Passou os últimos tempos a “amar pelos dois” Europa fora, a inspirar memes e hashtags e a reacender o amor dos portugueses pela Eurovisão, mas antes de tudo isso, e já depois de se ter desiludido com os concursos televisivos de talentos, Salvador Sobral até considerou ser psicólogo desportivo, cantou em bares e hotéis de Palma de Maiorca e apaixonou-se pelo jazz, que estudou em Barcelona e que o acompanhou no seu primeiro disco, Excuse Me, lançado em 2016.

Muito se tem escrito sobre Salvador Villar Braancamp Sobral, que nasceu quase no fim de 1989 e tem agora 27 anos: desde a doença cardíaca que o acompanha, e que o faz viver com a noção de “um prazo” (como o próprio confessou recentemente no programa “Alta Definição”, da SIC), aos gestos que faz ao cantar – algo que não surpreende quem já o via em concerto, e que ele designa como uma relação direta entre a música e o corpo –, passando pela atitude descontraída que assumiu ao viver toda esta experiência inesperada. Mas aqui ficam oito formas de conhecer melhor “Salvadorable”.

Desde os 11 anos a cantar na televisão

Tanto o Festival da Canção como a Eurovisão, à sua escala nacional e internacional, não deixam de ser concursos de talentos musicais. Para Salvador Sobral (e, já agora, para Luísa Sobral), sabe-se que isso não é novidade: em 2009 participou no programa “Ídolos”, da SIC, e chegou aos finalistas depois de ter cantado na audição “I’ve Got a Woman”, de Ray Charles – um dos seus ídolos de infância, a par com Stevie Wonder. Mas esse também não foi o primeiro concurso de talentos de Salvador Sobral. O primeiro foi mesmo “Bravo Bravíssimo”, onde participou com apenas 11 anos e cantou uma música de Rui Veloso – “Negro do Rádio de Pilhas”. Para reavivar memórias menos esclarecidas, Bravo Bravíssimo era aquele programa da SIC em que rapaziada nova mostrava os seus talentos artísticos, fosse na música, na dança ou em qualquer outra categoria.

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“Ganhar a Eurovisão? É-me indiferente. Com a quantidade de concertos e as pessoas a cantarem a música, eu já ganhei”

O músico que podia ter sido psicólogo desportivo

Apesar de, perante tanta experiência, parecer lógico que Salvador Sobral estivesse habituado à exposição televisiva, a verdade é que a passagem pelo programa “Ídolos” teve um impacto negativo e levou-o a afastar-se da música. Logo depois, e durante algum tempo, dedicou-se à Psicologia, que estudou em Lisboa. Na altura, era um grande fã de futebol, e até se podia ter perdido um músico para se ganhar um psicólogo desportivo, a vertente da licenciatura que pensou seriamente em seguir, e que o levou a viajar para Palma de Maiorca, dentro do programa Erasmus, para ir para um dos departamentos académicos mais reputados dentro dessa área. Mas a verdade é que o palco fica-lhe bem e a exposição ao público e às câmaras não parece ter qualquer tipo de efeito sobre a interpretação do cantor. Nervos? Pressão? Se os sente ninguém nota.

Dos bares de Maiorca à escola em Barcelona

Foi em Palma de Maiorca, longe da atenção que a passagem pela televisão lhe tinha dado, que Salvador Sobral acabou por se reconciliar com a música. Foi quase sem intenção – começou a cantar em bares e em hotéis, e isso começou a render dinheiro suficiente para um jovem de 19/20 anos poder achar que podia viver sempre assim, numa ilha, a atuar à noite. De tal forma que desistiu do curso de Psicologia. Acabou por voltar a estudar, mas naquele momento o percurso estava bem definido e era muito diferente do plano inicial: Salvador foi para Barcelona, onde estudou jazz, o género musical com o qual agora se sente confortável e que fez o que fez em Kiev.

