Um grupo de pescadores tunisinos uniu-se no passado domingo para impedir um barco anti-migrantes de atracar no porto de Zarzis, acusando os tripulantes de serem “racistas”. Esta segunda-feira mantiveram os protestos, na tentativa de impedir que a embarcação atraque num dos portos vizinhos de Sfax ou Gabes. “Se cá voltarem, bloquearemos o canal de abastecimento”, garantiu Chamseddine Bourassine, um dos líderes do movimento, à Agence France-Press. “Há muçulmanos e africanos a morrer”, declarou.

O barco C-Star pertence ao grupo Génération Identitaire (GI), um movimento de ativistas de extrema-direita com membros vindos de França, Alemanha, Áustria e Itália que tem como objetivo impedir “a imigração e a islamização da Europa”. O barco, que traz consigo uma tarja onde se pode ler “Vocês não vão fazer da Europa a vossa casa”, faz parte de uma missão a que o grupo chamou “Defender a Europa”. Esta pretende interferir com as missões de salvamento levadas a cabo no Mediterrâneo por algumas ONG, que acusam de trabalhar com os traficantes para trazer migrantes para a Europa.

Segundo a AFP, duas embarcações foram contactadas pelo C-Star esta semana na costa da Líbia — o Aquarius, operado pela SOS Mediterranee e a Médicos Sem Fronteiras e o Golfo Azzurro, operado pela Pro-Active Open Arms — com o objetivo de as demover. “Estamos a observar-vos e os vossos dias de fazer coisas sem observação acabaram”, terá dito a tripulação do GI.

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No entanto, os problemas no porto de Zarzis não são os primeiros encontrados pela embarcação do GI nesta viagem. As autoridades egípcias retiveram o barco no Canal do Suez para inspeção; e no Chipre deu-se um acontecimento insólito quando vários membros da tripulação com nacionalidade do Sri Lanka abandonaram o C-Star para requerer asilo no país europeu.

Milhares de migrantes resgatados por pescadores

Em Zarzis, um responsável do porto que preferiu não se identificar resumiu assim a situação à AFP: “Deixarmos entrar racistas aqui? Nunca.”

À Radio France Internationale, o secretário-geral da Associação de Pescadores local, Anis Souei, procurou explicar a ação dos pescadores do porto de Zarzis, que fica a menos de 100 km da fronteira com a Líbia. “Porque é que recusamos a entrada a pessoas que querem vir aterrorizar migrantes? É mau, é puro horror, recusamos aceitá-los no nosso porto”, declarou. “Na pesca temos muito trabalho, mas fazemos uma boa ação a resgatar migrantes. Desde 2011 já salvámos quase 10 mil ou 11 mil pessoas.” Também o Fórum Tunisino para a Economia e para os Direitos Sociais, uma ONG local, pediu ao Governo da Tunísia para que “não coopere” com uma tripulação que classificou de “racista e perigosa”.

Desde 2014, 600 mil migrantes já foram resgatados de barcos de traficantes na costa da Líbia, sendo depois levados para Itália. Dos 100 mil resgatados este ano, cerca de um terço foi resgatado por barcos de ONG, segundo dados avançados pela BBC. No entanto, as relações destes grupos com o Governo italiano já viram melhores dias – ainda na quinta-feira passada, as autoridades italianas confiscaram uma embarcação do grupo Jugend Rettet. No dia anterior, o Parlamento italiano tinha aprovado um plano para enviar barcos para a costa da Líbia e pediu às organizações que operam no local para seguirem um código de conduta.