Aos 48 anos, Joaquín Cortés não está a pensar arrumar os tacões. “Continuo a ter uma boa relação com o meu corpo. Continuo a sentir que o meu corpo responde a 100%. Os anos passam e a vida de um bailarino no palco é normalmente curta, mas continuo porque me sinto bem.”

Vestido de negro e mais corpulento do que há uns anos, o bailarino e coreógrafo andaluz apareceu nesta quinta-feira à tarde no Centro Cultural de Cascais para participar na apresentação pública do Festival Groove, cuja segunda edição decorre de 23 a 25 de junho no Parque Marechal Carmona, em Cascais.

Cortés é um dos cabeças de cartaz, juntamente com a dupla de música eletrónica Thievery Corporation. No segundo dia do festival, apresentará um novo espetáculo a que chamou “Essência”.

“Houve momentos em que senti que precisava de parar para me oxigenar, para recarregar baterias, mas nunca quis afastar-me dos palcos. Para um bailarino, ou cantor, é normal precisar de desligar por algum tempo e depois voltar”, disse, em entrevista ao Observador. “Mas quando subo ao palco ainda me divirto da mesma maneira como quando era criança e atuei pela primeira vez.”

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Joaquín Cortés na apresentação do festival Groove

O novo espetáculo terá 17 instrumentistas em palco e um corpo de baile de 30 elementos, além do próprio Cortés. Mistura vários estilos de dança e de música, o que se tornou imagem de marca do criador: flamenco, dança contemporânea e dança clássica, música clássica, latina e árabe.

Joaquín Cortés ainda está em processo criativo, por isso não adiantou muitos pormenores. Referiu que se trata de uma “grande produção de dança pura”, com guarda-roupa do estilista Giorgio Armani, e que Cascais será o segundo local em que fará apresentações, a seguir a Barcelona. Depois, entrará em digressão mundial.

O processo criativo é complicado, mas maravilhoso”, classificou. “Nestes mais de trinta anos, foi sempre assim: todas as obras que criei começaram à mesa do café, com um guardanapo e uma caneta. Aponto ideias e sonhos sobre as minhas vivências. Ponho-me a escrever e depois pego nesse guardanapo com dois ou três apontamentos e vou para estúdio. Chamo bailarinos e músicos e começo a criar uma história. Como é que isto tudo depois funciona, não sei.”

À pergunta sobre se as ideias iniciais com que parte para uma criação acabam por estar refletidas no objeto final, o bailarino rapidamente respondeu que não. “Começo com uma ideia e acabo com uma história diferente. Essa é também a magia da nossa arte. Somos criativos, estamos dentro de um estúdio, frente a espelhos, com os músicos e os bailarinos, e começamos a pensar que agora é para ir por aqui, depois por ali, e no fim criou-se uma história.”

Cortés parece gostar de controlar por inteiro a criação das coreografias. Explicou que se alimenta dos movimentos que os bailarinos lhe dão durante os ensaios, mas tudo é delineado por ele.

“Crio para eles. Não faço como Pina Bausch, que pedia aos bailarinos que lhe apresentassem sugestões de movimentos. Parece-me uma boa ideia, mas no meu caso gosto de coreografias mais estruturadas, para que os bailarinos já saibam o que é para fazer. Tenho de procurar uma sinergia para que todos se acoplem e funcionem”, descreveu.

[um espectáculo de Joaquín Cortés:]

Especialmente famoso na segunda metade dos anos 90, através de longas performances e de uma interpretação pessoal do flamenco, entende que vai ganhando novos públicos com o passar do tempo, mantendo sempre aqueles que já o admiram. Mas não considera que o seu trabalho tenha um público específico.

A idade trouxe maturidade ao meu trabalho, assentei um pouco, e a idade ensina-nos muitas coisas. Com tudo o que já viajei… Uma coisa é estudar nos livros, quando somos pequenos, outra coisa é ver com os nossos olhos. A história de cada país, a vivência das pessoas, a comida, a cultura. São inúmeras referências de que me tenho alimentado, isso tem-me ajudado a crescer como pessoa e como artista.”

Sobretudo, disse, continua “fascinado e apaixonado” pelo que faz. “Caso contrário já me teria retirado há muitos anos. No dia em que suba a um palco e não me divirta é porque o meu tempo já passou.”