Todos os dirigentes intermédios da Câmara Municipal de Lisboa — são 135 — estão em funções há anos sem que alguma vez tenha sido aberto um concurso para os lugares que ocupam, como manda a lei. O problema arrasta-se desde a gestão camarária de António Costa e Fernando Medina não o resolveu. Há um ano, o presidente da autarquia foi confrontado com um estudo do PSD que apontava a existência de 148 dirigentes nestas condições. Medina garantia então que os concursos estavam a ser preparados, mas 15 meses depois a situação mantém-se exatamente igual. “A Câmara Municipal de Lisboa (CML) está a infringir a lei há vários anos“, acusou o vereador social-democrata António Prôa, na reunião de câmara que decorreu esta quarta-feira.

São dirigentes da câmara de Lisboa que estão em funções sem que alguma vez tenham precisado de apresentar-se a concurso para disputar com outros candidatos os lugares de direção intermédia que ocupam na autarquia. Até porque os concursos nunca existiram. São chefes de divisão e diretores de departamento como é o caso da socialista Susana Ramos, diretora do Departamento de Desenvolvimento Social, mas também mulher do agora vice-presidente Duarte Cordeiro (no entanto foi nomeada em substituição para aquele cargo antes de o marido ser vereador).

Na reunião de câmara desta quarta-feira, o PSD, que há um ano já tinha apresentado um relatório em que denunciava estas irregularidades, voltou ao tema.

Sejamos claros, a Câmara Municipal de Lisboa (CML) está a infringir a lei há vários anos, viola a lei não cumprindo a necessidade de abertura de concurso” para a colocação de dirigentes nos tais 135 lugares, acusou o vereador do PSD, António Prôa.

Numa reedição (de 30 de maio) do estudo sobre a situação destes dirigentes, a que o Observador teve acesso, o PSD refere que, “pese embora já terem decorrido cerca de dois anos sobre a aprovação da nova estrutura orgânica dos serviços municipais da câmara municipal de Lisboa”, os 135 dirigentes intermédios continuam “em regime de substituição sem que o município de Lisboa tenha procedido à abertura de qualquer procedimento concursal, ao arrepio dos princípios legais constantes do diploma legal sobre o estatuto do pessoal dirigente para as câmaras municipais”.

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O Estatuto do Pessoal Dirigente das Câmaras Municipais (lei 49/2012) veio clarificar as condições em que são feitas estas colocações: os dirigentes intermédios “são recrutados por procedimento concursal”, refere o diploma, onde se prevê que o regime de substituição se esgote quando o titular do cargo volte às funções “ou passados 90 dias sobre a vacatura do lugar”. Exceção: que haja um concurso a decorrer para o lugar em questão.

PSD admite apresentar queixa

Fernando Medina não esteve na sessão desta quarta-feira — o presidente da CML está na Alemanha para tentar a eleição de Lisboa como a “capital verde da Europa 2019”. Ainda assim, o tema não é novo para o socialista. Já em fevereiro de 2016, estava Medina há quase um ano aos comandos da autarquia, a revista Sábado dava conta de que havia 148 dirigentes da câmara em situação irregular (a diferença entre os dois valores, 148 e 135, decorre da alteração orgânica que acabou com 13 dos lugares de direção intermédia escolhidos por concurso e que passaram a ser nomeados).

E o presidente da autarquia mostrava estar por dentro do processo. “Todos os atuais dirigentes da CML estão em regime de substituição, na sequência da entrada em vigor da última reestruturação orgânica, em Junho de 2015, que determina a cessação das anteriores nomeações”, justificava nesse momento, em resposta às questões da revista.

A explicação apresentada por Medina omitia, no entanto, um dado: é que os dirigentes em causa estavam, não há um, mas pelo menos há quatro anos em funções, desde o tempo de António Costa, sem que lei fosse cumprida, renovando uma e outra vez o estatuto de substitutos sempre que era aprovada uma nova orgânica da câmara. Quatro anos de irregularidades — ilegalidades, garante o PSD –, assumindo como ponto de partida a lei de 2012, que veio deixar clara a obrigação de incluir as autarquias locais no regime de colocação dos dirigentes intermédios que já era aplicado à administração pública. “Existe uma lei desde 2004, que alguns poderiam pôr em dúvida se se aplicaria diretamente à administração local”, concedeu António Prôa na intervenção feita na sessão de câmara desta quarta-feira. A questão é que, “após esse diploma, a lei 49/2012 – essa, sem margem para dúvidas – aprova o Estatuto do Pessoal Dirigente das câmaras municipais que determina que todos estes dirigentes devem ser designados através de concurso”, concretizou o vereador social-democrata.

Quando foi questionado sobre esta situação, o presidente da CML ainda garantiu que a solução estava a caminho. “A nomeação em regime de comissão de serviço envolve a abertura de concurso para todos os cargos dirigentes que ascende a cerca de 160, em fase de planeamento”. O Observador tentou contactar Fernando Medina e o vice-presidente Duarte Cordeiro, mas não obteve resposta até à hora de publicação deste artigo.

Depois de confrontar por duas vezes o vice-presidente Duarte Cordeiro, na sessão de câmara desta quarta-feira, o PSD continuava sem obter esclarecimentos. “Face à ausência de qualquer resposta, ponderamos avançar com uma participação junto da Direção-Geral da Administração Local e outra junto da Inspeção-Geral de Finanças”, admite António Prôa ao Observador, consciente da ausência de efeito prático de uma queixa. A lei não prevê qualquer sanção para os casos de incumprimento desta legislação.