à pinha, já o brasileiro tinha inaugurado o marcador com um remate de fora da área.

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Ricardo Soares pediu uma equipa com verdadeira alma transmontana e foi um brasileiro de São Miguel de Iguaçu a servir-lhe uma dose de bandeja mal tinha começado a refeição. E um luso-brasileiro, Fábio Martins, filho do antigo avançado Niromar nascido em Vila Nova de Gaia, ficou a centímetros de dar o segundo prato ao encontro, falhando por muito pouco ao segundo poste (10’).

O V. Guimarães tentava reagir, sem a inspiração do costume mas com a transpiração que lhe é exigida pelos apaixonados adeptos que enchiam os dois topos do Municipal de Chaves. Hurtado, de cabeça, quase empatou na sequência de um canto (15’), mas os flavienses continuavam num ritmo avassalador que colocava a bola junto à área contrária em quatro/cinco toques, explorando a velocidade dos seus alas nos corredores laterais.

Estava apresentado o cardápio do Desp. Chaves. Mas como qualquer menu, há pratos de peixe e de carne (pelo menos, ou entre muitos). E se de bola corrida já não estava a dar mais, passou-se ao segundo prato, a bola parada (ou lance de estratégia, como agora se chama vulgarmente). Que valeu o 2-0 a Bressan aos 33′, depois de bater na esquerda em arco sem que nenhum jogador desviasse. E que valeu o 3-0 a Rafael Lopes aos 36′, golo que seria bem anulado por fora-de-jogo bem anulado mas que teria muitas parecenças com o lance do brasileiro naturalizado bielorrusso que, curiosamente, já tinha sido jogador de Pedro Martins no Rio Ave.

Aquilo que o V. Guimarães tinha feito em 90 minutos estava alcançado pelo Desp. Chaves em apenas 45. Com 2-0, a eliminatória estava empatada, algo que os visitados nem nos melhores sonhos imaginavam. Mas se igualar a meia-final era bom, o que dizer quando Nuno André Coelho, de novo numa bola parada e de novo num livre lateral batido da esquerda por Bressan, desviou de cabeça ao primeiro poste para o 3-0 que virava por completo o jogo (63′)? Foi uma autêntica viagem ao céu, tão rápida como a primeira descida ao inferno.

Costuma-se dizer que quem com ferros mata, com ferros morre. E foi também na sequência de uma bola parada que o V. Guimarães conseguiu reduzir a desvantagem para 3-1, com Marega a acertar primeiro na trave e a corrigir depois para o fundo da baliza de António Filipe. Dois minutos depois, os vimaranenses voltavam para a frente da eliminatória. E estava garantido que, por causa desse tento forasteiro, não haveria prolongamento.

Assim, os últimos 25 minutos foram de loucos. Os flavienses, que tinham o treinador Ricardo Soares na bancada desde o final da primeira parte, tentavam encostar na frente mesmo sabendo que, face ao desgaste para virar as contas, muitas vezes as pernas não faziam aquilo que a cabeça pensava; já os vimaranenses aproveitavam o turbo de Hernâni, incapaz de carburar por cansaço, para criarem oportunidades e falharem a hipótese de arrumar tudo de vez. Entre tanta emoção, só mesmo uma grande penalidade para acabar em beleza. E este era daqueles jogos onde, qualquer que fosse o desfecho desse momento tão particular do futebol, seria justo. O brinde foi conseguido por Douglas, a fava saiu a Braga. E o guarda-redes, único jogador utilizado na vitória dos minhotos na única Taça de Portugal conquistada, em 2013, que ainda se mantém no plantel, foi quem reservou a viagem para a capital.

Agora, fica apenas a saber quem será o adversário do V. Guimarães na final, que sairá entre Benfica e Estoril (os encarnados venceram a primeira mão fora por 2-1). Benfica de Rui Vitória, o treinador que conduziu os minhotos ao triunfo no Jamor em 2013 frente às águias de Jorge Jesus. Reencontro à vista?