Podia ter sido um golo, um remate, uma finta. Dava para puxar por qualquer lado. Mas foi naquele último minuto, mesmo antes de entrarmos nos descontos, que uma imagem resumiu o jogo, o mês, a época, o ano. Uma criança conseguiu fintar os seguranças e correu como se não houvesse amanhã para abraçar Ronaldo. Laizans, o defesa que já nem podia ver à frente o avançado, olhou, encolheu os ombros e riu-se. E Cristiano, que estava já numa certa descompressão após mais um jogo bem conseguido, brincou com o miúdo, tirou-lhe o boné, colocou-o de novo mas com a pala virada ao contrário (como também ele usa). Ele é português e está no topo do Mundo. Desta vez, foi a Letónia que caiu aos seus pés. Mas podia ser qualquer equipa porque está imparável.

Ficha de jogo

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Letónia-Portugal, 0-3

6.ª jornada do grupo B da fase de qualificação para o Mundial 2018

Skonto Stadium, em Riga (Letónia)

Árbitro: Istvan Kovacs (Roménia)

Letónia: Vanins; Jagodinskis, Kolesovs, Gorkšs, Maksimenko; Laizans, Kazacoks (Vardanjans, 72′), Kluškins (Indrans, 62′), Solovjovs; Šabala e Ikaunieks (Rakels, 68′)

Treinador: Aleksandrs Starkovs

Portugal: Rui Patrício; Cédric (Nélson Semedo, 71′), Bruno Alves, José Fonte, Raphäel Guerreiro; William Carvalho, João Moutinho, André Gomes; Gelson Martins (Quaresma, 58′), Cristiano Ronaldo e André Silva (Nani, 80′)

Treinador: Fernando Santos

Golos: Cristiano Ronaldo (41′ e 63′) e André Silva (67′)

Ação disciplinar: cartão amarelo a Kluskins (39′), Gelson Martins (55′), Laizans (75′) e Quaresma (90+3′)

A história do triunfo da Seleção por 3-0 resume-se praticamente ao duelo travado entre Ronaldo e Vanins, o veterano guarda-redes de 37 anos do Zurique que sofreu dois golos do jogador do Real Madrid mas saiu como herói por ter evitado mais quatro. E resume-se porque, até ao momento em que o capitão conseguiu agarrar na bola na esquerda, fletir para o meio e rematar forte para a primeira grande intervenção do guarda-redes contrário (24′), o jogo estava mauzinho, mauzinho. Tão mauzinho que os visitados conseguiram mesmo equilibrar o que se passava em campo.

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Starkovs, uma espécie de herói nacional depois de ter apurado a Letónia para o Europeu de 2004, em Portugal, fazia o primeiro encontro após o regresso ao comando da seleção. E conseguiu surpreender, utilizando três centrais e colocando as peças no meio-campo com alguma capacidade de saída com bola (mesmo sem criar qualquer perigo). Ronaldo avisou aos 24′, voltou a avisar aos 37′ (mais uma grande intervenção de Vanins, desta feita puxado ao ângulo inferior) mas não deu hipóteses aos 41′. Ali, o difícil mesmo era falhar: cruzamento de André Gomes da esquerda, remate de José Fonte ao poste e Cristiano, sozinho, na pequena área, cabeceou para o 1-0.

Foi dos golos mais fáceis que marcou entre os 601 que leva na carreira (que passariam a 602), entre Seleção, Sporting, Manchester United e Real Madrid. Mas foi fácil porque adivinha onde a bola vai cair. E não é que ela vai sempre cair ali, onde ele está?

Após o intervalo, Portugal melhorou. Não foi uma grande, grande exibição, mas foi muito mais assertiva do que no primeiro tempo. A equipa passou a circular mais rápido, com mais critério. Conseguiu pressionar mais alto, com mais recuperações. E os dois golos em quatro minutos acabaram por completo com a história do encontro.

Aos 63′, numa jogada entre Cédric e Quaresma (que tinha entrado para o lugar de Gelson), o cruzamento do extremo saiu prensado num defesa contrário, ganhou altura e, mais uma vez, foi parar à cabeça do suspeito do costume. Até pode mudar o penteado, mas a bola não se perde. E mais uma vez de cabeça e na pequena área, encostou para o 2-0.

Depois, aos 67′, André Silva conseguiu recuperar uma bola em terrenos muito adiantados, William jogou rápido para Ronaldo, o capitão assistiu bem e o jovem avançado só teve de escolher o lado para marcar o seu sétimo golo em oito jogos na Seleção Nacional (melhor só mesmo o mítico Travassos, o Zé da Europa).

A partir daí, a única nota foi mesmo o duelo entre Cristiano e Vanins que continuou, agora com vantagem para o guardião. Ao todo, foram sete remates enquadrados em nove tentados, quase todos os dribles conseguidos, dois golos, uma assistência. Até que aquela criança entrou a correr pelo meio do relvado como se não houvesse amanhã para abraçar Ronaldo. Laizans, o defesa que já nem podia ver à frente o avançado, olhou, encolheu os ombros e riu-se. Ele é português e está no topo do Mundo. Essa imagem valeu mais do que mil palavras.

E sabe como acabou o encontro, já depois do apito final? A seleção da Letónia foi agradecer aos adeptos, houve aplausos dos dois lados, e mais algumas crianças tentaram entrar em campo para abraçar Ronaldo quando este já se deslocava para o túnel de acesso aos balneários. Disso, não houve imagens. Mas, palavras para quê?