Enquanto exploravam a gruta subaquática de Cova de sa Piqueta, em Maiorca, Xisco e Guillem, mergulhadores há mais de vinte anos, sofreram um acidente no interior e viram-se encurralados.

Só um poderia sair – ou tentar sair –, procurar a superfície e pedir o resgate. As garrafas de ar-comprimido não chegariam para ambos. Guillem, mais esguio do que Xisco para procurar uma saída alternativa por entre galerias estreitas e turvas, foi o escolhido. Xisco esperaria. E esperaria. Sem luz, sem o que comer – e pouca ou nenhuma água doce no interior da galeria –, sem dormir. Horas a fio, dias a fio.

Sofreu alucinações, tentou lutar contra a hipotermia, temeu que Guillem nunca chegasse à saída e que ambos morressem em Cova de sa Piqueta, a novecentos metros da superfície. Acabaria resgatado após intermináveis horas de espera e sobrevivência. A história, escreve-a Xisco, na primeiríssima pessoa, nas páginas do El País.

Não sei há quantas horas estou fechado nesta gruta. Talvez há dias. Não tenho quaisquer referências temporais. Eu e o Guillem calculámos que o resgate chegaria dentro de seis horas. Mas foram já tantas as vezes que me levantei para urinar que certamente já passaram mais. E se o Guillem não conseguiu chegar à superfície? E se ficou sem ar?” começa por recordar o mergulhador, entre interrogações.

Xisco confessava sentir-se num “pesadelo”, mas mantinha a esperança, por mais ínfima que fosse, que “despertaria a qualquer momento”. Tardou a despertar.

“O que nos aconteceu foi um cúmulo de desgraças”, conta. E prossegue: “Durante a manhã estive a explorar umas galerias e a recolher amostras de rochas. O Guillem foi recolher informação topográfica noutra galeria. Depois, e enquanto regressávamos à superfície, passámos ao mesmo tempo por uma galeria estreita. Os sedimentos nas rochas soltaram-se e perdemos toda a visibilidade. A água ficou quase cor de chocolate. Ao perder a visibilidade, seguimos o fio-guia, que nos levaria até à saída. Mas tropeçamos numa rocha, o fio escorregou-nos das mãos e soltou-se. Ficamos mais de uma hora às cegas, à procura do fio, sem êxito.”

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Guillem procuraria a saída e Xisco aguardaria. “Fiquei numa cavidade com oitenta metros de largura e vinte de altura. Só me erguia para urinar. Bebi água de uma área da cavidade onde esta era mais doce. Tentei evitar a hipotermia. Custava-me a respirar por causa do dióxido de carbono. Tive alucinações”, explica.

Tanto tempo à espera, fê-lo ponderar. Tudo. “Com a morte tão certa, pensas em coisas em que habitualmente não pensas. Se me safar desta, vou tentar fazer as coisas melhor. Quero desfrutar mais das pequenas coisas e não me enredar em problemas absurdos. Tenho dois filhos, de nove e quinze anos. Eles não merecem um final como este.”

Depois, escutou ruídos. “Não pode ser outra alucinação. ‘Olá?… Bernat? És tu? Graças a Deus! Obrigado!” O resgate, por fim, havia chegado. Desde que Guillem procurou ajuda, às 17h30 de 15 de abril, até que Xisco foi resgatado e chegou à superfice, na madrugada de 18 de abril, passaram-se sessenta horas.