O cumprimento das metas orçamentais previstas no programa de estabilidade (PE) entregue pelo Governo a Bruxelas “reside praticamente no efeito do crescimento económico“, de acordo com o gabinete de estudos do Forum para a Competitividade. A análise ao documento, incluída no boletim de conjuntura de abril de 2017, alerta que, “se a economia desacelerar, não haverá margem orçamental para atingir os objetivos propostos“. E acrescenta que, “mesmo em algumas rubricas, parece haver otimismo nas projeções”, com destaque para as despesas que o Estado terá de suportar com o pagamento de juros da dívida pública.

Numa apreciação assinada por Joaquim Miranda Sarmento, professor no ISEG, o PE é qualificado como “um plano ambicioso” tendo em atenção a promessa do Executivo de alcançar um superávite correspondente a 1,3% do produto interno bruto (PIB) em 2021, quando o ponto de partida é o de um saldo negativo de 2,5%, excluindo medidas extraordinárias, em 2016. As contas efetuadas pelo gabinete de estudos do Forum, liderado pelo economista Pedro Braz Teixeira, refere que o superávite projetado será de 2,7 mil milhões de euros no último ano do quinquénio abrangido pelo programa e que o saldo primário, que exclui a despesa com juros, terá de crescer até 10,5 mil milhões de euros.

Ao analisar as previsões do PE sob o critério do peso das despesas e receitas públicas no PIB, Joaquim Miranda Sarmento considera que “o esforço de consolidação entre 2016-2021 está todo concentrado na redução da despesa, dado que a receita total mantém-se praticamente inalterada, em torno dos 43% PIB”. Desta forma, “parece que o governo vai fazer um ‘enorme’ esforço de redução da despesa pública”, já que se trata de comprimir os gastos em “1,3 pontos percentuais na despesa com pessoal, menos 1,2 nas prestações sociais, menos 0,7 nos consumos intermédios e menos 0,6 nos juros”. Mas o cenário altera-se quando a avaliação se desloca para os valores em milhões de euros.

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À luz deste critério, o Forum para a Competitividade considera que “a consolidação orçamental vai ser baseada quase exclusivamente no crescimento económico“. A verificar-se, o aumento antecipado para o ritmo da atividade, segundo revelam as contas do boletim de conjuntura, fará com que a receita fiscal e total aumente 10 mil milhões de euros e 14 mil milhões de euros, respetivamente”. Em simultâneo, o crescimento do produto subjacente às previsões da execução orçamental durante os próximos anos “dá margem do lado da despesa”.

Neste cenário, “o Governo terá de manter a despesa com um aumento de ‘apenas’ quatro mil milhões de euros” e, nos consumos intermédios, “onde o efeito inação se faz sentir mais (compra de bens e serviços), há 400 milhões de euros de margem, mas que, na realidade, são quase mil milhões de euros, dado que os pagamentos com as parcerias público-privadas rodoviárias iniciaram em 2016 a sua curva descendente”.

A folga, porém, é curta nalgumas rubricas, como é o caso da previsão sobre os juros da dívida pública, “que dificilmente se manterão dentro dos valores previstos”. O documento constata que o peso sobre o PIB dos compromissos das administrações públicas perante os credores vai reduzir-se, mas sublinha que a dívida “continuará a aumentar em valor nominal (embora em 2021 com um valor nominal próximo do de 2016)”. Conclusão: “a menos que haja uma redução das taxas de juro (muito pouco provável)” parece haver “suborçamentação nesta rubrica“.

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As dúvidas de Joaquim Miranda Sarmento incidem, também, sobre o desempenho da execução em 2017. “A consolidação orçamental em 2016 foi feita sobretudo por via da redução do investimento (e em menor medida, pelo aumento da tributação indireta)”, o que leva o professor do ISEG a formular uma pergunta. “Falta saber sobre 2016 uma coisa simples: a descida da despesa de investimento e de aquisição de bens e serviços, apesar do controlo em contas nacionais ser maior do que em contabilidade pública, foi mesmo despesa não realizada, ou apenas adiada?“. A propósito desta questão, o boletim de conjuntura do Forum para a Competitividade considera que, “se parte do investimento estiver apenas adiado, e com as eleições autárquicas for para avançar este ano, parte do exercício de 2017 ficará fortemente comprometido”.