Alguns capítulos da História podem ser reescritos esta semana. De acordo com o The Guardian, o até aqui inacessível arquivo da Comissão de Crimes de Guerra das Nações Unidas, datado de 1943, vai ser aberto pela primeira vez esta semana pela Biblioteca Wiener, em Londres. O diário britânico antecipa que vão ser revelados novos detalhes sobre as torturas cometidas em campos de concentração durante o Holocausto.

Entre os ficheiros divulgados estão inquéritos judiciais feitos em países como a Polónia e a China, ainda antes da Rússia, o Reino Unido e os Estados Unidos terem assumido o controlo dos Julgamentos de Nuremberga — onde foram condenados vários dos altos responsáveis do regime nazi, por crimes cometidos durante a II Guerra Mundial.

Os arquivos agora conhecidos tinham sido selados no final da década de 1940, quando a Alemanha Ocidental (a RFA) se tornou num aliado fundamental dos norte-americanos. Na altura começa a Guerra Fria e decidiu-se pela confidencialidade dos documentos. Muitos dos condenados nazis foram libertados antes do tempo, numa altura em que o senador norte-americano Joseph McCarthy (o anti-comunista responsável pela chamada “Caça às Bruxas” nos EUA”) pressionava para que os julgamentos por crimes de guerra fossem encerrados. Travar o avanço do comunismo justificava tudo.

Os arquivos foram catalogados e vão poder ser consultados online. O acesso aos documentos vai coincidir com o lançamento da obra “Human Rights After Hitler: The Lost History of Prosecuting Axis War Crime“, de Dan Plesch, o investigador que trabalha há uma década nestes documentos.

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Entre os documentos estão relatos recolhidos pelo Governo polaco no exílio — ainda antes dos aliados derrotarem os nazis — com descrições detalhadas sobre o que se passou nos campos de concentração de Treblinka e Auschwitz. Howard Falksohn, responsável da Biblioteca Wiener, antecipa um “enorme interesse” histórico por documentação que inclui “ficheiros PDF, alguns com mais de duas mil páginas“. Howard Falksohn acredita que, com estas “novas provas” vai ser possível “reescrever capítulos cruciais da história”.

A investigação de Plesch, que durou dez anos, só foi possível após obter uma autorização especial para ter acesso os documentos, que estavam fechados a sete chaves na sede da ONU, em Nova Iorque. Apenas os investigadores que tiveram autorização do Governo no respetivo país e consentimento do secretário-geral da ONU puderam ler estes documentos. E sem puderem tomar notas ou tirar cópias. Dan Plesh conseguiu, no entanto, convencer diplomatas — incluindo a então embaixadora dos EUA na ONU, Samantha Power, a desclassificar estes ficheiros. O investigador acredita que este é um “recurso enorme para combater a negação do Holocausto“.

A Biblioteca de Wiener foi fundada em Amesterdão em 1934 por Alfred Wiener e tinha como objetivo monitorizar o antissemitismo nazi. Nas vésperas da II Guerra Mundial Wiener enviou todo o seu espólio para Londres e colaborou com o governo britânico para dar informações sobre o regime de Hitler. Mais tarde também ajudou na obtenção de provas para os Julgamentos de Nuremberga. Agora, sediada em Bloomsbury, no centro de Londres, a biblioteca apoia o estudo do Holocausto e fornece ajuda gratuitaaos que procuram familiares que desapareceram nos campos de concentração.

Algumas das provas agora conhecidas foram compiladas ainda durante a II Guerra Mundial para acusar Adolf Hitler de massacres na Checoslováquia. São mais de 300 páginas que referem as ordens dadas diretamente pelo ditador alemão e o seu grau de responsabilidade, recolhidas pelo Governo checo no exílio. Hitler chegou a ser indiciado por esta comissão em 1944, numa reunião em Londres.