O consumo excessivo de álcool é um inimigo da saúde de qualquer pessoa. É responsável por 3,3 milhões de mortes anuais e está na origem de mais de 200 doenças, tais como o cancro, a cirrose hepática e a demência, de acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS). Mas, agora sabe-se que não é só a ingestão em demasia que provoca problemas, também o consumo moderado pode ser prejudicial para a saúde.

Um estudo publicado no British Medical Jornal, um jornal britânico especializado em medicina, feito por investigadores da Universidade de Oxford e da Universidade de Londres, descreveu o desempenho cognitivo e o consumo de álcool de 550 homens e mulheres, com mais de 30 anos, desde de 1985. No final do estudo, os participantes realizaram uma ressonância magnética ao cérebro, onde se analisou a estrutura da matéria-branca e o estado do hipocampo, área associada à memória.

Segundo a investigação, a ingestão moderada de álcool afeta negativamente o cérebro, tanto em termos de estrutura como de função cerebral.

Sabíamos que beber muito durante períodos longos de tempo era prejudicial para saúde do cérebro, mas não tínhamos a noção do impacto que teriam estes níveis”, declarou Anya Topiwala, professora clínica de psiquiatria de velhice da Universidade de Oxford e co-autora deste estudo.

Os participantes refletiram diferentes níveis de consumo, mas nenhum deles foi considerado dependente de álcool.

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Depois de se ter tido em conta uma série de fatores como a idade, o sexo, a atividade social e a educação, a equipa descobriu que os indivíduos que refletiram níveis de consumo mais elevados foram aqueles cujo hipocampo estava mais “encolhido”, com maiores efeitos no lado direito do cérebro.

A estrutura de matéria-branca também se modificou consoante a quantidade de álcool que os participantes ingeriram. “As grandes fibras do cérebro são como fios elétricos e o isolamento, nesses fios, era de qualidade mais pobre em indivíduos que bebiam mais“, disse Topiwala.

Além disto, os que bebiam mais tinham piores capacidades lexicais. As pessoas que bebiam entre sete e 14 unidades (copos) por semana apresentaram uma redução de 14% no seu desempenho, ao longo dos 30 anos de estudo, em comparação com os indivíduos que não bebiam mais que uma ou duas unidades por semana.

Os peritos dividem-se

Elizabeth Coulthard, consultora sénior em neurologia de demência na Universidade de Bistol, descreveu a pesquisa como um estudo meramente observacional, não provando que o álcool provoca danos cerebrais. Adicionando a isto, o facto da maioria dos participantes serem homens e os relatórios de consumo serem imprecisos e poderem exagerar nos efeitos que o consumo moderado de álcool pode causar.

Por outro lado, Dr. Doug Brown, diretor de pesquisa e desenvolvimento da Alzheimer’s Society, afirmou que a pesquisa enfatizava a necessidades dos indivíduos se tornarem abstinentes, em vez de realçar a necessidades destes seguirem diretrizes impostas no ano passado.

Em 2016, o Departamento de Saúde introduziu novas diretrizes para o consumo de álcool no Reino Unido, recomendando que os homens e mulheres não bebam mais de 14 unidades de álcool por semana — o que equivale a cerca de seis canecas de cerveja.

Embora esta pesquisa dê uma visão útil sobre os efeitos que o álcool pode ter no cérebro, a longo prazo, não mostra que a ingestão moderada de álcool provoca declínio cognitivo. Contudo, as descobertas contradizem uma crença comum de que um copo de vinho ou champagne por dia podem proteger o cérebro”, disse Brown.

José Manuel Moltó, membro da Sociedade Espanhola de Neurologia (SEN), os resultados deste estudo “são de valor inestimável”, apesar das limitações significativas de quem “não teve em conta o tipo de álcool que consumiu e o padrão de consumo”.

Parece claro que as consequências de tomar um copo de vinho por dia não são as mesmas para quem bebe sete. O estudo avaliou o consumo semanal, sem ter em conta estas nuances”, ressalvou Moltó.

Para José Moltó, é de conhecimento geral que “beber muito afeta a memória, linguagem e provoca lesões no corpo caloso, que é a estrutura que, basicamente, permite a comunicação entre os dois lados do cérebro“. O especialista adverte ainda que este tipo de danos são irreversíveis.