[Salvador Sobral a cantar nas ruas de Barcelona]

O jazz e o sentido de humor em palco

Quem só conheceu Salvador Sobral no momento em que ele subiu este ano ao palco do Festival da Canção, talvez não saiba que, antes disso, já tinha lançado um disco, Excuse Me, e que já deu concertos pelo país todo a apresentar as suas músicas. Gosta de tocar trompete com as mãos (e sem instrumento), como já mostrou em alguns vídeos, e quem já está habituado a andar com ele na estrada, como o pianista e amigo Júlio Resende, destaca o sentido de humor que o caracteriza e que foi visível de cada vez que foi filmado fora de palco na Eurovisão: “Houve um concerto em que acabámos de tocar uma música chamada ‘Nem Eu’, fez-se um silêncio religioso e, no fim de muitos aplausos, o Salvador disse – ‘Uau, que silêncio incrível, ainda bem que ninguém deu um traque’.” É um bom exemplo.

Irmãos musicais, inseparáveis – mas muito diferentes

A irmã, Luísa Sobral, toda a gente conhece: não só compôs a música para o irmão, como já tem uma carreira musical firmada – passou pelo mesmo concurso, o Ídolos, em 2003, estudou música nos EUA e já tem quatro álbuns editados, entre os quais The Cherry On My Cake e Luísa. E apesar de serem muito diferentes, como o próprio já deixou claro em algumas entrevistas, as ligações familiares são fundamentais no percurso de Salvador Sobral. Aliás, foi Luísa Sobral que o convenceu a tentar estudar música quando o irmão estava a pensar ficar a cantar em hotéis (além de o chamar de ‘buçolini’ quando o buço começou a crescer, o que dá a entender que o humor também é de família). E foram os pais que lhe encheram sempre a casa de música, incluindo em viagens de carros onde iam todos a cantar. Uma coisa de família, portanto, e já sabe como a família é a coisa mais bonita que temos.

[Salvador e Luísa Sobral em palco, após a vitória no Festival RTP da Canção]

“Amar pelos Dois”, sim. Mas qual era a música que ficou de fora do festival?

“Amar pelos Dois” está aí para ficar, já tem versões em karaoke ou em heavy metal, já foi adaptada por benfiquistas em sofrimento e crianças espanholas e ucranianas. Aliás, recordemos: Salvador Sobral já disse que não se importaria de a incluir num disco seu, tal não é o grau de identificação que sente com a canção escrita e composta pela irmã. Aliás, Luísa Sobral ligou ao irmão logo depois de ter recebido o convite da RTP para ser uma das compositoras do novo formato do Festival da Canção, ainda sem a música feita. Depois demorou um bocado a apresentar o formato final, que surgiu muito perto da data das gravações, e vinha com uma outra alternativa, supostamente algo mais inspirado nas participações festivaleiras dos anos 60. Vingou a música que agora toda a gente conhece — resta saber se alguma vez se terá acesso à hipótese que ficou pelo caminho. A história está feita mas a curiosidade tem destas coisas.

Já há data para o próximo disco. E vai ser em português

No primeiro disco já referido de Salvador Sobral, Excuse Me, a maioria das canções foram compostas em inglês (embora também haja uma em português e duas em espanhol, língua em que o músico se sente muito confortável). E se ainda não se sabe que outros passos pode agora Salvador Sobral dar, a verdade é que, mesmo antes do efeito Eurovisão, já estava a compor o próximo disco: está prometido para 2018, e desta vez vai mesmo ser em português. Com mais atenção do mundo em geral, prevê-se, mas nada que deva alterar os planos do cantor para o regresso ao estúdio.

[“Excuse Me” canção do álbum com mesmo nome, editado no ano passado]

Salvador chega a Portugal este domingo

É um hábito: receber com carinho e de forma calorosa quem representa bem o país. Ora Salvador Sobral inscreve-se nesta categoria com distinção. Vai daí, o aeroporto de Lisboa é o sítio certo para estar este domingo. Sim, é verdade. Salvador Sobral é o nosso homem da Eurovisão que chegou lá sem nunca ter visto nenhuma edição do concurso. Mas chegou. Agora, concentremo-nos no essencial: Salvador chega às 15h, assim confirmou a RTP em comunicado, assim será se tudo correr bem com o tráfego aéreo e com outras questões técnicas do mesmo campeonato.