A agência Moody’s deu esta quarta-feira, 24 de maio de 2017, o primeiro corte de rating sofrido pela China desde 1989, o ano da crise política chinesa e os protestos de Tianamen. Numa notícia que arrisca passar relativamente despercebida mas que pode ter implicações importantes, a agência de rating norte-americana baixou a notação de crédito da China, fazendo cair as bolsas e causando a ira do Governo chinês, que considera a decisão “absolutamente infundada”.

A capacidade da China de adaptar a economia e evitar uma crise da dívida é uma das grandes questões para a economia mundial, não apenas neste momento mas há vários anos. A maior parte da dívida pública chinesa é detida por investidores domésticos, portanto não deverá haver consequências significativas deste corte de rating, no imediato, para os custos de financiamento do Estado chinês ou para a sua capacidade de atrair investidores estrangeiros. Contudo, “este é um golpe psicológico que o Governo chinês não recebe com agrado e que demonstra claramente as pressões financeiras, que estão a subir”, afirma Christopher Balding, professor de uma universidade em Shenzhen, citado pela Bloomberg.

O rating desceu de Aa3 para A1, na escala de classificações da agência norte-americana. A principal preocupação da Moody’s está ligada ao “aumento significativo” da dívida em toda a economia (público e privado) e o abrandamento das taxas de crescimento, que podem causar perdas às finanças públicas e desequilibrar o sistema financeiro chinês. A dívida pública e privada na China estava em 260% do PIB no final de 2016, contra os 160% que havia em 2008, segundo os dados oficiais (que não têm em conta parte do endividamento na banca paralela (shadow banking).

Desde 1989 que a China não sofria um corte de rating, o ano da crise política chinesa e os protestos de Tianamen. Desde então, com a globalização e o crescimento das exportações chinesas, o país teve ao longo de vários anos taxas de crescimento superiores a 10% ao ano, mas esses números fazem, agora, parte do passado. O Governo tem conseguido manter o crescimento entre 6% e 7%, mas muitos economistas duvidam do realismo destes números e baseiam-se em dados como o consumo de eletricidade para advogar que o crescimento na China é, na realidade, bem menor.

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Argumentos são “absolutamente infundados”

O Governo reagiu com ira ao corte de rating, considerando que os argumentos usados pela Moody’s são “absolutamente infundados”, o que não evitou que as ações chinesas tenham caído para mínimos de sete meses e também a moeda do país se tenha desvalorizado. As praças europeias também abriram com perdas, ainda que ligeiras. As ações das empresas mineiras, nas bolsas europeias, estão entre as mais penalizadas.

No verão de 2015, as autoridades chinesas viram-se, claramente, em apuros e decidiram intervir no mercado cambial para desvalorizar o renminbi e travar a quebra da economia. Os receios acabaram por aliviar, mas a turbulência deixou marcas por ter demonstrado que é real o risco de uma aterragem brusca da economia chinesa.

Há um reconhecimento generalizado da desaceleração secular no crescimento chinês, com os estímulos económicos pós-Lehman a deixarem o país com um excesso de capacidade na indústria e no imobiliário. O caminho da China, após as taxas de crescimento de 10% no passado, para um qualquer novo equilíbrio, será, certamente, cheio de solavancos” (afirmou o Credit Suisse, numa nota de investimento de 2016)

Têm sido muito debatidos e escrutinados os riscos da transformação que o governo chinês quer fazer na economia chinesa, reduzindo a importância relativa das exportações e estimulando a procura interna de uma classe média em expansão. É, também, fácil de compreender o impacto económico inicial de uma luta contra a corrupção que, num cenário otimista, poderá tornar a economia chinesa mais sustentável a prazo. Ainda assim, também se compreende que o resto do mundo irá ficar nervoso se vir que o crescimento no motor chinês ficar muito longe dos 7% pretendidos. E, falamos, claro dos dados oficiais do governo chinês, que muitos economistas dizem ser imensamente lisonjeiros para o que se passa realmente na economia.