Os bancos tendem a relaxar as condições na concessão de crédito quando a economia se encontra na fase ascendente do ciclo, como sucede atualmente em Portugal, e é nestas fases de aceleração do crescimento que se criam as condições para a crise seguinte. Esta é a análise dos técnicos do Banco de Portugal que, no relatório semestral de junho de 2017 sobre a estabilidade financeira, divulgado nesta terça-feira, identificam este como um dos riscos que pendem sobre a banca que opera no mercado nacional.

A recuperação da economia, a subida dos preços do imobiliário residencial, que o Banco de Portugal considera estarem “de acordo com o justificado pelos fundamentos”, e a pressão da concorrência geram oportunidades e têm permitido a melhoria no setor financeiro que é sublinhada pelo banco central, mas estes fatores podem levar os bancos a incorrer em novos riscos. A exposição da banca ao setor imobiliário tem diminuído, o que é visto como positivo pelo Banco de Portugal, mas o seu peso sobre o total dos ativos das instituições financeiras cresceu em 2016, já que a redução dos balanços dos bancos se registou a um ritmo mais acelerado.

“Num cenário de aumento das taxas de juro”, assinalam os técnicos do Banco de Portugal, a qualidade do crédito das instituições financeiras “poderá ser negativamente afetada”, efeito que será mais acentuado no caso de o ritmo de crescimento no país não acompanhar aquele que se fizer sentir na zona euro. Uma subida do preço do dinheiro é um cenário admitido como possível em consequência de uma “normalização” da política monetária nos Estados Unidos, com alterações nas taxa de juro de referência.

À “concentração” de crédito no risco do setor imobiliário, soma-se uma exposição “elevada” à dívida pública, num contexto em que o Banco de Portugal considera que “a natureza dos riscos para a estabilidade financeira praticamente não se alterou” em comparação com análise feita em novembro de 2016. “É essencial persistir na redução sustentada da dívida pública”, avisa o banco central, através de uma “trajetória de consolidação orçamental”, já que “subsiste uma forte interligação” entre o sistema financeiro e o soberano doméstico.

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O banco central assinala, como evolução positiva, a “desalavancagem” que se tem registado nos bancos, nas empresas e nas famílias, com a redução do peso dos compromissos assumidos nos respetivos rendimentos. Esta constatação, em que o Banco de Portugal sublinha, desde 2010, uma descida de 21 pontos percentuais no valor dívida de particulares em percentagem do rendimento disponível, não impede a renovação de um alerta.

“O elevado endividamento do setor público e do privado e o baixo crescimento potencial” da economia portuguesa “continuam a colocar riscos para a estabilidade financeira”. No caso dos particulares, a dívida ainda representava, no final de 2016, 11o% do rendimento. Quanto ao setor privado não financeiro, o banco central sublinha que continua a suportar compromissos com crédito elevados no quadro da zona euro.

A rendibilidade dos bancos mantém-se “fraca” e o nível ainda elevado do crédito malparado são constrangimentos no acesso a financiamento nos mercados internacionais, refere o relatório sobre a estabilidade financeira, e aqueles fatores “tendem a agravar” a perceção dos investidores acerca da qualidade dos ativos das instituições financeiras.

A esta situação acrescenta-se o ambiente de baixas taxas de juro, por vezes negativas, que travam eventuais progressos na rendibilidade das instituições financeiras, num quadro de “relevância”, nas carteiras de crédito dos bancos, de empréstimos concedidos com “spreads” reduzidos e maturidades longas, nomeadamente no financiamento às famílias para a aquisição de habitação.