Armando Baptista Bastos morreu esta terça-feira em Lisboa. O jornalista e escritor português tinha 83 anos e encontrava-se internado há várias semanas no hospital de Santa Maria.

Baptista Bastos nasceu a 27 de Fevereiro de 1934 no Bairro da Ajuda, em Lisboa. Enquanto estudante, passou pela escola António Arroio e, mais tarde, pelo Liceu Francês. Profissionalmente, trabalhou primeiro no jornal O Século, sendo em seguida, e com somente 19 anos, nomeado subchefe de redacção d’O Século Ilustrado. É dele, precisamente n’ O Século Ilustrado, “Comentário de Cinema”, uma coluna de crítica cinematográfica que, logo aí, lhe traçou o registo de escrita que perduraria até ao fim: desalinhado, incómodo e pessoalíssimo.

Seria despedido de O Século em abril de 1960. Um despedimento que Baptista Bastos sempre descreveu como “político”. E tudo porque, antes, em 1959, estivera envolvido como ativista na “Revolta da Sé”, o golpe militar contra o regime salazarista, por altura da candidatura de Humberto Delgado, que falhou e ditou o julgamento e prisão de muitos dos envolvidos. Baptista Bastos não seria julgado nem preso. Mas viveu os anos seguintes na clandestinidade como jornalista. Sob o pseudónimo de Manuel Trindade, redigiu noticiários na RTP e colaborou em diversos documentários da estação pública, destacando-se “ Este Século em que Vivemos”, realizado por Fernando Lopes, ou “ O Forcado”, da autoria de Augusto Cabrita.

Meio ano depois, acabaria também despedido da RTP, então por vontade de Moreira Baptista, secretário nacional da Informação. Em ofício, a descrição que Moreira Baptista faz de Baptista Bastos é clara do incómodo que este causava nos dias do Estado Novo: “Esse senhor é um contumaz adversário do regime”.

Armando Baptista Bastos, ainda como jornalista, escreveu em alguns dos mais importantes jornais e revistas em Portugal: República, O Diário, Almanaque, Seara Nova, Sábado, sendo também o redator em Lisboa da agência de notícias France Press. A sua passagem por todas estas redações foi, quase sempre, curta. Não o foi no Diário Popular, onde trabalhou vinte e três anos, de 1965 até 1988 — tendo as suas reportagens, crónicas ou, sobretudo, entrevistas, sido certo dia descritas pelo também jornalista Adelino Gomes como de “um estilo inconfundível”. Baptista Bastos foi ainda fundador do semanário O Ponto onde essas suas entrevistas de estilo único se destacam.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Como cronista – foi-o até março deste ano no Jornal de Negócios e no Correio da Manhã –, passou pelas páginas de Diário de Notícias, Jornal de Notícias, A Bola, Jornal de Letras, Expresso, Público, Diário Económico ou Jornal do Fundão, sendo também dele um sem-número de crónicas radiofónicas na Antena 1, Rádio Comercial e, sobretudo, na TSF, onde foi o primeiro comentador da rubrica “Crónicas de Escárnio e Maldizer”. Aquando da sua saída em outubro de 2014 do Diário de Notícias, onde durante sete anos assinou uma crónica semanal à quarta-feira, Baptista Bastos acusava o diretor André Macedo de o ter “posto fora”, “saneado”. E escrevia, numa derradeira crónica intitulada “Ponto final”: “Fui posto fora, mas não das palavras. Vou com elas, velhas amantes, para aonde haja um jornal que as queira e admita a indignação e a cólera como elementos de afecto, e sinais de esperança, de coragem e de tenacidade. (…) Não posso calar o que me parece um acto absurdo, somente justificado pelas ascensões de novos poderes. Porém, esses novos poderes são, eles próprios, transitórios pela natureza das suas mediocridades e pelo oportunismo das suas evidências.”

Da passagem pela TV de Armando Baptista Bastos há a recordar sobretudo o programa “Conversas Secretas”, emitido na SIC entre novembro de 1996 e janeiro de 1998 – um programa que foi parodiado por Herman José em “Herman Enciclopédia”, surgindo aí a pergunta “Onde é que estavas no 25 de Abril?”, célebre até hoje. À SIC regressaria em meados de 2001, então para conduzir entrevistas no programa “Cara-a-cara”.

Na literatura, em quase todos os géneros se destingiu Baptista Bastos: romances, crónicas, entrevistas, reportagens ou ensaio cinematográfico. O livro que reúne textos jornalísticos seus, “As palavras dos outros” (1969), assim como os romances “Cão velho entre flores” (1974) e “Viagem de um pai e de um filho pelas ruas da amargura” (1981), são considerados as suas obras-primas. “Cão Velho entre Flores” foi mesmo indicado como leitura obrigatória no Curso de Literatura Portuguesa Contemporânea da Sorbonne, em Paris.

Ao longo da vida, como escritor ou jornalista, Armando Baptista Bastos recebeu diversos prémios, destanco-se o Prémio P.E.N. Clube Português de Novelística (1988) pelo romance “A colina de cristal”, o Prémio da Crítica da Associação Portuguesa de Críticos Literários (2002) pelo também romance “No interior da tua ausência”, e o Prémio Clube Literário do Porto (2006).