De um dia para o outro, tudo mudou. Há uma semana, Ángel Nieto sofreu um grave acidente quando conduzia um moto quatro e deu entrada no cuidados intensivos Policlínica Nuestra Señora del Rosario de Ibiza em estado grave. De terça para quarta-feira, renasceu a esperança: aos poucos, o antigo campeão do mundo estava a sair do coma induzido; no entanto, esta madrugada de quinta-feira sofreu um “edema cerebral massivo”, que levou mesmo a que os filhos, que estavam no Grande Prémio da Rep. Checa, regressassem ao país. Morreu hoje, aos 70 anos, conforme avançou o El Mundo citando fontes próximas do antigo piloto.

Nieto foi um dos maiores nomes de sempre do desporto espanhol. Nascido em Zamora, mudou-se com apenas um ano para Vallecas, em Madrid e, aos 13, começou a participar nas primeiras corridas de motas. No entanto, por vir de uma família humilde, não tinha a possibilidade de comprar uma mota de competição, pelo que decidiu arriscar e rumou a Barcelona, onde começou a trabalhar na Bultaco antes de passar uns meses pela Ducati e fixar-se na Derbi. O sonho estava prestes a realizar-se. E realizou os sonhos de muitos. Mas, como conta o ABC, chegou a passar fome e a dormir numa frutaria durante seis meses.

Assinou o primeiro contrato profissional pela Ducati em 1965, mas foi no regresso à Derbi que começou a destacar-se antes de passar ainda por Kreidler, Bultaco, Minarelli e Garelli. Em quase 20 anos de carreira, ganhou seis Campeonatos do Mundo em 50cc (1969, 1970, 1972, 1975, 1976 e 1977) e sete em 125cc (1971, 1972, 1979, 1981, 1982, 1983 e 1984). Um total de 13, que para ele foram sempre 12+1 – por ser supersticioso, assumia assim o número de Mundiais e utilizava a mesma fórmula nos autógrafos que dava.

Curiosamente, Ángel Nieto nunca se deu bem com as categorias de cilindrada mais elevada. Aliás, as experiências com os 250cc não correram mesmo nada bem e nunca ganhou nada de relevante nessas provas. Mas a verdade é que, entre 50cc, 80cc e 125cc, conseguiu um currículo impressionante de, além dos 12+1 títulos mundiais, para respeitar a sua marca, 90 vitórias em Grande Prémios e 23 Campeonatos de Espanha.

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É o terceiro piloto de sempre com mais vitórias em Grande Prémios, apenas superado por Giacomo Agostini (122) e Valentino Rossi (115), com quem teve um momento delicioso em 2008, no GP de França: foi dar os parabéns ao italiano por ter igualado o seu número de vitórias, montou a sua moto e fez a volta de consagração a conduzir enquanto Il Dottore abanava uma bandeira que dizia “90+90”.

Depois de terminar a carreira, Ángel Nieto ainda teve uma equipa com o nome “Team Ducados Ángel Nieto” mas o projeto não vingou e tornou-se a partir do final da década de 80 um dos maiores e mais consagrados comentadores de desportos motorizados. Até porque, nas pistas, o nome Nieto continuou a estar bem representado… apesar de ter sempre feito tudo para que nenhum familiar seguisse carreira no motociclismo.

O filho mais velho Ángel Nieto Jr., de 40 anos, andou pelo Campeonato do Mundo de 125cc sem grande sucesso, conseguindo como melhor posição o 15.º lugar em 2000. No ano seguinte, passou das motos para os carros, andando na World Series by Nissan e na Fórmula 3. Em 2008, fecha de vez a carreira e passa a diretor de uma nova equipa que começou por criar com o pai e o irmão mais novo, Pablo, que acabou esse Campeonato com a KTM na 21.ª posição. Ainda assim, o piloto de 37 anos conseguiu um trajeto melhor do que o irmão mais velho, com uma vitória, oito pódios e dois sextos lugares no Mundial de 125cc, entre Aprilia e Derbi.

Mas o legado Nieto não ficou circunscrito aos dois filhos porque também o sobrinho, Fonsi Nieto, hoje com 38 anos, foi uma das grandes figuras do Campeonato do Mundo de 250cc no início do século, tendo mesmo conseguido ser vice-campeão em 2002 com uma Aprilia, depois de ter ganho vários Campeonatos de Espanha com essa cilindrada.

Em 2005, Álvaro Fernández Armero realizou um documentário chamado “Ángel Nieto: 12+1” para perpetuar o legado de um dos maiores desportistas de sempre de Espanha, que foi recebendo inúmeras distinções ao longo dos anos como a Grande Cruz de Mérito Civil, a Ordem Olímpica e a Grande Cruz da Real Ordem para o Mérito Desportivo. Esteve também nomeado para o Prémio Príncipe das Astúrias. Tem um museu com o seu nome em Madrid e uma rua e um pavilhão com o seu nome em Zamora, onde nasceu.

Ricardo Urgell, fundador da discoteca Pachá e amigo próximo de Nieto e da família, foi uma das pessoas que passou ainda esta quinta-feira pela unidade hospitalar onde o antigo piloto se encontrava para apoiar a mulher Belinda e os dois filhos, à semelhança de Enrique Cerezo, ex-presidente do Atl. Madrid, e do produtor musical Pino Saglioco. Na Rep. Checa, Valentino Rossi e Marc Márquez também já recordaram o ídolo.