O presidente da Câmara do Porto quer criar uma empresa municipal para gerir a Cultura da cidade já no início de 2018, após as eleições autárquicas. O assunto foi discutido esta terça-feira, em reunião de Câmara, e aprovado pela maioria dos vereadores. PS, CDU e um dos vereadores do PSD não estão de acordo e votaram contra.

A nova empresa deverá ficar com a gestão do Rivoli Teatro Municipal, do Teatro do Campo Alegre, da Galeria Municipal do Porto, do regressado Cinema Batalha e do Teatro Sá da Bandeira, que a autarquia acaba de adquirir através do direito de preferência, e que Rui Moreira quer que se mantenha com uma programação comercial. “Não estamos a falar necessariamente do La Féria mas de companhias de teatro que querem vir ao Porto, que têm atividade comercial e que através de um empresa municipal — através da Câmara não é possível — podem fazer connosco um acordo, por exemplo em termos de bilhética”, adiantou aos jornalistas.

Por lei, a Câmara apenas pode alugar salas, não pode partilhar receitas. Essa é uma das vantagens que Rui Moreira vê na criação de uma empresa municipal, para além do fortalecimento da procura por financiamento, quer de dinheiros públicos, quer de mecenato. A outra vantagem será o crescimento programático, por exemplo da Galeria Municipal, do programa Cultura em Expansão e do festival Dias Da Dança, “todos eles no limite da capacidade de gestão”, disse o presidente.

Ricardo Almeida, vereador eleito pela coligação Porto Forte (PSD/PPM/MPT) concordou com as vantagens de a Cultura ser gerida por uma empresa municipal, mas considera que esta “já existe”, referindo-se à Porto Lazer, a empresa municipal que gere o desporto, o lazer e a animação ao ar livre da cidade. “Tal como a EGEAC tem em Lisboa”, comparou.

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De acordo com um estudo encomendado pela Câmara à consultora BDO, a nova empresa municipal precisaria de 136 pessoas para funcionar. Só para marketing e comunicação está prevista a contratação de sete pessoas. “Estamos a criar uma super estrutura, com direção de recursos humanos, direção financeira, administração, uma série de serviços que já existem na Porto Lazer. Seria muito mais simples retirar à Porto Lazer algumas competências e acrescentar-lhes estas”, defendeu Ricardo Almeida. No entanto, o estudo, a que o Observador teve acesso, refere que “os colaboradores da Empresa Municipal sejam na sua grande maioria transferidos da atual estrutura de pessoal da CMP“, o que implicaria menos contratações.

Rui Moreira explicou que não é possível dotar a Porto Lazer da componente cultural, devido à alteração da lei 50/2012 feita e 2016 pelo Governo socialista. “Não podemos agilizar esta passagem de competências para empresas que por objeto social não se dedicam à Cultura”, disse, acrescentando que Desporto, Lazer e Animação é diferente de Cultura. “Percebo que foi a visão anterior, e é legítima. A Cultura era considerada como alguma coisa que fazia parte do Lazer e quase não era preciso identificá-la”, disse, fazendo lembrar a pouca aposta do Executivo de Rui Rio na Cultura. “Mas a nossa política foi diferente. Há aqui uma questão de dimensão política”, concluiu.

De acordo com os estatutos da Porto Lazer, o objeto social é o de prestar serviço público “no domínio da atividade física e desportiva”, e inclui também nesse objeto o lazer e “outras atividades de animação da cidade”. O objetivo número 2 é “assegurar a programação e gestão geral dos espaços e equipamentos que, a cada momento, lhe estejam afetos“.

É este ponto que, para a vereadora socialista Carla Miranda, permite integrar a gestão cultural na Porto Lazer, evitando-se a criação de mais uma empresa municipal que irá consumir recursos. “A EGEAC funciona de forma exemplar na dinamização da programação cultural, atividades de rua e gestão de equipamentos municipais“, afirmou. “Existe a necessidade de criar uma estrutura que duplica custos de gestão?”

Para Rui Moreira, não se trata de uma opção. “A eventual integração na Porto Lazer tornaria inaplicável o regime de excepção. A não ser que tirássemos a atividade desportiva da Porto Lazer.” Como isso não deverá acontecer, ao manter o desporto como atividade principal, correr-se-ia o risco de “o Desporto tutelar a Cultura”, acrescentou no final, aos jornalistas, Guilherme Blanc, adjunto do presidente na área da Cultura.

De acordo com a Lusa, o capital da empresa será de 650 mil euros — 400 mil euros em dinheiro, transferidos pelo município, e 250 mil euros em espécie, “constituídas pelos bens móveis afetos aos equipamentos culturais” considerados indispensáveis ao desenvolvimento da empresa municipal a criar.

Votação a menos de três meses das eleições

Outra das críticas da oposição foi o facto de a proposta estar a ser apresentada aos vereadores a menos de três meses das eleições autárquicas. “Estarmos a decidir a criação e uma empresa neste momento é uma questão sensível”, disse Manuel Pizarro, o candidato socialista à Câmara do Porto, por entender que condiciona o futuro Executivo. Embora tenha frisado que o PS não tem “nenhum problema em relação a empresas municipais”, considerou que a EGEAC une cultura e animação (mas não desporto), pelo que a Porto Lazer pode seguir o mesmo caminho. “Estamos de acordo que a gestão dos teatros municipais é melhor realizada no quadro de uma empresa.”

Pedro Carvalho, da CDU, frisou que deve haver debate eleitoral, em vez de se estar a aprovar já a criação da empresa municipal. Mas, ao contrário do PS e do PSD, não vê utilidade nas empresas municipais. “Existem outras hipóteses e outras dinâmicas.” No final do debate, a criação da empresa foi aprovada com o votos contra de Ricardo Almeida, Pedro Carvalho, Manuel Pizarro e de Luís Alves, até há bem pouco tempo Administrador Executivo da Porto Lazer. A vereadora Carla Miranda não estava na sala quando a proposta foi votada, mas o seu voto foi contra.

“Os socialistas criaram uma lei para salvaguardar a questão da Cultura nas empresas municipais, do PS. Mas aqui no Porto já não pode ser! Acho um pouco estranho, mas já percebi que há aqui uma Santa Aliança“, disse Rui Moreira aos jornalistas, sugerindo que o PS se está a aliar ao PSD na oposição eleitoral. O presidente garantiu que a aprovação da Porto Cultura permite abrir o debate público, e que o futuro Executivo pode reverter a decisão, se assim o entender. A proposta ainda terá de ser aprovada no próximo mês pela Assembleia Municipal.

Notícia corrigida no dia 6 de julho. De acordo com o estudo, a Porto Cultura precisará de 136 pessoas ao todo para funcionar, e não de 176.