As alforrecas estão a aparecer junto à costa em alturas do ano e em regiões onde antes não eram vistas, o que pode resultar das mudanças climáticas, levando os cientistas a pedir ajuda aos portugueses para conhecer a situação.

O programa GelAvista, que reúne informação sobre os organismos gelatinosos, ou alforrecas, arrancou em fevereiro de 2016, “quando começaram a aparecer na costa portuguesa, no inverno, estas espécies, nomeadamente a caravela portuguesa (‘physalia physalis’), que deveria ocorrer mais no verão, dada a temperatura da água”, disse hoje à agência Lusa a coordenadora do projeto.

“Não tínhamos registo de elas [as caravelas portuguesas] aparecerem no inverno”, referiu Antonina dos Santos.

No inverno de 2016, particularmente ameno, o Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA) recebeu vários contactos de cidadãos a tentarem confirmar se eram realmente caravelas portuguesas que estavam a ser observadas nas praias e se isso era normal.

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Analisadas as fotos recebidas, os especialistas confirmaram tratar-se daquele organismo, relatou a investigadora do IPMA.

No caso da alforreca ‘velella velella’, os dados disponíveis permitem perceber que a espécie começa a aparecer no meio do outono, permanecendo até maio, mas, advertiu Antonina dos Santos, “isso só pode ser dito com propriedade, com vários anos de registos”.

“Este tipo de organismos gelatinosos são muito mais abundantes que o que parecia à primeira vista” e as espécies alvo ocorrem todo o ano e em áreas mais amplas da costa, adiantou.

Como não havia recolha de informação, parecia tratar-se de casos ocasionais, que apareceriam no verão, detetados quando as pessoas eram picadas.

Na costa norte e na costa alentejana, são menos as ocorrências registadas. Há mais observações na Grande Lisboa – de Peniche, até Setúbal -, e no Algarve, onde há mais pessoas na praia, e a caravela portuguesa é a mais avistada.

Alguns organismos gelatinosos “estão muito dependentes das alterações climáticas e dos movimentos e do aquecimento da água do mar e da mudança das direções das massas de água nos oceanos”, explicou Antonina dos Santos.

Em Portugal, recordou, ocorrem oito tipos, alguns mais famosos, como a caravela portuguesa ou a ‘velella velella’, que tem uma vela azulada e “é a mais comum das chamadas alforrecas”.

A monitorização dessas espécies ao longo da costa, por cientistas, “implicaria grandes quantidades de financiamento”, por isso, a importância do GelAvista, iniciativa de ciência cidadã.

Os cidadãos transmitem aos investigadores informação sobre a ocorrência dos organismos gelatinosos ao longo da costa, e também podem enviar amostras, dados depois tratados “do ponto de vista científico” e relacionados com a temperatura da água, os ventos e as correntes marítimas.

A adesão do público tem sido positiva e já são 115 os observadores registados, com 428 avistamentos, e “todos os dias há relatos”, explicou a coordenadora.

Apesar de não abranger as regiões autónomas, o programa recebe informação de avistamentos e, dado o interesse que suscitou, vai ser alargado à Madeira, a partir do verão.

Os cientistas procuram a colaboração de mais observadores, como os nadadores salvadores, que possam juntar-se aos praticantes de surf, por exemplo.

Também está previsto o desenvolvimento de uma aplicação para telemóveis para facilitar o envio da observação.

Antonina dos Santos explicou que os organismos mais pequenos não provocam queimaduras, como pode acontecer com as grandes medusas, que “provocam reações graves nos humanos em consequência das [suas] células urticantes”.

Em geral, “nunca se deve tocar nos tentáculos porque é ai que estão as células urticantes, ativas mesmo quando os organismos estão mortos. Se [for] necessário tocar na campânula e se for picado tem de aplicar gelo ou bicarbonato de sódio”, aconselhou, mas, se for grave, deve ser consultado o médico.

Para a caravela portuguesa, o procedimento é diferente e as pessoas atingidas devem colocar água quente e vinagre.