Donald Trump jura que o seu genro, Jared Kushner, “é um bom rapaz”, acredita que tem “relacionamentos incríveis” com todos os grandes líderes mundiais, garante que nada tem a ver com a Rússia, apesar de aí ter organizado edições do concurso miss Universo, e confessa que uma das suas grandes preocupações com o Brexit é o que vai acontecer ao British Open (um dos mais importantes torneios de golfe do mundo), se a Escócia deixar o Reino Unido. Sim, estas são algumas das principais ideias retiradas do que já chamam uma “embaraçosa” entrevista do Presidente dos EUA ao Wall Street Journal.

O encontro de Trump com dois jornalistas e três editores (incluindo o diretor) do jornal norte-americano decorreu na Casa Branca, em Washington, durou 45 minutos e, no passado dia 25 de julho, o jornal publicou alguns excertos dessa conversa. A versão integral, contudo, começou a circular na redacção do Wall Street Journal, mas também nas equipas de outras publicações em Nova Iorque e Washington – e acabou por ser totalmente divulgada esta terça-feira pelo Politico.

Percebe-se agora a razão do “embaraço”. A entrevista terá passado ao lado de temas relevantes da atualidade, dá espaço a comentários controversos ou difíceis de enquadrar no atual contexto político — e ainda contou com a companhia inesperada de Ivanka, a filha mais velha de Donald Trump, que dizem ter aparecido na Sala Oval “apenas para dizer olá”. Mas a conversa terá ido para além um breve cumprimento.

Ivanka Trump tem surgido junto do pai em vários eventos oficiais. Durante a entrevista de Donald Trump ao Wall Street Journal também esteve na Sala Oval da Casa Branca, algo que os media norte-americanos dizem ser uma prática habitual.

O Politico conta que Ivanka e o diretor do Wall Street Journal terão estado a comentar uma festa em Southampton, organizada um mês antes por políticos, executivos e empresários dos media, onde os dois se tinham cruzado. “Gostei de a ver por lá”, terá dito Gerard Baker, numa conversa informal onde até falaram das suas duas filhas, que se chamam ambas Arabella. Trump e a filha terão também elogiado um editorial do diretor do Wall Street Journal — “você fez um um bom trabalho”, comentaram — depois de Baker ter justificado que não tem controlo sobre o que os colunistas do jornal escrevem. “Gostamos de cumprir a tradição de manter uma separação total entre notícias e opinião”, explicou.

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A “entrevista embaraçosa”, como lhe chama a New York Magazine e alguns comentadores, tem muito a ver com estas situações informais em plena Sala Oval, mas também por algumas declarações mais controversas do presidente norte-americano – além das que fez sobre o genro, a Rússia ou o futuro do golfe no pós-Brexit.

Entre várias revelações, Donald Trump anunciou nessa entrevista que vai agravar os impostos sobre os ricos e cortar as taxas na classe média. Primeiro, porque os contribuintes das classes mais baixas “têm sido lixados”, lamentou, e porque tem amigos ricos que lhe terão confidenciado “que não se importam de pagar mais impostos”. O problema é que a proposta formal que está a ser trabalhada neste momento contraria tudo isso. E, a menos que Trump tenha mudado de ideias, o que está previsto é um corte nas contribuições dos mais ricos.

Também sobre Anthony Scaramucci, que foi diretor de comunicação da Casa Branca até à última segunda-feira, Trump disse nessa altura estar “muito feliz” por contar com ele na equipa e confiar de que iria fazer “um trabalho fantástico”. Foi mais um tiro no pé: o homem que terá contribuído para a saída do também polémico Sean Spicer da equipa de comunicação foi demitido ao fim de dez dias no cargo, alegadamente por influência de John Kelly, o novo braço-direito do Presidente.

No campo da política externa — embora considere que já ninguém fala em “britânicos, já ninguém usa essa palavra” e de temer o fim do British Open se a Escócia deixar o Reino Unido — o presidente norte-americano acredita que vai conseguir um bom acordo comercial com o país e manter um bom relacionamento. Sobre outras nações, confessou o seu espanto quando contacta com” países como a Malásia ou a Indonésia” e descobre a numerosa população que aí vive: “é extraordinário”. E, a meio da conversa, também não evitou atropelar o seu próprio Secretário de Estado, Rex Tillerson, principal responsável pela diplomacia norte-americana e antecipar o que espera do Irão quando for revista a posição do país no acordo nuclear feito em 2015. “Se dependesse de mim, já o teria deixado de fora há 180 dias”, afirmou.

O Wall Street Journal contesta que tenham facilitado a vida a Donald Trump durante esta entrevista nas questões sobre a sua administração. “Decidimos publicar apenas os excertos da entrevista que nos pareceram relevantes. Não vimos qualquer razão para publicar conversas cruzadas que inevitavelmente acontecem em qualquer situação como esta”, justificou um porta-voz do jornal. A sua direção, contudo, já estaria prevenida para o risco de divulgação de tudo o que se passou na entrevista de 25 de julho. De acordo com o Politico, o diretor-adjunto do jornal, Matt Murray, terá avisado a equipa editorial que essa eventual fuga de informação seria encarada como uma quebra de confiança.

(atualizado com retificação sobre funções de John Kelly e Anthony Scaramucci na Administração Trump)