Cresceu, o Luís Miguel que ainda petiz (com meros dezassete anos e no Bragança) já fazia minutos entre os mais velhos do clube lá da terra. Não foi o corpo que se fortaleceu de músculo, não foi a barba que no rosto se adensou; o que cresceu em Luís Miguel foi o pensamento e como o executar. Tanto cresceu que sobre o relvado Luís Miguel está em toda a parte.

A ele, Luís Miguel, quando a bola lhe cai na bota direita — ou na esquerda, tanto faz: é ambidextro –, cai como que por magnetismo, tudo à volta pára por instantes breves, os adversários lá despertam e tentam roubar-lha, mas Luís Miguel curva-se sobre ela, rodopia, sempre de cabeça levantada, olhos mais adiante do que os pés — só os melhores os têm mais adiante –, e coloca-a, curta ou longa, em que veste a mesma camisola que a sua. Começou por ser um extremo — dos que pensam o ataque e pouco ou nada recuam à defesa. Hoje recuou. Agora recua. E recuperaria bolas a noite toda diante do SC Braga. Depois, é vê-lo a lançá-las na frente. Ou a retê-las quando o jogo assim o pede.

É oito? Oito-e-meio? Talvez dez? Onde estiver a bola, está ele. E se ela se vai, vai também com ela. Crie-se, pois, uma posição que o futebol não tem ainda: a de omnipresente. É isso que Luís Miguel é.

No primeiro golo do Benfica teve intervenção direta. Era aquele o minuto quinze. Esgaio erra um passe à direita, é Luís Miguel quem o interceta a meio-campo e entrega em Jonas, Jonas e Seferovic tabelariam depois, o brasileiro isola-se na esquerda do ataque benfiquista — entretanto o suíço já corria para a área –, segue até à linha de fundo, volta para dentro e cruza para o poste mais distante onde Seferevic mergulha e desvia de pé direito para o primeiro golo da noite. Cinco minutos depois, quase voltava Seferovic a festejar na Luz. É agora Luís Miguel, não a intercetar a bola, mas a desmarcá-lo nas costas da defesa do SC Braga. Não é uma desmarcação qualquer: o passe é feito ainda antes do meio-campo do Benfica… em trivela. Depois de ajeitar a bola, o suíço entrou na área e rematou cruzando com a canhota, valendo aos bracarenses a defesa de Matheus para canto.

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Mais cinco minutos no cronómetro e o que antes fora ameaça enfim se consumava. A “assistência” foi de Raul Silva. Tudo começa num livre à esquerda e muuuito distante da área do SC Braga, Luís Miguel (quem mais?) cruza longo para Jonas, o central bracarense Raul antecipa-se e chega primeiro à bola… mas corta-a mesmo para o pé direito de Jonas à entrada da área. Depois, o brasileiro do Benfica encheu o pé, pega na bola de primeira e fez o segundo golo. Mais: Jonas igualou Magnusson como o segundo melhor marcador estrangeiro do Benfica: oitenta e sete golos. Cardozo ainda lidera com cento e setenta e dois.

Antes do intervalo, aos quarenta e quatro minutos, reduziria o SC Braga. Tudo começa no meio-campo defensivo dos bracarenses e num passe longe de Fransérgio que descobre Esgaio nas costas de Eliseu. Esgaio ameaça que cruza mas não cruza, volta atrás e desmarca, depois, num passe entre linhas Hassan dentro da área. O egípcio ganha a frente a Jardel e pica a bola à saída de Varela. Há seis meses que o Benfica não sofria um golo em casa durante a primeira parte.

Hassan empataria o jogo aos cinquenta e cinco minutos, depois de desviar dentro da área um cruzamento vindo da esquerda, de Jefferson. Mas não contou. O árbitro assistente levanta a bandeirola de pronto e assinala fora-de-jogo, Carlos Xista interrompe o jogo, consulta o vídeoárbitro e acaba por manter a primeira decisão, a de anular o golo — Hassan estava adiantado em relação ao último defesa do Benfica na altura do passe.

Logo em seguida, Luís Miguel, sempre ele, desmarca Cervi na esquerda e nas costas do lateral Esgaio, o argentino não tardaria a cruzar rasteiro para a pequena área, a bola até parecia tomar a direção das luvas de Matheus, mas um corte disparatado de Rosic acaba por tirar o guarda-redes do SC Braga do lance — o cruzamento ganha altura e segue para trás, sobrevoando o guarda-redes –, sobrando a bola para Salvio ao segundo poste. O argentino desviou para o terceiro golo do Benfica.

O resultado seria final. Mas houve ainda uma derradeira ameaça dos da casa. Minuto sessenta e quatro. O lançamento lateral à direita é de André Almeida, André coloca a bola na esquina da área, Luís Miguel toca-a de primeira com o calcanhar e desmarca Seferovic lá dentro, rematando depois o suíço de primeira para defesa rente ao poste de Matheus.

Luís Miguel quis ser Pizzi. Pois que seja.